Especial Embalagem. Formatos mais pequenos levam à venda imediata
Muito enraizada na cultura portuguesa, a charcutaria ocupa lugar de destaque nos supers e hipermercados de norte a sul do país
Rita Gonçalves
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As famílias portuguesas gastam em média 3,61 euros na compra de presunto, de cada vez que visitam o ponto de venda. O produto é consumido por 64% dos lares em Portugal continental, segundo os dados da consultora Nielsen, relativos ao ano de 2014.
Dentro do segmento, o fiambre é a categoria mais vendida, sem contar com os queijos, com 82% das famílias portuguesas a comprarem o produto em cada ida ao supermercado. As qualidades produzidas a partir da carne de porco são as mais vendidas, com 70% da quota mercado. Já os de frango e peru detêm 7% e 23% das vendas, respectivamente.
Ao longo do último ano, “cresceram os produtos com maior valor acrescentado e de maior conveniência”, tendência que Mário Dias, Director Comercial da A. Pires Lourenço & Filhos, S.A. considera ser a mais forte nos produtos de charcutaria. Responsável apenas pela venda de presunto, a marca revelou que “sentiu um aumento da procura”, apesar dos entraves que condicionaram as vendas.
“A taxa de IVA a 23%, os custos energéticos e a grande dependência de matérias-primas, provenientes de Espanha, continuam a criar vários constrangimentos ao sector”. A taxa aplicada à charcutaria está muito acima de outros países da Comunidade Europeia, mas “a elevada dinâmica promocional e os preços agressivos das principais cadeias retalhistas minimizaram o seu impacto, dando aos consumidores, permanentes possibilidades de aquisição a preços muito competitivos”, considera Rui Carvalho, Director Comercial da Porminho Alimentação S.A., que está presente em todos os segmentos do sector.
As marcas portuguesas, no geral, apostaram na qualidade dos produtos para responder à procura, mas o preço é um factor relevante na hora da decisão de compra, o que levou a que o mercado fosse invadido por marcas importadas, com preços bastantes reduzidos. Bruno Costa, Director-Geral da Iguarias de Excelência, confirma que “existiu uma contínua pressão de produtos e marcas espanholas de baixa qualidade a colocaram o mercado sob pressão e com os preços a reflectirem isso”.
Porém, o maior entrave para o crescimento do sector tem sido o facto de os mercados internacionais, com grandes oportunidades de crescimento para as empresas portuguesas, “se encontrarem fechados”. “Parece-nos, no mínimo, escandaloso que alguns países (dos quais Portugal até importa carne), mantenham fortes barreiras à importação de conservas de carne, como o presunto”, disse o responsável da Pires Lourenço.
Preocupada com o preço e com a saúde, a população nacional tem seguido a tendência de cortar no sector da charcutaria, relacionando-o com níveis altos de gordura e sal. Em 2014, acentuou-se a procura pela informação nutricional “nos produtos de fatiados comercializados em superfícies comerciais”, sublinha Bruno Costa, o que levou os produtores a tomarem medidas quanto à confecção dos produtos. Como a Iguarias de excelência mantém o core business na venda presuntos em peças inteiras para restauração e hotelaria, no sector “a questão não é tão comentada”, uma vez que, a relação mais próxima com os profissionais de cozinha leva a que a “preocupação pela qualidade dos ingredientes e a sua composição seja um tema permanente e de constante monitorização”. O segmento, no qual “a qualidade e o prestígio são os factores de escolha”, voltou a sentir uma evolução considerável com o volume de vendas a “crescer acima de dois dígitos” e o número de clientes a “aumentar proporcionalmente”.
Por outro lado, para a Pires Lourenço, enquanto produtora exclusiva de presunto para o retalho, os “consumidores estavam afastados do consumo, por manterem ainda a mesma noção de este ser um produto salgado”, pelo que a empresa tem vindo a baixar cada vez mais as dosagens de sódio no produto final. O Director Comercial considera que o panorama “está a alterar-se”, sendo que o presunto é o “produto de charcutaria mais saudável por não ser de produção complexa, recorrendo‐se apenas à cura da perna através da salga, e como tal contém um teor proteico muito acima de outros produtos da mesma ‘classe’”. Neste momento, o produto traz “mais benefícios que perigos” e os clientes sabem “identificar essa evolução”, o que se revê no crescimento de “11,5% em valor, face a 2013”, registado pela fornecedora.
A acompanhar esta temática com interesse, Rui Carvalho defende que “o sabor é uma característica distintiva deste género de produtos, a qual se irá manter”, não sendo “líquido” que estes “sejam prejudiciais à saúde”. A Porminho não sentiu a influência da preocupação com a saúde no número de vendas, mas toma a posição que “cabe às autoridades competentes definir quais os parâmetros exigíveis na produção dos vários produtos, parâmetros esses que desde sempre cumprimos escrupulosamente”.
No entanto, há outras medidas para combater a quebra nas vendas, frente à crescente preocupação do consumidor com o bem-estar físico, além do reforço da qualidade. “Adaptar à procura e aprender a comunicar os atributos do produto” é a estratégia defendida pela Pires Lourenço.
“A actividade física é normalmente associada a uma preferência de consumo de alimentos com alto teor proteico para o fortalecimento muscular, e nesse aspecto o consumo de um produto que contém 28% de proteína só pode ser uma oportunidade para as empresas que se dedicam à produção de presunto”, defende Mário Dias. No que respeita a produtos de charcutaria mais “elaborados”, o Director acredita que, “com um consumidor que cada vez mais quer saber como o produto é feito e quais os ingredientes presentes na composição, seja necessário adaptá‐los a estas novas preocupações”.
Além das estratégias de comunicação, a tendência é para a criação de formatos mais convenientes para o consumidor. No ano anterior, “foram lançadas embalagens de fatiados (presunto e enchidos) com menor gramagem” pela Iguarias de Excelência, seguindo “uma tendência global e com sucesso, visto que o consumidor aprecia uma redução do preço unitário, mesmo sendo aplicado o mesmo valor por quilograma, ou mesmo superior nalguns casos”. O mercado acolheu bem as soluções com menor gramagem da produtora. O Presunto Ibérico de Bolota Joselito Gran Reserva, continua a ser o mais vendido.
Para a Porminho, embora que os formatos fatiados de “150 e 200 gramas continuem a liderar as vendas, há espaço de crescimento para formatos mais pequenos”. Para o Director Comercial da empresa, a tendência tem a ver principalmente com dois factos. “Por um lado as pessoas compram cada vez mais para consumir de imediato, não guardando ou armazenando produtos frescos, e por outro, os agregados familiares médios tem cada vez menos indivíduos, havendo cada vez mais pessoas a viver sós”. Esta é uma realidade que influência “decisivamente” a procura de formatos mais pequenos. No ano que completou 30 anos de existência, a Porminho realizou um volume de negócios global de “41 milhões de euros, registando um crescimento de 15%” em 2014. Na área de negócios de charcutaria “o desempenho foi mais relevante tendo crescido cerca de 22%”, revela o responsável.
O consumidor continua com dois focos muito distintos, segundo o Director Comercial da Pires Lourenço, para a qual os “fatiados com menos de 200 gramas e pedaços com menos de 500 gramas” foram os produtos mais vendidos. “Por um lado, o consumidor vive na busca por produtos com baixos teores de gordura e açúcares. No entanto, tem o lado emocional, que apela à procura por produtos tradicionais e com o mínimo de aromatizantes e conservantes”. A procura de produtos de conveniência é, por isso, o factor que cruza estes dois focos do consumidor, pelo que “cerca de 35% das vendas” da empresa já se encontram na “Gama de Conveniência”, porém “as verdadeiras bandeiras que ajudam a manter o crescimento, mesmo num triénio que foi de crise” têm sido os produtos tradicionais. “Só produzimos Presunto, um produto natural e que tem sempre consigo uma forte ligação emocional. Por outro lado, a “democratização” do consumo (que em muitos casos veio da redução de gramagens), fez com que hoje tenhamos consumidores que não estavam neste produto, e isso é muito positivo”, revela o responsável. O mercado tradicional, que representa “cerca de 10% do volume de negócios” da Porminho, “mantem os adeptos e cujo volume de negócios está estável”.
Em 2015, as tendências enumeradas “irão manter-se”, nomeadamente, a procura de “produtos de conveniência e soluções económicas”. O mercado vai “assistir a um regresso do paradigma da qualidade e na aposta em marcas fortes”, revela o responsável da Iguarias, que prevê que a redução da oferta que “importamos” nos últimos anos, devido às dificuldades sentidas no mercado espanhol e que “empurraram algumas marcas” para o mercado nacional. A imagem, composição e ingredientes, e ainda a relação entre preço e posicionamento serão, os factores de decisão e distinção das marcas, que também pensam em ganhar mais visibilidade nos mercados internacionais.