Mariana Matos, secretária-geral da Casa do Azeite
“Não há grande esperança que o preço do azeite possa baixar”
“Não há grande esperança que o preço do azeite possa baixar”, avisa Mariana Matos, secretária-geral da Casa do Azeite, em entrevista ao Hipersuper, onde enumera os fatores que estão por detrás da subida vertiginosa do preço do azeite, que praticamente duplicou nos últimos dois anos, indica o que esperar da campanha que agora começou, faz um balanço do comportamento do consumo e fala do impacto da subida dos preços nas exportações.
Rita Gonçalves
CTT prepara peak season com reforço da capacidade da operação
Campolide recebe a terceira loja My Auchan Saúde e Bem-Estar
Já são conhecidos os três projetos vencedores do Prémio TransforMAR
Montiqueijo renova Selo da Igualdade Salarial
Sensodyne com novidades nos seus dentífricos mais populares
Salutem lança Mini Tortitas com dois novos sabores
LIGARTE by Casa Ermelinda Freitas chega às prateleiras da Auchan para promover inclusão social
Portugal não tem falta de água, não está é a saber geri-la como deve ser
Zippy convida as famílias a explorarem as suas emoções de forma inclusiva
Lidl e Remax premeiam cinco famílias no Concurso Casas
A produção de azeite caiu para metade em Espanha na última campanha: de 1.500 milhões para 670 milhões de toneladas. Os efeitos fizeram-se sentir em todo o lado. Em Portugal, o preço do litro de azeite já ultrapassou os oito euros e irá continuar a subir. “Não há grande esperança que o preço do azeite possa baixar”, diz a secretária-geral da Casa do Azeite, em entrevista ao Hipersuper. Mariana Matos enumera os fatores que estão por detrás da subida vertiginosa do preço do azeite, que praticamente duplicou nos últimos dois anos, indica o que esperar da campanha que agora começou, faz um balanço do comportamento do consumo e fala do impacto da subida dos preços nas exportações.
Fotografias Frame It
Há dois anos que o preço do azeite está a subir…
É o mercado a funcionar. Não há azeite. Não há mesmo. Estamos a falar de um produto 100% natural, não há outra forma de o fazer a não ser as oliveiras produzirem azeitonas.
É sobretudo a quebra de produção que está a levar à subida dos preços?
A campanha do ano passado, que terminou agora, 2022-2023, registou uma quebra a nível mundial, sobretudo em Espanha. Também houve uma quebra em Portugal e noutros mercados. Mas Espanha é principal produtor de azeite do mundo. Contribui em cerca de 50% para a produção mundial. E como diz um colega, quando Espanha espirra todos ficamos constipados. A quebra de produção em Espanha tem um impacto enorme nas disponibilidades mundiais.
Em números redondos, o consumo mundial anda à volta de 3.000 milhões de toneladas. No ano passado produziram-se 2.400 milhões toneladas de azeite no mundo inteiro. Como havia algum stock, o restante consumo veio dos stocks. Quando baixam os stocks, aumenta o preço. E quando a produção é fraca aumenta o preço.
Como está a correr a atual campanha?
Tudo isto já seria suficientemente explicativo do que se passou nos preços, mas há um outro fator: esta campanha que se iniciou agora, em outubro, que está agora a começar, vai ser igualmente má. E, portanto, parte-se de uma situação em que os stocks mundiais já estão baixos, os stocks em Espanha estão baixos, a produção espanhola vai ser novamente baixa. Mas baixa mesmo. 50% abaixo da média das últimas cinco campanhas.
É esperada nesta campanha uma quebra de 50% em relação à média dos cinco últimos anos?Mais ou menos. Cerca de mais 50 a 70 mil toneladas do que no ano passado mas muitíssimo abaixo do que é uma campanha normal. Uma campanha normal em Espanha são 1.500 milhões toneladas. No ano passado foram 670 milhões de toneladas. Este ano, serão pouco mais de 700 milhões de toneladas.
São quebras muito significativas.
Este é o principal aspeto. E isso deve-se à seca e às secas continuadas e extremas em algumas regiões, principalmente nas principais produtoras, como a Andaluzia, de onde sai a grande parte do azeite espanhol e que tem um sistema de produção essencialmente de sequeiro ou rega deficitária. Nestas situações de seca extrema, não há hipótese. E o sistema produtivo espanhol é essencialmente de sequeiro. E isto é visível nas duas últimas campanhas nas quais a produção reduziu para metade. E este é o principal aspeto que fez o preço subir. E a única forma de regular o mercado é através do aumento do preço. Não há azeite suficiente para satisfazer o consumo tradicional. Caso contrário, não não haveria possibilidade de dar resposta à procura.
O consumo está, então, a cair?
Nestas circunstâncias o consumo sofre. E vai continuar a sofrer. Porque se esta fosse uma campanha normal, estaríamos numa situação difícil mas ainda haveria hipótese de os preços se regularizarem. Agora, temos novamente uma campanha impactada tão negativamente pela seca, já partindo de uma base pior, da campanha anterior, porque os stocks já foram consumidos. Não há grande esperança que o preço do azeite possa baixar.
Há outras questões a influenciar o preço, além da quebra de produção?
Há outras questões que também justificam de alguma forma a subida do preço mas a grande percentagem é justificada sobretudo pela falta de produção. Há escassez de azeite. Mas há ainda os fatores de produção, não podemos esquecer do aumento do preço dos fertilizantes, dos aumentos de mineralidades. Do aumento generalizado dos fatores de produção. Isso também se reflete no preço. Mas deve-se principalmente à escassez de produção.
E como está a correr a campanha da azeitona em Portugal?
Na última campanha, Portugal registou uma produção de 126.000 toneladas, uma quebra de 39% em relação ao período homólogo. Mas em Espanha foi mais de 50% e é Espanha que marca o preço porque tem metade da produção mundial.
E, no entanto, Portugal é autossuficiente na produção de azeite.
Imagine, se Portugal fosse um país fechado, sem trocas comerciais, não sofríamos qualquer influência do mercado mundial. Não tínhamos problema nenhum, nós somos mais que autossuficientes. Somos exportadores líquidos. Agora, vivemos num mercado livre e somos influenciados. Os preços são muito influenciados nomeadamente pela produção espanhola e pelo que se passa em Espanha. Os preços mundiais. Não estou a falar só dos preços em Portugal.
Qual a produção estimada para a atual campanha em Portugal?
A estimativa são cerca de 150.000 toneladas, mais cerca de 20% do que no ano passado. A campanha só está a começar agora, pelo que estas estimativas podem ainda vir a sofrer variações, mas será sempre uma campanha de nível médio.
Embora seja uma campanha de safra, portanto com maior produção, também não será uma campanha extraordinariamente elevada, pelo impacto negativo das condições climatéricas nos olivais de sequeiro, por um lado, mas também, em alguns casos, os olivais de regadio. Este ano, as geadas tiveram um impacto bastante negativo em algumas regiões. Causaram sérios danos ao olival.
Ainda assim, uma subida de 20% em termos homólogos é insuficiente.
Sim, é insuficiente. Para ter uma noção, num ano normal, em média, Espanha produz 1.500 milhões de toneladas. Portugal produz, em média, 150 mil. Portanto, são 10 vezes menos. Não temos grande capacidade para interferir no preço, porque também não impactamos assim tanto as disponibilidades de azeite a nível mundial.
O mesmo se passa nos outros países produtores, como Itália?
Sim. Estão todos a sofrer o mesmo drama. Os países da bacia do Mediterrâneo, Itália, Grécia, mas também a Norte de África, Marrocos e Tunísia, sobretudo, todos têm situações de seca extrema. Isto não é exclusivo de Portugal e Espanha. E é daqui, da bacia do Mediterrâneo, que sai 98% da produção mundial.
É verdade que o preço do azeite pode chegar aos 10 euros por litro?
Hoje, o preço do azeite deve estar à volta dos 8,3 euros por litro. Pode mexer para cima ou abaixo. É um pouco especulativo hoje em dia neste cenário estarmos a fazer previsões, ninguém sabe onde vai parar. Vai depender também do comportamento do consumidor. Se o consumo quebrar significativamente, o preço tem de baixar. O preço vai-se ajustando à procura mas na realidade ninguém sabe. Começou agora a chover. Estas chuvas ainda vão ter algum impacto positivo na produção da campanha que está a começar? Ninguém sabe.
Já me disse que pelo menos para já o preço não vai descer.
É a única coisa que consigo dizer com certeza. Isto depende da temperatura, do comportamento do consumo. Até agora, as quebras no consumo não têm sido tão significativas como era de esperar. Mas também é verdade que os aumentos de preço demoram às vezes meses a chegar ao mercado, porque os contratos já estão feitos e o que está a ser consumido agora foi comprado há dois ou três meses.
Há que esperar ainda um efeito de ajustamento.
Sim, há aqui um período relativamente longo na cadeia de valor para fazer chegar ao consumidor final os incrementos de preço da produção. Por esse motivo, o preço no consumidor não chegou ainda ao patamar mais elevado. Na realidade, o consumo ainda não está totalmente impactado pelos aumentos na produção. E tem estado a ter um comportamento menos elástico do que era esperado. As pessoas não têm deixado de consumir na proporção que se esperava. Têm comprado menos mas continuam a consumir. Isto nos mercados tradicionais, como Portugal, Espanha e Itália, onde o consumo é muito consolidado.
E nas exportações?
O impacto nas exportações é maior. Entre janeiro a julho, regista uma quebra de 30% em termos homólogos. E pode ser superior. Porque em mercados onde o consumo não está tão consolidado, à medida que os aumentos de preço vão chegando ao consumidor final, estes deixam de consumir. Imagine um americano ou brasileiro que começou há pouco tempo a consumir e que não tem um consumo ainda muito consolidado, isto em mercados onde o consumo ainda é muito aspiracional, quando chega a este preço já não conseguem e mudam para os óleos que toda a vida consumiram.
Uma situação que nos preocupa sobretudo nos mercados de exportação é que as quebras de consumo são muito mais rápidas do que, depois, fazer os aumentos. Ou seja, o consumo quebra agora abruptamente, nomeadamente nos mercados externos, mas a recuperação daquele consumo vai levar anos. Quando a produção normalizar, porque vai normalizar, não será no próximo ano, mas daqui a dois ou três anos, vamos assistir à situação contrária, e iremos trabalhar novamente para aumentar o consumo e o preço.
Este problema da seca vai nos acompanhar nos próximos anos. Pelo menos assim esperamos. Estão a ser tomadas medidas na produção para contornar este problema com a ajuda da tecnologia, por exemplo?
Não, a questão da seca só se combate com a água. Aliás, nós conseguimos ver isso em Portugal. No ano passado, 90% da produção portuguesa foi produzida no Alentejo, nos olivais regados. Aqui se vê a importância da água como estabilizador da produção. Se não fosse o regadio, teríamos menos azeite e mais caro.
A existência de água e a eficiência do seu uso têm um papel absolutamente fundamental no setor porque a água é um fator estabilizador das produções. E não há outro. É óbvio que com mais tecnologia, posso tratar melhor e fazer uma série de coisas, mas sem água a árvore não produz. A água é absolutamente fundamental e crítica para a produção e para a estabilização da produção. E, também, de alguma forma, para a estabilização dos preços. E isso vê-se bem hoje. Nos olivais de regadio a produção é, apesar das variações, relativamente estável. O problema de Espanha é que não tem um modelo de produção tão moderno como temos na região do Alentejo.
Artigo originalmente publicado na edição 417