Indústria de lacticínios optimista para 2015
A indústria portuguesa de lacticínios deverá recuperar consumidores em 2015, impulsionada, sobretudo, pelo sector do queijo. Esta é, pelo menos, a convicção dos operadores do sector
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A indústria portuguesa de lacticínios deverá recuperar consumidores em 2015, impulsionada, sobretudo, pelo sector do queijo. Esta é, pelo menos, a convicção dos operadores do sector.
O fim das quotas leiteiras, anunciado para Abril de 2015, traz novos desafios à indústria europeia de lacticínios e promete afectar a forma como as empresas operam neste mercado. E Portugal não é excepção.
Vai, desde logo, “provocar maior instabilidade na evolução dos preços e da quantidade produzida, com ciclos mais curtos e imprevisíveis”, considera em entrevista ao HIPERSUPER Carlos Neves, Presidente da Aprolep, Associação dos Produtores de Leite em Portugal. “A longo prazo, dentro de dez anos, as perspectivas da União Europeia para o mercado mundial de lácteos são optimistas. Espera-se um aumento gradual do consumo nos países emergentes”. Podem, no entanto, surgir imprevistos, como o actual embargo da Rússia que agravou um ano já complicado. Para os próximos meses, estou muito apreensivo, sobretudo por causa do embargo russo. Há o risco de oportunismo na importação de excedentes do mercado europeu”.
As perspectivas a breve prazo para o mercado português são, no entanto, optimistas. “Em 2015, prevemos uma ligeira recuperação no consumo total de lactícinios, liderada pelo mercado do queijo. A categoria continuará a crescer, aliada à actividade promocional das marcas de fabricante e a alguma recuperação do poder de compra do consumidor no panorama económico nacional. O consumo per capita e sobretudo as novas formas de consumo têm ainda um grande potencial de crescimento e alteração”, sublinha Vera Mota, directora de marketing de comunicação da Saloio.
Sebastião Gomes, gerente da Lactoserra, empresa da Beira Alta fundada em 1895, vai mais longe e prevê 2015 com um ano de viragem, “com um crescimento visível do consumo e consequentemente aumento da produção e das vendas”.
A maior categoria
A categoria de lacticínios – leite, queijo, iogurte, manteiga e natas – é uma das maiores do sector alimentar, com taxas de penetração elevadas nos lares nacionais. Até Outubro, os lacticínios representaram vendas de 1,3 mil milhões de euros no retalho alimentar (hiper, supers e tradicionais), segundo os mais recentes dados da consultora Nielsen.
A categoria de iogurtes é a maior em volume de negócios. Até Outubro, alcançou vendas de 442 milhões de euros, menos 4% face ao período homólogo. Em volume, as vendas também caíram (-3%). As marcas de fabricante estão a ganhar terreno. A quota de mercado destas marcas subiu 4% para uma participação de 64%. Pelo contrário, as marcas da distribuição perderam quota (-15%). Danone, Nestlé e Lactogal, constituem o top 3 dos fabricantes líderes em valor no retalho alimentar, nesta categoria comprada por 97% dos lares nacionais.
O queijo é, por sua vez, a segunda maior categoria em facturação. As vendas de queijo no retalho alimentar aumentaram 3% até Outubro, para 437,6 milhões de euros. Em volume, pelo contrário, as vendas caíram 2%. Limiano, Terra Nostra e Castelões, são as marcas líderes da categoria, comprada por 96% dos lares. As marcas de distribuição também aumentaram a quota de mercado (+2%) para 34%.
O leite é mais um bem essencial que faz parte da categoria de lacticínios. As vendas deste produto caíram 6% para 522,7 milhões de litros. A Mimosa, a Gresso e a Agros, lideram o ranking das marcas líderes no retalho. 94% dos lares nacionais compraram leite no último ano e gastaram 3,40 euros por cada visita à loja. O sector movimentou 335,1 milhões de euros.
O produto que mais cresce
É a categoria mais pequena no sector dos lacticínios, mas as natas aumentaram em 4% o volume de negócios no período analisado pela Nielsen e são o produto que mais cresce no retalho. Venderam 32 milhões de euros apesar de terem sido comercializadas menos unidades. As marcas de fabricante revelaram-se especialmente dinâmicas, ao conquistar 7% de quota de mercado para uma participação global de 58%. Mimosa, Parmalat e Longa Vida, lideram a categoria. Quase 80% dos lares nacionais comprou natas nos últimos doze meses e gastou 1,45 euros por cada visita à loja.
Por último, a manteiga. Esta categoria perdeu vendas e movimentou 62 milhões de euros. A quota das marcas de fabricante manteve-se inalterada mas a das marcas de distribuição retrocedeu 8% para uma participação de 27%. Mimosa, Matinal e Milhafre, são as marcas preferidas dos portugueses. Um total de 63% dos lares portugueses comprou este alimento no último ano e despendeu 1,71 euros por cada visita à loja.
A Mimosa lidera em três categorias do sector dos lacticínios: leite, manteiga e natas. E as marcas da distribuição alcançam maiores quotas de mercado nas categorias de natas (42%), leite (41%) e iogurtes (36%).
Tendências
“Uma das principais tendências e transversal aos vários mercados da categoria de lacticínios é a crescente preocupação com a saúde e o bem-estar. Hoje, temos consumidores cada vez mais informados e preocupados com a sua saúde, alimentação e estilo de vida. Existe também a tendência de consumir o que é natural e original, sem corantes, conservantes ou outros artifícios. Há uma maior preocupação com a nutrição e é crescente a procura por produtos com menos gordura e menos sal”, revela em entrevista ao HIPERSUPER Paula Gomes, Directora de Marketing do Grupo Bel Portugal, assinalando ainda a “crescente valorização das marcas nacionais, um sentimento patriótico de consumir o que é nosso”.
“O movimento de preocupação crescente com a saúde, na vertente do viver bem e com equilíbrio, é uma tendência mundial que acompanha o aumento da esperança média de vida. Em Portugal, esta tendência também ocorre e é reforçada pela inversão da pirâmide geográfica que estamos a viver no nosso País. Esta tendência não deve de todo ser pouco valorizada, pois pode significar no médio prazo alterações significativas nos padrões de consumo, nomeadamente em algumas categorias. Por isso, estando atentas ao consumidor, as marcas têm reagido seja com adaptações de formulações, como ‘free from’, ‘reduced’ ou mesmo com novos produtos com benefícios funcionais acrescidos”, nota Paula Gomes.
Conveniência
Vera Mota, directora de marketing da Saloio, empresa da região Saloia especialista em produção de queijo, aponta, por sua vez, a conveniência, a sofisticação e o requinte, além da procura por produtos genuínos e naturais, como as principais tendências de consumo. “O consumidor valoriza soluções que lhe permitam, com pouco esforço e custo reduzido, apresentar propostas de valor originais. O posicionamento da Saloio adapta-se bem a estas novas tendências, o que permite responder de forma eficaz a estes desafios, uma vez que é líder no segmento de especialidades”. A preocupação com a saúde “não pode ser ignorada pela indústria na elaboração dos seus planos de desenvolvimento de novos produtos”, mas o sabor continua a ter um peso “relevante” nas decisões de compra. “Se juntarmos a estes aspectos o factor preço, que se tornou ainda mais importante no contexto de crise económica em que vivemos actualmente, temos as três principais variáveis que a indústria tem de saber conciliar para conseguir lançar produtos de sucesso”.
Diferenciação
A inovação e a diferenciação são os principais ingredientes no lançamento de novos produtos. Para conquistar novos consumidores, a Bel Portugal, detentora das duas marcas de queijo líderes no retalho no último ano – Limiano e Terra Nostra, segundo a Nielsen, tem apostado sobretudo na “diferenciação” através da “comunicação, activação da marca e da inovação”. A Limiano, por exemplo, lançou um queijo amanteigado com casca que se come até ao fim, em linha com a tendência de um maior aproveitamento dos alimentos, uma inovação que traz conveniência às famílias já que elimina desperdícios. A Terra Nostra, por sua vez, apostou no lançamento de uma nova imagem, suportada numa campanha que eleva as características da natureza dos Açores. “A marca que é um ‘shot’ de energia verde” também lançou novos produtos (Fatias com ervas finas) e uma nova embalagem de manteiga, mais moderna e conveniente. A empresa detém ainda as marcas A Vaca que Ri e Mini Babybel.
Inovação
Já a Saloio, que detém duas lojas nas fábricas de Torres Vedras e Abrantes, aposta sobretudo na inovação. “Somos a empresa líder em inovação no mercado de queijo em Portugal”, sublinha Vera Mota, acrescentando que a empresa lança 10 novos produtos por ano. “É uma importante forma de diferenciação, num mercado ainda muito tradicional e com baixo investimento em investigação”. Reforçar com novidades os segmentos de requeijão, queijo de cabra e queijo de vaca curado enriquecido com sabores exóticos, tem sido a aposta da dona da marca Palhais para recrutar novos consumidores. “No próximo ano, a actuação da empresa vai continuar a passar pelo foco na inovação, associada aos novos produtos e na apresentação de propostas diferenciadas e de valor acrescentado para o consumidor e no desenvolvimento de fórmulas para produção de produtos de custo mais baixo. Daremos continuidade ao trabalho constante de racionalização para manter níveis de preço adequados e relevantes para o consumidor”, garante a directora de marketing e comunicação da Saloio.
Marcas brancas
“O aumento do consumo de marcas brancas tem demonstrado ser uma oportunidade para as marcas mostrarem a sua capacidade de acrescentar valor ao consumidor, tornando-se ainda mais relevantes, mas também às suas categorias, aumentando o seu consumo e relevância no cabaz de compras”, sublinha Paula Gomes. “O sector dos lacticínios tem feito isso, seja com embalagens mais práticas e funcionais, seja indo ao encontro das preocupações financeiras, seja introduzindo novas experiências sensoriais”.
Para Vera Mota, por outro lado, o crescimento das marcas de distribuição (MdD) resulta sobretudo do nível de preços e da contracção do rendimento disponível. “No entanto, as marcas originais continuam a representar um papel fundamental no mercado porque são a garantia de qualidade, homogeneidade e ausência de risco para o consumidor, são a caução que garante a satisfação continuada e a repetição da experiência positiva”. Por isso, a empresa vai continuar a apostar no desenvolvimento de “marcas fortes, associadas a produtos inovadores, diferenciados e de valor acrescentado para o consumidor”.
Promoções
A actividade promocional tem sido uma das armas de arremesso da indústria das marcas e do retalho alimentar para animar o consumo. “A distribuição tem apostado de uma forma muito incisiva na actividade promocional como resposta à depressão no consumo, resultante do aprofundamento da crise económica. Esta estratégia é transversal a diferentes categorias no grande consumo mas ainda mais nos lacticínios, um importante gerador de tráfego nas lojas. Para as diferentes categorias do sector dos lacticínios, este aumento do nível promocional implica seguramente um aumento do volume de vendas em promoção versus sem promoção”, explica a directora de marketing da Bel Portugal.
O impacto destas promoções no volume de negócios “tem alguma importância”. Esta participação em campanhas promocionais “tem de ser vista como um investimento, já que a rentabilidade que resulta é muito diminuta”, sublinha, por sua vez, Miguel Moreira, director comercial da Lactoserra.
Para crescer, esta empresa da Beira Alta aposta nos mercados externos, onde tem ainda uma “pequena participação”, nomeadamente Europa – França, Luxemburgo, Suiça, Inglaterra, mas também EUA e Angola. “Em 2015, a estratégia passa por conquistar novos mercados fora da Europa e consolidar aqueles onde já estamos presentes”.
Exportação
A Bel exporta queijo para 15 países, mas também leite e manteiga. “É um negócio em amplo crescimento”, sublinha Paula Gomes. No próximo ano, é intenção da empresa reforçar a presença das marcas nos mercados onde estas já estão implementadas.
Já o negócio da Saloio nos mercados internacionais registou um crescimento de 15% em 2013, face ao ano anterior. A empresa exporta para 40 países. “Em 2014, prevemos um crescimento de 100% nas vendas para os mercados externos, possivelmente com a consolidação do negócio na Europa e em Angola”, sublinha Vera Mota. “A exportação é actualmente a única via para as PME [Pequenas e Médias Empresas] melhorarem o seu desempenho económico-financeiro. O crescimento sustentado das vendas para exportação permite reduzir a dependência do mercado português, atingir um crescimento orgânico, aumentar a competitividade e garantir as condições para a sustentabilidade do negócio a longo prazo”.
A aposta nos mercados internacionais passa estrategicamente por estabelecer parcerias com distribuidores e cadeias organizadas de distribuição local. “Depois de um ano em que conseguimos duplicar as vendas para exportação, o desafio passa agora por entrarmos com os nossos produtos em novas cadeias de distribuição moderna em países onde ainda não estamos presentes”.
DESAFIOS
“Perante o cenário de crise económica, combinado com o crescimento das marcas de distribuição, os principais desafios do sector continuam a ser a justificação do ‘price premium’ das marcas, através da diferenciação e superiorização dos produtos e da relação de confiança que estabelecemos com os consumidores, além do lançamento de produtos inovadores”.
Paula Gomes, Directora de Marketing da Bel Portugal
“A matéria-prima, de qualidade e em quantidade, e a inovação de produto, através da melhoria da proposta, da sua apresentação e da inovação do portefólio, são os principais desafios”.
Miguel Moreira, Director Comercial da Lactoserra
“Os principais desafios que identificamos em 2015 passam por acelerar o processo de internacionalização das marcas, continuar a apostar em novos produtos inovadores para responder às necessidades e expectativas dos consumidores, intensificar o processo de construção de parcerias fortes com clientes e fornecedores e manter uma comunicação fluída e eficaz com o público-alvo”.
Vera Mota, Directora de Marketing e Comunicação da Saloio