Cultura do abacate cresce em produção e tecnologia em Portugal
A cultura do abacate é relativamente recente em Portugal, mas cresceu exponencialmente em dez anos. Os produtores nacionais aliam o conhecimento à tecnologia para conseguirem uma gestão mais eficiente no uso de água e na fertilização dos solos.
Ana Grácio Pinto
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Apreciado pelas suas propriedades nutricionais e associado a benefícios para a saúde, o abacate tem visto o seu consumo aumentar a nível mundial. Não por acaso, foi escolhido pela organização da Fruit Attraction 2024, que decorre no início de outubro em Madrid, como o produto estrela, concentrando diversas iniciativas.
João Bento trabalha e investe no setor agrícola há 35 anos e são várias as culturas que plantou desde os anos 90. À produção inicial de verduras e hortícolas, o CEO do JBI Group acrescentou a de morangos no início dos anos 2000, com o objetivo de acrescentar um produto novo, mas também de procurar novos mercados e iniciar a exportação. A partir de 2008, o grande crescimento na produção dos frutos vermelhos levou a empresa a procurar novos produtos para continuar a crescer e, recorda João Bento, fazia sentido fazê-lo com um produto novo. Decidiram-se pelo investimento na produção do abacate, iniciada em 2014 com os primeiros cinco hectares. Atualmente, produzem em 320 hectares.
“O consumo do abacate estava a crescer acima dos dois dígitos anualmente e as perspetivas de crescimento futuro continuavam, como se verifica ainda hoje. A oportunidade de termos um mercado europeu com défice de oferta e o consumo em crescimento, era a aposta certa. O Algarve tem excelentes condições para a produção de abacate, as melhores a nível europeu, temos excelentes solos e condições edafoclimáticas muito boas para a produção”, explica o CEO do JBI Group. A proximidade do mercado europeu foi uma mais-valia que não podiam desperdiçar e investiram numa produção “de excelente qualidade reconhecida pelos nossos clientes”, destaca, afirmando que a empresa contribui “para satisfazer os consumidores europeus” com uma pegada ecológica “muito mais pequena do que os abacates que chegam do continente sul americano, Ásia ou de África”.
A paixão pela agricultura mantém-se, mas com a atenção à rentabilidade financeira “para continuar a fazer agricultura e ter futuro como agricultor”. “A cultura do abacateiro está bem integrada no mosaico de culturas que se fazem no Algarve e é mais uma alternativa para os agricultores”, assegura.
Na Frusoal, a citricultura é predominante desde a sua fundação, na década de 80 do século passado, em Vila Nova de Cacela, concelho de Vila Real de Santo António. Mas não impediu os responsáveis de verem na cultura do abacate um complemento “que não só pelo retorno económico, como pela sua adaptação ao clima do Algarve, vem acrescentar estabilidade á produção”, como explicou Pedro Madeira, sócio-gerente da Frusoal. Neste momento, a área produtiva ronda os 200 hectares totais plantados, estando em produção, aproximadamente 70%.
Já a Kiwilife, uma empresa jovem implantada em Montemor-o-Velho, que iniciou a atividade em 2018 na produção de variedades de kiwi, considera o abacate como “um produto estratégico para o crescimento e a diversificação de produtos e mercados”, motivo pelo qual decidiram investir nesta produção, revela o seu gerente de vendas.
“Como estamos muito dependentes da cultura do kiwi, que com as alterações climáticas tem tido produções decrescentes, é fundamental investir numa cultura alternativa que se adapte bem às condições da região da Beira Litoral e assim dar também uma alternativa de um bom rendimento aos nossos produtores bem como a produtores de outras culturas que tem mais dificuldade de produção e de rentabilidade”, acrescenta Luís Paulo Monteiro. A importância deste produto está patente na área de produção destinada – são 100 hectares plantados e o projeto de a alargar a mais 100 hectares.
Os investimentos na produção…
Se na Europa tem-se verificado uma tendência crescente da produção nos últimos 20 anos, em Portugal, particularmente, a produção cresceu dos 300 hectares de abacateiros instalados até 2013, para mais de 2500 hectares no final de 2021, segundo o INE (Instituto Nacional e Estatística), estando mais de 90% destes hectares, na região do Algarve. Um crescimento que resultou de investimento em área de plantio e em tecnologia, e que não tem parado.
Atualmente, a Frusoal está a investir fundamentalmente na substituição de áreas com baixas produtividades por plantações mais produtivas, tanto em abacates como em citrinos e diospiros, mas “com um foco maior no abacate, por ter um retorno mais rápido e de maior rentabilidade, isto sempre com as mais recentes tecnologias existentes”, conta Pedro Madeira.
No JBI Group, se não estão previstos aumentos de área de produção de abacate, tem havido, por outro lado, um forte investimento em tecnologia. “Investimos muito nos últimos anos criando ferramentas para nos ajudarem a ser mais eficientes no uso da água, da fertilização, criando condições para termos solos cada vez mais ricos, produzindo mais e de melhor qualidade, consumindo cada vez menos recursos naturais”, revela João Bento. O CEO destaca também o “investimento e foco” em boas práticas agrícolas que visam a proteção, preservação e potencialização da biodiversidade existente, “com todos os benefícios que isso nos traz”.
A Kiwilife planeia duplicar a área de produção de abacate nos próximos dois anos e chegar aos 400 hectares, num total de cerca de 100 produtores associados. “A variedade será predominantemente Hass, pois é a que o mercado procura e tem maior valorização”, destaca Luís Paulo Monteiro.
… e os desafios à produção
Quais são os grandes desafios que a produção nacional de abacate enfrenta? Para o CEO do JBI Group, os desafios que a cultura do abacateiro enfrenta são os mesmos que enfrentam as outras culturas: a disponibilidade de água e a necessidade de investimento para terem condições de uma maior oferta.
Mas João Bento destaca outro desafio. “As várias regiões do país, que é o mesmo, serem solidárias e sermos capazes de fazer chegar a água de regiões com bastante água a regiões deficitárias da mesma. Não faz sentido que não seja assim num país tão pequeno como o nosso”. Dá como exemplo o Alqueva, o maior lago artificial da Europa, para sublinhar que “com investimento conseguimos com menos de 100 hm3 anuais em períodos de necessidade satisfazer as necessidades mínimas da região mais a sul do Alentejo, sudoeste alentejano e Algarve, isto para manter o que está instalado”.
“A agricultura não é o problema da água nem das alterações climáticas, tem responsabilidades e tem vindo a implementar medidas de boas práticas e tecnologia nos últimos anos reduzindo o seu impacto na libertação de gases com efeito de estufa”, destaca, alertando que “a agricultura não pode nunca ser um setor dispensável, pelo contrário”.
Luís Paulo Monteiro aponta para as “diferentes realidades no país”. Se no Sul a falta de água é um problema para a produção, defende que na Beira Litoral o maior problema será a dimensão das explorações “que são muito pequenas e não permitem expandir o negócio”. “Neste momento há procura de terrenos para novas plantações e não se encontram com condições que permitam a rentabilidade de novas instalações”, lamenta.
O peso da exportação
No que diz respeito às exportações, dados do INE relativos a 2021, indicavam Espanha como o maior destino da produção de abacate português (86,6%), seguido dos Países Baixos (6,5%) e de Itália (3,4%). Para além de ser o maior destino das exportações de abacate português, Espanha é também o principal fornecedor deste fruto a nível europeu.
Na Frusoal, a exportação representa 80% da faturação na produção de abacate e tem como principais destinos os mercados nórdicos, além de França, Alemanha, Suíça, Luxemburgo e Espanha.
Na Kiwilife, os mercados externos representam 10% do volume de negócios, mas a empresa projeta e trabalha para que nos próximos anos a exportação atinja 40% da faturação. “Exportamos sobretudo para Espanha e França, são mercados que estão a crescer muito e valorizam a nossa fruta que se distingue por maior matéria seca que as de outras origens e os apreciadores já preferem a fruta portuguesa”, define Luís Paulo Monteiro.
O JBI Group destina grande parte da sua produção para os mercados externos, o que contribui para o equilíbrio da balança comercial. “Exportamos para vários países da Europa cerca de 90% através da Global Avocados, Holanda, França, Alemanha, Itália, Bélgica, Suíça e Espanha e para alguns nichos de m ercado em Madrid e Barcelona principalmente”, revela João Bento.
O CEO sublinha, por outro lado, o objetivo de continuar a aumentar as vendas para o mercado nacional. “O mercado e os consumidores nacionais só têm a ganhar, pois têm a possibilidade de consumir abacate com a melhor qualidade que alguma vez consumiram, e também ajudam a baixar a pegada ecológica de um produto que consomem e que vem de outros continentes”, defende.