Dos carros às casas. O futuro da eficiência energética
O número de veículos elétricos a circular em Portugal “duplicou” em 2015 e este ano ultrapassa os quatro mil. O mercado mundial de automóveis com “zero emissões” é liderado pela Nissan, que quer otimizar também o consumo doméstico de energia
Ana Catarina Monteiro
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O número de veículos elétricos a circular em Portugal “duplicou” em 2015 e este ano ultrapassa os quatro mil. O mercado mundial de automóveis com “zero emissões” é liderado pela Nissan, que quer otimizar também o consumo doméstico de energia.
A Nissan lidera a venda de automóveis elétricos a nível mundial. 250 mil dos mais de um milhão de veículos de “emissões zero” que circulam nas estradas do planeta foram comercializados pela marca nipónica. Em Portugal, o modelo Leaf lançado pela empresa em 2010 é o carro elétrico preferido dos automobilistas, com uma quota de mercado de 36,6%. Este ano bateu o recorde das 209 unidades comercializadas em 2015 com um total de 240 unidades vendidas no País entre janeiro e setembro.
Na Europa, as vendas de veículos elétricos da produtora superam as 70 mil unidades, revela Gareth Dunsmore, diretor da divisão veículos elétricos da Nissan Europe, por ocasião do Forum de Mobilidade Inteligente, levado a cabo pela empresa a 27 de outubro em Lisboa. O futuro da eficiência energética do planeta, desde os transportes aos edifícios, esteve em debate no evento.
Nissan Europe investe 4 milhões de euros por ano
Numa altura em que circulam cerca de 600 milhões de carros no mundo, a poluição do ar é responsável por problemas de saúde que levam a “400 milhões de mortes prematuras por ano na Europa”. Na Convenção das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, realizada no último ano em Paris, 197 países assinaram um acordo para mitigar os efeitos do aquecimento global através da redução das emissões de gases com efeito de estufa. O setor automóvel é responsável por “20% desse esforço”, dá conta José Mendes, secretário de Estado Adjunto e do Ambiente, que também participou no Forum. “Se nada for feito, o aquecimento do planeta pode levar a uma queda de até 10% do PIB [Produto Interno Bruto] mundial até final do século”.
A energia elétrica é atualmente a única solução que garante veículos 100% livres de emissões gases poluentes e de ruído. Além disso, enquanto os motores de combustão interna possibilitam uma “eficiência energética de entre 17% a 21%”, os motores elétricos assumem valores “acima dos 90%”, garantindo uma poupança económica que pode ser até “nove vezes superior”, de acordo com dados da UVE (Associação Utilizadores de Veículos Eléctricos).
Desde 2011 que a Nissan investe “quatro milhões de euros por ano na Europa” para promover a utilização de automóveis elétricos. Além de estar focada na produção e desenvolvimento da tecnologia, a marca aposta na instalação de pontos de carregamento para as baterias destes automóveis no “velho continente”, tendo em conta que a maioria dos modelos elétricos presentes no mercado tem autonomia para percorrer uma distância de até 100 quilómetros.
Governo quer alargar rede Mobi.e
Os veículos elétricos em circulação nas estradas portuguesas “duplicaram em 2015” e prevê-se que este ano superem os “quatro mil”, dos quais mais de metade são ligeiros, segundo Alexandre Videira, presidente da Mobi.e, empresa pública responsável pela gestão das operações da Rede de Mobilidade Elétrica Nacional, que disponibiliza 523 pontos de carregamento, com um total de 1298 tomadas, para este tipo de automóveis. A maioria dos postos são semi-rápidos, sendo que existem neste momento “17 carregadores rápidos” em Portugal, os quais permitem reduzir o tempo de carregamento da bateria de cerca de sete horas para 30 minutos.
A rede nacional foi implementada em 2010 mas esteve estagnada durante a governação de Passos Coelho. Atualmente cobre 57 municípios, sendo que o atual Governo “quer alargar a rede a todo o País e às autoestradas”. De acordo com o Secretário de Estado Adjunto, a prioridade é a “atualização da tecnologia e aumento da potência dos carregadores”.
O investimento de 1,9 milhões de euros na rede Mobi.e anunciado pelo Estado em fevereiro deste ano prevê a instalação de “200 novos postos em municípios nacionais que ainda não disponibilizem carregadores” de forma a cobrir todo o território nacional, e a atualização tecnológica de “100” pontos de carregamento existentes. Até final do ano o executivo estima a instalação de “14 novos carregadores rápidos” em cidades portuguesas.
Primeiro posto de carregamento da Europa em Oeiras
Em agosto passado, a rede pública inaugurou o primeiro corredor de carregamento rápido em Portugal, tornando possível viajar de carro elétrico entre Lisboa e o Algarve sem risco de ficar sem energia. A Galp, por sua vez, detém uma rede própria com 11 postos de carregamento rápido de veículos elétricos que cobrem o corredor entre Porto e Faro, passando por Lisboa. A operadora de eletricidade foi “pioneira na mobilidade elétrica, tendo colocado no último trimestre de 2010, na estação de serviço de Oeiras, o primeiro posto de de carga rápida da Europa Ocidental”, num projeto piloto desenvolvido com a portuguesa Efacec, explica Carlos Andrade, diretor de Investigação de Tecnologia da Galp.
A intenção do Governo, segundo o Secretário de Estado Adjunto José Mendes, é abrir o mercado de gestão dos pontos de carregamento da rede Mobi.e que, para já, são gratuitos “mas com a evolução da utilização da tecnologia trazem uma oportunidade de negócio para as empresas”.
No âmbito do Quadro Comunitário 2020, estão disponíveis apoios de “60 milhões de euros” para os operadores de transportes públicos converterem as suas frotas de autocarros para veículos movidos a gás natural ou elétricos. Aos consumidores finais, está garantida a “dedução de IVA (Imposto de Valor Acrescentado) na aquisição de veículos até 65 mil euros”. A medida foi já adotada em outros países, comprovando que “depois de o Estado dar este apoio, as marcas começam também a conceder incentivos semelhantes”.
Xstorage. Solução para armazenar energia em casa
Para o Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente, um dos principais desafios do setor de automóveis elétricos prende-se com as baterias. Os requisitos de qualidade do veículo obrigam a dispensar o produto em “entre sete a oito anos”, mas a bateria “pode ser aproveitada para outros fins”.
Consciente deste problema, a Nissan desenvolveu em parceria com a empresa de distribuição de energia e automação Eaton o sistema Xstorage, que permite dar uma segunda vida às baterias utilizadas nos veículos elétricos Leaf e promove a otimização do consumo doméstico de energia. A solução lançada em maio deste ano no Reino Unido funciona como uma bateria que se conecta a fontes de energia renováveis e permite gerir o consumo. Assim, numa casa em que se utilize por exemplo painéis solares para produção de energia pode-se armazenar energia nos períodos de tempo em que os valores das taxas de eletricidade são menores para poder ser gasta nos períodos em que o consumo mais engorda a fatura. A Xstorage, produzida a partir de células das baterias dos carros elétricos, permite também compensar eventuais quebras de energia. Está à venda no mercado britânico pelo valor de “quatro mil euros” e chega a Portugal “em 2017”, garante Guillaume Masurel, diretor-geral da Nissan Portugal. A marca espera vender mais de cem mil unidades da Xstorage nos próximos cinco anos.
Produção de energia renovável em Portugal“Não adianta promovermos a utilização de veículos sem emissões de poluentes se a energia no País for produzida a partir de fontes não sustentáveis”, sublinha José Mendes, Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente, por ocasião do Forum Mobilidade da Nissan, realizado em Lisboa. Portugal é o “quinto País” do mundo onde mais se produz energia “verde” per capita.
António Sá da Costa, Presidente da APREN (Associação Portuguesa De Energias Renováveis) acredita, por sua vez, que é possível chegar aos 100% de produção de energia a partir de fontes renováveis no País. “Mais de 62% da energia produzida este ano em Portugal até final de setembro é renovável, embora quase 70% siga para exportação”. O Governo pretende que a energia renovável chegue aos “80% de toda a produção em 2030”, mas o presidente da associação vai mais além. “É possível chegarmos aos 100% em 2040. A energia solar produzida no País vai multiplicar por 20 até 2040. No entanto, a produção não cobre o consumo durante todos os meses do ano”. A geração de energia “verde” para responder aos gastos de eletricidade, que aumentam nos meses em que o sol se esconde, pode ser corrigida com “a criação de mais barragens no País”, sugere. “É possível atingir um sistema de eletricidade com base em fontes 100% renováveis se apostarmos no armazenamento de energia em centrais hidroelétricas”.