Entrevista a Jorge Silva, Marketing Manager Bebidas Nestlé Portugal
Apenas quatro anos após o aparecimento no mercado nacional, Nescafé Dolce Gusto oferece as marcas locais Buondi e Sical em sistema fechado. Tudo para crescer 30% em 2011.
Victor Jorge
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“Este é o negócio do futuro e onde todos querem estar”
Num mercado que tem registado um crescimento ímpar, Nescafé Dolce Gusto conquistou a liderança em apenas quatro anos no segmento multi-bebidas. Para se tornar ainda mais apelativa para os consumidores portugueses, nada melhor que oferecer marcas portuguesas: Buondi e Sical. O objectivo do responsável por este negócio na Nestlé, Jorge Silva, é simples: “estar em todos os lares que bebam um café”.
Hipersuper (H): Nescafé Dolce Gusto anunciou recentemente que vai apresentar algumas novidades no mercado. Que novidades são essas?
Jorge Silva (J.S.): Antes de dizer quais são as novidades convém dizer que, desde o seu lançamento e até hoje, as novidades de Nescafé Dolce Gusto têm sido uma constante. Ou seja, todo este sucesso que tem sido Nescafé Dolce Gusto, tem assente na aposta clara na inovação quer ao nível das máquinas, quer nas cápsulas. Outro grande factor de sucesso é a excelente parceria com a Krups onde não podíamos ter melhor parceiro: é o casamento perfeito. Eles são especialistas em máquinas, nós em café e bebidas. Em relação às novidades, de referir quais foram apresentadas até agora, para depois enquadrar melhor o que temos para oferecer ao mercado. Nescafé Dolce Gusto surgiu em Setembro de 2007. Quando aparecemos no mercado foi com a Melody1 que, entretanto, já sofreu uma evolução para a Melody2. Em 2009, lançámos a Circolo e, em 2010, apareceram a Piccolo e a Fontana. Já em Março de 2011, lançámos a Creativa que tem um design parecido com a Melody, mas é a primeira máquina automática Dolce Gusto. Nas cápsulas, temos tido muitos lançamentos. É importante ter em conta que o nosso posicionamento é de multi-bebidas, mas obviamente num País como Portugal é fundamental termos um bom café. Naturalmente que todas as outras bebidas são importantes, de forma a apresentarmos variedade ao mercado, mas, em Portugal, é fundamental a questão do café. Ora, a Dolce Gusto aparece com o Expresso Intenso, depois aparece o Ristretto, em que Portugal foi o lead-market para o desenvolvimento deste blend. A partir do ano passado começámos a entrar com multi-marca, não nos limitando ao multi-bebidas. Assim, aparece o chá frio, Nestea, Nesquik e agora estamos a introduzir no mercado aquela que são as marcas de café de todos os portugueses: Buondi e Sical. São duas marcas locais muito fortes da Nestlé, marcas próximas de todos os portugueses. Estes dois lançamentos vão ser importantíssimos para nós, porque não só vamos manter os nossos consumidores actuais bastante satisfeitos, como vamos tornar-nos mais apelativos para novos consumidores, porque vão encontrar neste sistema as suas marcas de café preferidas.
H: A associação à marca é muito importante?
J.S.: É fundamental. Tendo em conta que são duas marcas de café que são muito próximas dos portugueses. Nos estudos que fizemos, a aceitação por parte dos consumidores demonstrou que valia mesmo a pena lançarmos estas duas marcas em Dolce Gusto.
H: Mas a diferença é só uma questão de marcas?
J.S.: O próprio blend é diferente. O blend de Buondi e Sical é o blend ao gosto dos portugueses. O que está dentro da cápsula é igual ao blend que o consumidor bebe fora de casa.
H: Não temem uma transferência do consumo?
J.S.: Obviamente. Vai canibalizar e muitíssimo o nosso Expresso Intenso e em parte o Ristretto. Mas sabemos que vamos deixar os nossos consumidores mais satisfeitos. Mas também sabemos que nos vamos tornar mais apelativos para mais consumidores.
H: Vale a pena, então, correr o risco?
J.S.: É um risco calculado e penso que, sinceramente, não podemos chamar risco. É uma mais-valia e valor que estamos a oferecer aos nossos consumidores, os actuais e os novos consumidores que iremos conquistar.
O gosto nacional pelo café
H: Para o sucesso deste lançamento, claramente, contribui o gosto dos portugueses pelo café?
J.S.: Claramente. Portugal é um País de café torrado, é algo que está culturalmente enraizado nos portugueses. A bica é algo cultural. O café solúvel, por exemplo, não tem grande aceitação. Não somos um País de café solúvel. O que acontece é que no café torrado, o sistema tradicional está a sofrer bastante. Não só a transferência de fora para dentro de casa, como depois, dentro da própria casa, também existe transferência. Se pensarmos que, em 2006, o total de chávenas de café bebidas era 70% fora do lar e, em 2010, não vai além dos 60%, num total de 5,4 mil milhões de chávenas, é um valor alto. Esta é uma tendência que veio para ficar. Os players que não estão neste mercado querem estar e este é o presente e o futuro. Este é o segmento mais dinâmico da categoria. Antes dos lançamentos destes sistemas estávamos perante uma categoria relativamente estável, mas com o aparecimento das cápsulas tudo mudou.
H: Beneficiaram do facto de estarem associados à Nespresso?
J.S.: Sem dúvida nenhuma. Nespresso abriu o mercado. Mas não podemos confundir as duas coisas. No caso de Nescafé Dolce Gusto estamos perante um conceito multi-bebidas, enquanto Nespreso é café.
H: Mas a que se deve este sucesso dos sistemas fechados?
J.S.: A data que tornou isto possível foi o dia em que entrámos para o euro. E porquê? Porque se antes uma bica custava 50 escudos, passou a custar 50 cêntimos fora do lar. Se isso não tivesse acontecido, muito dificilmente estes sistemas tinham entrado com tanto sucesso. Nós oferecemos a bica com a mesma qualidade, mas a metade do preço. Esta foi a origem do sucesso. Nespresso quando apareceu apostou fortemente em comunicação e abriu, claramente, o mercado, mas no retalho não havia nada. Nós fomos os primeiros no retalho.
H: Estando presentes no retalho, que importância tem a promoção no ponto de venda?
J.S.: É absolutamente critica para demonstrar e explicar os conceitos que estão na base do nosso produto: qualidade, inovação practicidade e design. É preciso por as pessoas a provar o nosso produto. Não vamos lá só com publicidade, porque essa só cria notoriedade. O que queremos é que as pessoas não só se lembrem, como nos prefiram. Grande parte do nosso budget vai para isso mesmo, acções de degustação.
H: Voltando atrás, referiu que não se registou somente uma transferência de consumo de fora para dentro do lar, como dentro do próprio lar?
J.S.: Sim, absolutamente. Dentro da categoria café existem vários segmentos, verificando-se que o café torrado sofre tanto fora como dentro de casa. As pessoas trocaram as suas máquinas de cachimbo por sistemas fechados. Actualmente, mais de 20% do total das chávenas de café tomadas em casa são em sistema fechados. Tendo em conta que este sistema apareceu em 2004, estamos perante um crescimento como nunca assisti. Qualquer um dos sistemas que existam dentro do lar, são mais vantajosos e económicos que fora do lar.
H: A crise veio ajudar este negócio?
J.S.: A crise, claramente, ajudou este segmento. O consumidor tem um investimento inicial numa máquina, que cada vez é menor, e depois bebe um café de grande qualidade por cerca de 30 cêntimos. Nós democratizamos este sistema dentro do lar e o consumidor rapidamente amortiza o investimento feito na máquina. Qualquer sistema existente hoje é barato.
H: Dentro da Dolce Gusto, qual o mais vendido?
J.S.: Hoje em dia, o SKU mais vendido é o Expresso Intenso. Representa quase 50% das nossas vendas. Mas rapidamente vai deixar de o ser. Porquê? Porque Buondi e Sical vai canibalizar, claramente, essas vendas.
Crescer, crescer, crescer
H: Em Março, por altura da apresentação de resultados da Nestlé Portugal, o administrador-delegado da companhia, António Reffóios, admitia que o crescimento da empresa tinha por base a prestação dos sistemas fechados. Que contribuição tiveram efectivamente?
J.S.: Claramente que foi e vai continuar a ser um negócio muito importante para a companhia. Este é o negócio mais dinâmico dentro da companhia, é a principal aposta da Nestlé para os próximos anos e, portanto, vai ser um negócio que, ano após ano, vai ganhar peso dentro da companhia. O que poderá representar no futuro, não sei. Temos as nossas contas, mas essas são confidenciais.
H: Mas quanto é que facturaram em 2010?
J.S.: Facturámos bem. Não é política da empresa divulgar facturações por área de negócio. Posso dizer que crescemos mais de 70% quando comparado com 2009.
H: E estimativas para 2011?
J.S.: Temos uma estimativa bastante optimista de um crescimento acima dos 30%.
H: O que é invulgar nas actuais condições de mercado?
J.S.: Completamente utópico. E estamos a falar de um ponto de partida [2009] interessante. Claramente este é negócio do futuro, onde todos querem estar e, por isso, aparecerem tantos players. E estamos à espera que apareçam mais.
H: A GfK refere que Nescafé Dolce Gusto tem uma quota de 32,5%, no final de 2010?
J.S.: Sim, nós lideramos o mercado. H: Mas se juntarmos a estes dados a Nespresso, a Nestlé é o grande player do mercado? J.S.: Sim, bem acima dos 60% nos sistemas de cápsulas. Segundo dados da Nielsen (Semana 08/2011), no retalho [o que não inclui Nespresso], o mercado de sistemas fechados está crescer 93% em valor e 86% em volume. Naturalmente que não vamos continuar a ter esta grandeza de crescimento, mas considero evoluções a duplo dígito plausíveis para o futuro próximo. Dolce Gusto é claramente líder de mercado com uma quota, em valor, de 55% e em volume 60%.
H: Como explica isto?
J.S.: A Nespresso beneficiou do facto de estar muito tempo só no mercado e por isso, o mercado era Nespresso. Quanto a Dolce Gusto, o nosso sucesso foi baseado na inovação. No último ano fomos a marca mais dinâmica no mercado. Lançamos três modelos de máquina, com um design super-apelativo, com preços bem distintos para podermos captar todas as faixas da população. Hoje digo-lhe: qualquer lar que beba café é um lar potencial para Nescafé Dolce Gusto. Porquê? Porque tem um investimento inicial da máquina que depois será amortizado ao longo do tempo. Uns amortizam mais depressa outros levam mais tempo, depende do consumo.
H: Os lineares de café sofreram uma transformação?
J.S.: Uma transformação completa. Como este é um segmento que cresce muitíssimo e como alguns dos que lá estão decrescem, o espaço de linear no futuro vai ser outro. Talvez tenhamos de ir para outras categorias que não sejam tão dinâmicas. Mais dia, menos dia temos de ir “roubar” espaço a outras categorias.
H: Quais?
J.S.: Não sei. Mas aí terá de ser a distribuição a dar-lhe a resposta porque é ela que conhece as próprias lojas.
Concorrência MDD
H: O aparecimento da concorrência foi benéfico?
J.S.: Claramente. A entrada do Pingo Doce fez com que o mercado crescesse. As máquinas cresceram 39%, em volume, e 5,5%, em valor. É algo que era completamente diferente há dois ou três anos. Nessa altura registava- -se um crescimento maior em valor e menor em volume, já que as máquinas eram de um price-point muito superior. Nos dados Year-to-Date, Janeiro/Fevereiro, as máquinas estão a crescer 61%, em unidade, e 2,1%, em valor. O aparecimento do Pingo Doce e o aparecimento da Picolo mudaram completamente as regras do mercado. O mercado está a crescer fundamentalmente via preço. Cada vez são mais pessoas a ter máquinas em casa, mas de price-point mais baixo. Estes são os grandes ganhadores e fizeram com que o mercado claramente crescesse.
H: Mas o mercado vai continuar a mostrar este dinamismo via preço?
J.S.: Todos já perceberam que o mercado está a ir para um price-point mais baixo e que vai haver reposicionamento de preço.
H: Estamos a falar de que valores?
J.S.: É a incógnita. Abaixo dos 50 euros não acredito. Actualmente, o preço mais barato é a máquina do Pingo Doce a 49,90 euros.
H: Mas não teme que os players da distribuição vejam aqui um negócio interessante e comecem a apostar não só no café, mas também em segmentos de máquina?
J.S.: Com certeza e a experiência do passado diz-nos isso. Mas desde que entrem novos players e o mercado continue com este dinamismo, é sempre positivo.
H: E para quando chá quente em sistema fechado?
J.S.: Não sabemos. Sabemos que é uma das coisas que está na calha, mas no curto-prazo não haverá novidades. A nossa prioridade foi, de facto, para o lançamento das marcas locais. O chá é importante, mas não deverá acontecer este ano.
H: Quantas máquinas têm no mercado?
J.S.: Nescafé Dolce Gusto já está presente em mais de 250 mil lares em Portugal.
H: E em quantos lares poderão estar?
J.S.: O meu objectivo é estar em todos os lares que bebam um café. Há quem diga que somos 3,5 milhões de lares, há quem diga que somos 3,7 milhões de lares. Temos condições para crescer e as nossas projecções apontam para que o crescimento manter-se-á no futuro.
H: Na comunicação que fazem aparecem palavras como inovação, conveniência, practicidade e qualidade. Falta mais alguma?
J.S.: Juntar-lhe-ia design. É importante. E além disso, o preço, embora não seja o foco principal.
H: Existe a possibilidade de Buondi e Sical serem exportados?
J.S.: Buondi é exportável. Sical para já é exclusivamente para o mercado português. Em Outubro de 2010 foi anunciado que Buondi iria ser uma das marcas de referência da Nestlé para o mercado de cafés.