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Entrevista

Francisco Toscano Rico (CVR Lisboa): “Ostentar no rótulo o nome da capital é importante na exportação, mas o grande trunfo é a qualidade”

Com uma forte vocação exportadora, a região demarcada de Lisboa vende além-fronteiras 80% da sua produção para mais de 100 geografias. Nos últimos seis anos, uma em cada três novas garrafas de vinho exportadas são de Lisboa. Ostentar o nome da capital do país no rótulo ajuda a vender, mas por si só não é suficiente, frisa Francisco Toscano Rico, presidente da CVR Lisboa, em entrevista ao Hipersuper, salientando que o grande trunfo é a qualidade e a promoção coletiva sob o chapéu “Vinhos de Portugal”

Rita Gonçalves
Entrevista

Francisco Toscano Rico (CVR Lisboa): “Ostentar no rótulo o nome da capital é importante na exportação, mas o grande trunfo é a qualidade”

Com uma forte vocação exportadora, a região demarcada de Lisboa vende além-fronteiras 80% da sua produção para mais de 100 geografias. Nos últimos seis anos, uma em cada três novas garrafas de vinho exportadas são de Lisboa. Ostentar o nome da capital do país no rótulo ajuda a vender, mas por si só não é suficiente, frisa Francisco Toscano Rico, presidente da CVR Lisboa, em entrevista ao Hipersuper, salientando que o grande trunfo é a qualidade e a promoção coletiva sob o chapéu “Vinhos de Portugal”

Rita Gonçalves
Sobre o autor
Rita Gonçalves
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CVR Lisboa FTRCom uma forte vocação exportadora, a região demarcada de Lisboa vende além-fronteiras 80% da sua produção para mais de 100 geografias. Nos últimos seis anos, uma em cada três novas garrafas de vinho exportadas são de Lisboa. Ostentar o nome da capital do país no rótulo ajuda a vender, mas por si só não é suficiente, frisa Francisco Toscano Rico, presidente da CVR Lisboa, em entrevista ao Hipersuper, salientando que o grande trunfo é a qualidade e a promoção coletiva sob o chapéu “Vinhos de Portugal”

Em 2022, os vinhos de Lisboa alcançaram valores recorde de vendas. Foram comercializadas mais 5,5 milhões de garrafas, em relação ao ano anterior, para um total de 66 milhões. As vendas de vinho branco, o ex-libris da região, aumentaram 25% e as exportações subiram 5%.

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Além disso, podemos aditar que as vendas na restauração nacional subiram 100% em 2022.

Já lá vamos, se me permite. Ia perguntar-lhe qual foi o valor das vendas.

Não conseguimos quantificar. Porque são várias fontes diferentes e de universos diferentes. Conseguimos quantificar em volume, mas depois não conseguimos transformar isso em valor. Porque os dados chegam de diferentes fontes, do Instituto Nacional de Estatística (INE), da Nielsen, do Instituto da Vinha e do Vinho (IVV). Não conseguimos transportar o volume de vendas – que nós controlamos porque dizem respeito ao número de garrafas que foram introduzidas no mercado – para um valor. Seria sempre uma estimativa muito grosseira. Hoje podemos dizer uma coisa e amanhã outra e prefiro não avançar um valor.

As vendas no exterior são o forte da região demarcada de Lisboa. Qual é a quota de exportação em relação ao volume global das vendas?

A exportação representa 80% do volume de vendas da região. Exportamos para cerca de 100 mercados diferentes. A vocação exportadora da região é fortíssima. E essa importância não se nota apenas a nível regional. A região de Lisboa está a contribuir para o crescimento global das exportações de vinho português.

Para ter uma ideia, nos últimos seis anos, uma em cada três garrafas que Portugal exportou a mais, ou seja, daquilo que foi o crescimento da exportação de vinho português, é vinho de Lisboa, retirando os vinhos do Porto, que são uma categoria muito própria. Se olharmos para o vinho nacional, exceto Vinho do Porto, Lisboa contribuiu com um terço para o crescimento das exportações de vinho português.

Atualmente, a quota do vinho de Lisboa nas exportações totais de vinho português é de cerca de 20% em volume. Mais uma vez, retirando o Vinho do Porto, é a região que em percentagem daquilo que produz e vende que mais exporta em Portugal.

As exportações ganharam um especial ímpeto nos últimos anos.

Sim. O ritmo de exportação, e obviamente as vendas totais da região, começaram a ter uma dinâmica extraordinária a partir de 2016. Foi o período a partir do qual a região começou a crescer a dois dígitos todos os anos. E isso significa, se observarmos o período entre 2015 e 2022, um crescimento de vendas na ordem de 150%.

Obviamente que há medida que o tempo passa o crescimento percentual é cada vez menor, mas, em termos de valor absoluto, é em média quase cinco milhões de garrafas por ano de acréscimo. Quando estamos a partir de uma base superior, esses cinco milhões em termos percentuais já não representam um crescimento a dois dígitos. Seria impossível e impensável que uma região pudesse, perpetuamente, continuar a crescer a dois dígitos. De maneira que, no último ano, o crescimento das vendas foi de 9% e o das exportações de 5%.

Lisboa ser uma das poucas capitais do mundo com uma região vitivinícola em seu nome é uma ajuda de peso para as exportações da região?

Ter uma região vinhateira que tem o nome da capital de um país, transforma a própria região com uma forte vocação exportadora num grande embaixador de Portugal e dos vinhos portugueses no mundo. É, por isso, um contributo para os produtores da região e para Portugal como um todo, não só no setor vinho, mas também.

Nas ações de comunicação e promoção lá fora, ajuda a que o consumidor e os críticos de vinho entendam melhor aquilo que estamos a falar. Assumir o nome de Lisboa, da capital de um país como Portugal, foi algo muito importante para a região.

No entanto, é apenas uma pequena parte do contributo para o desempenho da região. Ou seja, é importante porque, quando levamos uma garrafa de vinho para fora, levamos o nome de Portugal e da própria região de Lisboa para mais de 100 países, mas o trunfo tem de ser sempre a qualidade. E o desempenho do vinho português e do vinho de Lisboa tem exatamente a ver com a capacidade de oferecermos produtos diferentes, com identidade e qualidade. Se não fosse isso, não era o nome por si só que traria este desempenho.

Eu diria que é mais um fator que ajuda na facilidade de comunicar e de quem está do outro lado percecionar. No fundo, já começam a perceber, finalmente, onde é que é Portugal e a capital portuguesa.

 

Austrália: uma inesperada surpresa

 

Quais são os principais mercados de consumo de vinho de Lisboa?

Em 2022, o Reino Unido passou a ser o principal destino dos vinhos de Lisboa, ultrapassando os EUA, historicamente o principal mercado de exportação. Seguem-se Brasil, Canadá, Polónia e os mercados escandinavos como um todo. Estes são os mercados de eleição do vinho de Lisboa.

Há, por outro lado, nove mercados onde os vinhos de Lisboa estão a ter um desempenho absolutamente fascinante, como é exemplo Israel e Austrália. Mercados que há uns anos pensávamos serem improváveis e que atualmente revelam uma procura crescente. Esta diversificação é fundamental para uma região com esta vocação exportadora e para quem está num negócio altamente competitivo como é o do vinho em todo o mundo.

Exportam cerca de 700 garrafas por minuto. Que estratégia desenharam para reforçar este número?

Em termos estratégicos, olhamos para o posicionamento de Lisboa primeiro como Portugal. Temos de estar concertados com aquilo que é a promoção do país. Olhamos para promoção do setor como um todo, através da ViniPortugal, percebendo onde é que Portugal como um todo pode dar cartas. Porque, lá fora, somos todos pequenos. Só em conjunto é que isto resulta. Os resultados que temos hoje decorrem exatamente dessa união do setor. Assim, olhamos primeiro para a marca Vinhos de Portugal e para onde é que essa marca está a ser divulgada e promovida. Um pouco por todo o mundo, é verdade, mas muito em especial nos principais mercados do vinho português que são, também, os principais mercados do vinho de Lisboa. Brasil, EUA, Canadá e Reino Unido, entre outros.

No fundo, olhamos isto com duas perspetivas. Para mercados onde já somos fortes, que já conhecem e procuram os vinhos portugueses, e onde procuramos aprofundar a divulgação do vinho de Lisboa. Ou seja, aproveitar a apetência e a procura que já existem, assim como o conhecimento e o reconhecimento cada vez maior do vinho português nesses países e, depois, aprofundar esse conhecimento comunicando a especificidade e a qualidade dos vinhos de Lisboa.

Foi através desta estratégia coletiva que têm vindo a ganhar terreno nestes novos mercados que enumerou, nomeadamente Israel e Austrália?

Sem dúvida. Embora a Austrália não tanto. A Austrália é um case study para o vinho de Lisboa. Não é um destino que tenha alguma relevância para Portugal como um todo, é um caso de sucesso para Lisboa, onde os vinhos da região começam a ter uma procura interessantíssima. Ainda não está, naturalmente, no grupo dos seis ou sete principais mercados, mas começa a despertar e a assumir alguma relevância.

É, no entanto, uma exceção. Nos outros mercados já havia claramente uma locomotiva, uma tração, um investimento continuado e o que fizemos foi aproveitar essa dinâmica e reforçar a comunicação.

Quão difícil é promover os vinhos nacionais num mercado global tão competitivo?

Para perceber o quão difícil é promover lá fora e o nível de competitividade no mercado mundial, apostamos em trabalhar uma perspetiva direcionada para o mercado profissional, com algumas, poucas, exceções. O nosso objetivo é, em primeira mão, darmo-nos a conhecer junto de críticos de vinho e potenciais importadores.

Isto significa dois tipos de iniciativas. Ações nos mercados de destino e o que chamamos as visitas inversas, trazê-los cá e mostrar a nossa realidade. Vivenciar e experienciar a região faz toda a diferença e sentimos que o retorno é enorme. Todos os anos temos trazido importadores do Brasil, EUA, Canadá, entre outros, com bons resultados.

Por outro lado, marcamos presença nas principais feiras internacionais especializadas, a Vinexpo (Paris), a Prowein (Dusselfdorf), por exemplo, junto da ViniPortugal, dentro do chapéu Portugal, porque é assim que nos queremos apresentar. Mais como uma valência do vinho português e não de forma isolada.

Este ano, tivemos também no Brasil, onde vamos estar novamente mais para o final do ano, porque é um mercado que está com uma apetência enorme pelo vinho português e o vinho de Lisboa e onde estamos a crescer imenso e apostar muito.

Apostamos ainda em publicações de referência, dando vinhos a provar, promovendo a prova e a crítica da região por parte de especialistas.

Quais são os mercados exceção a esta estratégia de promoção?

Há um único mercado externo onde estamos a atuar, de forma complementar, junto do consumidor final. É o Brasil. Pela apetência que mostra e pela ligação a Portugal, fazia todo o sentido trabalhar, além do público profissional, o consumidor final. Neste mercado, estamos a apostar em campanhas com influencers nas redes sociais, nas revistas, em eventos e festivais dirigidos ao consumidor final. Em todos os outros mercados, a grande aposta é o público profissional.

Apesar de ser um mercado muito grande e competitivo, há interesse em conhecer o vinho de Lisboa e retorno tem sido grande com as vendas a crescerem todos os anos. Entendemos que em todos os outros mercados a grande aposta deve ser o público profissional, sejam estes importadores, distribuidores e críticos de vinho, entre outros.

No ano passado, na Suíça, mercado mais pequeno, mas com um preço médio muito interessante, dos mais altos entre todos os mercados externos, tivemos três masterclasses dirigidas a potenciais importadores, jornalistas e críticos de vinho em três cidades suíças. Estar presencialmente, dar a provar, explicar a região e convidá-los a virem cá experienciar a região é importante.


Francisco Toscano Rico_CVR LIsboaNem só de brancos vive a região de Lisboa

Como é que integram na estratégia de exportação os grandes mercados consumidores de brancos, uma vez que Lisboa é uma região produtora por excelência de brancos?

Sobre isso gostaria de dizer que é verdade que esta região tem todas as condições para produzir grandes vinhos brancos, mas no mercado mundial e no mercado nacional a maioria do consumo ainda é de vinho tinto. Olhando para o consumo de vinho em Portugal e no mercado mundial, diria que é quase 70% de vinho tinto, 20% de vinho branco e 5% de rosé. Lisboa não foge à regra. A nossa estratégia não passa exatamente por estarmos a comunicar Lisboa como uma grande região de vinhos brancos, mas vinhos no geral. Só quando vamos mais ao particular é que podemos demonstrar um bocadinho como é que esta região influencia o perfil dos vinhos, como é que este terroir ligado a uma zona costeira se traduz depois num perfil de vinhos brancos muito interessante. No entanto, os tintos são também influenciados por este terroir e, como tal, têm também um perfil especial.

Ou seja, é verdade que somos uma região de excelência para a produção de vinhos brancos, mas daí não se pode inferir que é nos vinhos brancos que temos de apostar. Apostamos, sim, naquilo que o mercado está à procura. E se é verdade que hoje o consumo mundial de vinho está a crescer mais nos brancos que nos tintos, o grosso do mercado ainda é tinto.

Ou seja, não há uma segmentação na comunicação em função do mercado de destino.

Sim. Repare, por exemplo, no Brasil, país que associamos a um clima tropical e tendencialmente diríamos que tem um consumo essencialmente branco, é ainda muito de vinho tinto. Embora o vinho branco esteja a crescer bastante. Porquê? Tem a ver com os momentos de consumo. O brasileiro associa o consumo de vinho a momentos especiais, como o churrasco.

Não temos este nível de segmentação de comunicar só tintos ou brancos consoante o mercado de destino. O setor do vinho está totalmente globalizado e temos de perceber que em todos os mercados do mundo há uma competitividade enorme quer de vinho europeu quer americano. Temos de mostrar o que de melhor temos e naquilo que somos bons, mostrando um bocadinho de tudo.

Não vejo como muito interessante segmentar exceto em momentos muitos específicos, para um determinado importador ou crítico de vinho, ao qual queremos por exemplo mostrar a casta Arinto, a casta rainha da região, que tem o seu solar em Bucelas, dentro da região demarcada dos vinhos de Lisboa.

É talvez na região de Lisboa onde a casta Arinto mais expressa toda a sua potencialidade qualitativa. Claro que isso é uma bandeira da região e comunicamos. Mas não estamos especialmente centrados nisso porque estaríamos a segmentar demasiado para um mercado tão vasto. Por isso, primeiro Portugal, depois região de Lisboa, e depois, quando se justifica, segmentamos junto de públicos muito selecionados.

Temos algumas castas autóctones de vinho branco, o Arinto, a Vital, a Malvasia de Colares, vinhos únicos no mundo. Há uma série de valências da região que permite uma comunicação muito fina e assertiva, mas que não deve fazer-nos esquecer o chapéu mais global, sob pena de depois não conseguirmos ganhar visibilidade suficiente.

Como é que os vinhos de Lisboa se comportaram nos primeiros seis meses do ano?

O momento é difícil. O consumo mundial de vinho está a cair. Houve um crescimento do consumo na fase do confinamento e, claramente, agora há uma tendência de quebra. A procura como um todo está em decréscimo. Isto impacta diretamente uma região que exporta 80% da produção.

No mercado nacional é o turismo que está a aguentar as vendas de vinho.

O canal horeca.

Sim, sem dúvida. Depois de uma fase ascendente das vendas na grande distribuição durante a pandemia de covid-19, no ano passado as vendas recuaram, uma quebra que, no fundo, continua a acontecer e tem muito a ver com a situação económica. O consumidor nacional, que é quem, no fundo, adquire com maior frequência o produto nas grandes superfícies, está mais retraído nesta fase em que nos encontramos. O canal horeca, em especial por força da dinâmica do turismo, é que tem aguentado o mercado nacional.

Nos mercados internacionais vemos uma grande indefinição. Com o consumo a recuar, o atual clima económico e o contexto geopolítico, decorrente da guerra na Ucrânia, há uma indefinição sobre para onde é que o mercado estará a ir.

Sente-se isto de forma imediata porque há muitos mercados retraídos nas compras. Não significa isto que não há apetência para comprar, mas enquanto tradicionalmente os contratos eram celebrados a médio e longo prazo e para volumes importantes, neste momento acontece aquilo que chamamos compras à vista. Os negócios são feitos para o curto prazo e em pequenos volumes e isso gera ansiedade no mercado como um todo. Os produtores, que precisam de escoar a sua produção e fazer os seus contratos de venda, estão a ver as coisas a acontecer a um ritmo muito mais lento do que aquilo que era tradicional neste setor. E isso não gera obviamente um clima de confiança.

As vendas atuais – e estou convencido de que as vendas da região de Lisboa são um bocadinho mais favoráveis do que as de Portugal como um todo – estão ligeiramente acima do ano passado. Todos temos esperança de que as vendas continuem a acontecer, e estão, mas a um ritmo muito mais lento. Os compradores mundiais estão retraídos nas compras.


Chegar às 90 milhões de garrafas não é uma miragem


Quais as suas perspetivas em relação ao fecho do ano?

Perspetivar é sempre difícil porque o mercado está muito incerto sobre a direção que vai tomar, o que vimos primeiros seis meses foi claramente as vendas a subirem, mas muito ligeiramente em relação àquilo que desejamos e ao histórico da região.
As vendas podem fechar em linha com as do ano anterior?

Sim, dependendo de muitos fatores, internos e externos. Os internos têm a ver com a ver com a manutenção ou crescimento do turismo em Portugal. O secretário de Estado do turismo fez recentemente um balanço de crescimento dos primeiros seis meses do ano e perspetivou para os próximos uma evolução favorável por conta do adicional de consumo decorrente do turismo. Há ainda alguma expetativa em relação à economia mundial, com o abrandamento da inflação e, por conta disso, uma maior disponibilidade financeira dos consumidores e mais propensão ao consumo não só em Portugal, como na Europa e no mundo. Temos uma expectativa positiva, mas muito prudente.
A região de Lisboa tem uma área de vinha de cerca de 18 mil hectares, dos quais 10 mil corresponde a vinho certificado DOP e IGP?

Não gosto de falar dos 18 mil hectares porque vinho de Lisboa são 10 mil o resto diz respeito a outras vinhas que não são vinho de mesa. A região tem dez mil hectares de vinha certificada, que dão origem aos vinhos de Lisboa e aos vinhos das suas nove denominações de origem [Colares, Carcavelos, Bucelas, Alenquer, Arruda, Torres Vedras, Lourinhã, Óbidos e Encostas d’Aire], é também ela uma região demarcada rica em portefólio.

São cerca de duas mil famílias de viticultores que exploram esses dois mil hectares de vinha, o que significa uma área média de cinco hectares. É uma área média muito superior à média nacional e à maior parte das regiões. Obviamente que no Alentejo teremos outros níveis de dimensão das propriedades e das vinhas. Mas, olhando para a média nacional, isto mostra que há uma viticultura profissional e viticultores já com uma área de vinha interessante que os torna competitivos.

Têm de ter alguma escala para conseguir exportar.

Exatamente. É este nível de profissionalização da atividade agrícola, e especialmente do vinho, na região de Lisboa que, depois, deu essa visão aos próprios empresários de serem competitivos e encontrar as melhores oportunidades. O mercado português é finito. Pode ter um empurrão da parte do turismo, mas é um mercado muito pequeno e finito para aquilo que é a potencialidade do vinho português. Em boa hora, a região começou a olhar muito mais lá para fora do que cá para dentro. No entanto, também é verdade que há uma apetência enorme no mercado nacional para redescobrir o vinho de Lisboa.

Apesar de tudo, o nome da região é relativamente recente. Como marca – região nasceu em 2010. Por força do dinamismo e da qualidade do vinho, há uma apetência crescente do mercado nacional para também descobrir estes vinhos, assim como dos próprios turistas que querem provar vinho de Lisboa que já consumiram no seu país. E daí assistirmos a um crescimento de 100% nas vendas no canal horeca. Para nós, é muito interessante. Porque é um mercado mais premium, onde os pequenos produtores conseguem ter uma maior presença.

Concluindo, diria que a grande maioria dos produtores de Lisboa exportam, sendo que os maiores representam naturalmente a maior fatia. Vemos como muito interessante este dinamismo mais recente do Horeca. Á listagem dos vinhos de Lisboa nos restaurantes juntam-se também os pequenos produtores e isso é fundamental.

Há potencial e interesse em aumentar a produção na região a prazo?

Sim, há potencial para crescer em volume. Estamos nas 66 milhões de garrafas. Há um número mágico – 70 milhões de garrafas – avançado há uns anos e que agora nos parece uma perspetiva muito conservadora face ao que tem sido o ritmo de crescimento. Aproximarmo-nos de uma região como a dos Vinhos Verdes ou do Alentejo, que andam ali nos 80 a 90 milhões de garrafas anualmente, não é irrealista. Podemos lá chegar.

Queremos crescer pela via da quantidade, um crescimento mais orgânico que tem a ver com a escala da própria região. Sem escala, não podemos existir. Uma das mais-valias da região é ter empresas com dimensão e organização logística muito profissional que permite abordar os mercados de exportação mais exigentes e tem sido um fator crítico de sucesso. O volume é importante nessa escala para a qual temos de continuar a trabalhar, na apetência para plantar mais vinha, mas queremos também crescer pela via da valorização do próprio vinho.

O valor acrescentando tem de ser por via do aumento da quantidade e também aumento de preço. E esse aumento de preço é o grande objetivo de todos os produtores e regiões na exportação. É muito mais difícil, mas Portugal como um todo e a região de Lisboa têm feito esse caminho. É um caminho mais difícil e lento, mas considero que estamos a fazer um bom trabalho.

Porque, no fundo, qual é o objetivo primário da criação das regiões demarcadas? É garantir um rendimento justo ao viticultor. Valorizar a rentabilidade da vinha. E para que isso aconteça é preciso ter bom vinho e este ser bem remunerado no mercado.

Que papel pode desempenhar o enoturismo na criação de valor?

O enoturismo começa a ter uma importância crescente e temos de ligar as duas coisas. Falar só de vinho já é muito pouco. Entendemos que numa região como Lisboa as oportunidades de crescimento do valor acrescentado estão mais ligadas ao enoturismo do que só à atividade de produção e venda de vinho. E os produtores estão cada vez mais a apostar nesta valência e na profissionalização, com mais adegas abertas. mais serviços disponibilizados e maior diversidade de experiências, aproveitando a aproximação à cidade de Lisboa. Embora a cidade seja cada vez mais um íman, no sentido em que tem tanta oferta para quem a visita, não é nada fácil convencer alguém a sair da cidade, tendo em conta que a média de dormidas é de dois, três dias. É uma vantagem competitiva abraçarmos a capital, mas a capital também é ela própria um íman.

Desta forma, o nosso esforço de comunicação vai no sentido de mostrar quão perto estamos de Lisboa e a diversidade e qualidade das experiências, que não se restringe às adegas, mas a tudo o que o território tem para oferecer, como praias, serras, gastronomia, entre outras valências.

Nos últimos dois anos, trabalhamos muito a parte do enoturismo, apostando na promoção externa através da participação em eventos de turismo e enoturismo, em regra em conjunto com outras regiões, como a Bairrada, o Tejo, Beira-Interior e Dão, que são as cinco regiões vinhateiras do centro de Portugal. Dos contactos nessas feiras percebemos que nos vendemos muito melhor em conjunto do que isoladamente.

Criámos inclusive um produto que tem a ver como enoturismo atlântico Lisboa – Bairrada que nasce das sinergias que se geraram desta promoção conjunta. Se conseguirmos que o turista que visita Portugal fique mais uma noite, todos ganhamos com isso.


Grande distribuição: um canal pouco explorado


Qual tem sido o papel do retalho alimento na evolução dos vinhos de Lisboa no mercado nacional?

O retalho alimentar, e concretamente a grande distribuição, representa 70 a 75% das vendas de vinho em Portugal. É um pilar fundamental para a comercialização de vinho em Portugal. Nos últimos anos, se recuarmos seis, sete anos, vemos claramente uma aposta do retalho alimentar em dar mais espaço ao vinho e a diversificar a oferta apresentada ao consumidor.

Tem também um papel importante na comunicação. É um canal muitíssimo forte de comunicação através das redes sociais, dos folhetos e do próprio ponto de venda. Uma comunicação que tem um caráter mais pedagógico e informativo. Temos sentido que há esse cuidado e esse investimento.

Vemos também algum esforço de valorização do produto em prateleira. Olhando para os números, com as oscilações que vão existindo de ano para ano, nota-se uma tendência de valorização do preço médio de venda.

Agora, os vinhos de Lisboa ainda têm uma presença muito marginal na grande distribuição. É uma região que por opção estratégica apostou sempre muito mais na exportação, onde encontrou muitas mais oportunidades para exportar do que no mercado nacional, já saturado. A quota de mercado dos vinhos de Lisboa é de cerca de 4% na grande distribuição enquanto a quota de mercado na exportação é de 20%. Daí já vê a disparidade.

No entanto, nota-se uma apetência crescente do mercado nacional por vinhos de Lisboa e a sua presença na grande distribuição está muito aquém do seu potencial. Estamos agora como região a olhar mais para o mercado nacional porque entendemos que há uma oportunidade que ainda não foi devidamente explorada. Se é verdade que no canal horeca vemos os resultados a aparecerem de forma muito evidente, temos consciência de que há uma oportunidade a explorar na grande distribuição.

E temos feitos muitas reflexões acerca da forma como devemos trabalhar com a grande distribuição, mas é inevitável fazê-lo no curto prazo porque a oportunidade existe.

Por outro lado, temos de perceber que é um negócio que tem muito a ver com as margens e com escala. Não temos a pretensão de pensar que poderemos listar muitos vinhos, o portefólio é restrito a grandes marcas e produtores. Mas isso não lhe retira importância. Um canal de escoamento que vale 75% a 80% das vendas em volume é crítico para qualquer região e produtor com alguma dimensão.

O que pode fazer de diferente a região de Lisboa na grande distribuição?

Fazer um trabalho de parceria com as principais cadeias, no fundo ações de ativação em ponto de venda, dando a conhecer o vinho. E criar momentos de comunicação e prova, que já sabemos que resultam.

Entrevista originalmente publicada na edição  414

Sobre o autorRita Gonçalves

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Entrevista

Afonso Almeida: “A intermodalidade e a multimodalidade são o presente e o futuro da logística de transportes”

Entrevista com Afonso Almeida, presidente da Associação Portuguesa de Logística.

Hipersuper

As empresas do setor da logística e transportes precisam que avance o TGV entre Lisboa e Porto e a ligação entre Lisboa e Madrid. É ainda urgente terminar a nova ligação entre Sines e a fronteira espanhola, avançar a nova fase de Sines e, acima de tudo, “que se tomem as decisões certas com uma visão estratégica em termos logísticos para o país e com uma rapidez bem superior ao passado”, defende Afonso Almeida, presidente da Associação Portuguesa de Logística, nesta entrevista ao Hipersuper.

É possível quantificar o peso do setor da logística e transportes na economia nacional?
Não é fácil ter dados totalmente concretos sobre o peso da logística e transportes na economia nacional, mas estudos internacionais apresentados em conferências indicavam que estes setores tinham na economia mundial um peso de mais de 10%. Estes últimos anos, com um aumento significativo das entregas on-line e tudo o que está por detrás desta atividade, fez seguramente com que tenha existindo um crescimento no peso do setor da logística e transportes na economia portuguesa.

Para a APLOG, e, consequentemente, para os players da logística e transportes, quais deviam ser as prioridades do atual Governo em termos de infraestruturas?
Em termos de infraestruturas, existem diversas prioridades. O aeroporto foi uma decisão importante, após tantos anos de espera. Esta decisão irá também desbloquear e permitir um maior planeamento de outras infraestruturas, tais como uma terceira travessia do Tejo, a questão do TGV, entre outras infraestruturas necessárias para suportar todo este projeto. A nível da ferrovia é fundamental o avanço do TGV entre Lisboa e Porto, mas também acelerar a ligação entre Lisboa e Madrid.
Para o transporte de mercadorias, é fundamental terminar o mais rápido possível a nova ligação entre Sines e a fronteira espanhola, de forma a estramos ligados à Europa de forma mais eficiente, permitindo que os produtos que possam chegar aos nossos portos e muitas das nossas exportações possam ter uma alternativa de transporte mais sustentável e mais rápida. No caso dos portos, é também importante avançar com a nova fase de Sines e terminar também ligações mais eficientes com o Porto de Leixões, entre muitas outras obras que estão planeadas e a decorrer. É, acima de tudo, fundamental, que se tomem as decisões certas com uma visão estratégica em termos logísticos para o país e com uma rapidez bem superior ao passado.

A APLOG e a KPMG juntaram-se para realizar um estudo sobre a maturidade e as praticas ESG dos operadores logísticos, nas suas várias valências. Do que consta e o que pretendem? E de que forma será uma mais-valia para os associados?
Pretendemos com este estudo contribuir para aumentar a disseminação do conhecimento sobre: os requisitos e práticas de sustentabilidade atuais, e potenciais espaços para melhoria e desenvolvimento para os múltiplos agentes que actuam nas cadeias logísticas.
Quanto à mais valia para os associados, será um maior conhecimento e partilha de como está a maturidade das empresas relativamente às praticas ESG.

A intermodalidade e a multimodalidade são o futuro? Os custos ainda são impeditivos de uma maior procura por parte dos clientes? Uma maior oferta ferroviária é a ‘peça que falta’?
Sem dúvida que a intermodalidade e a multimodalidade são o presente e o futuro da logística de transportes. É fundamental definir qual o papel do nosso país em termos logísticos e definir prioridades e pensar não a curto prazo, mas a médio longo prazo. Qual a estratégia, quais as indústrias que queremos apostar, o que fazer para tornar o nosso país mais competitivo e atrair cada vez mais fluxos de produtos e matérias primas através dos nossos portos, tornando cada vez mais Portugal como uma porta de entrada na Europa para produtos vindos da Ásia, Américas e África.
Para sermos mais atrativos, temos que ser mais eficientes, investir em mais tecnologia, reduzir a burocracia e sermos muito mais rápidos nas tomadas de decisões. A peça ferroviária é sem dúvida importante e tem que estar alinhada com os nossos portos e também com uma definição clara de que localizações são prioritárias para serem implementados os novos hub’s logísticos. Essa definição deverá ser integrada a nível do governo, com a colaboração das entidades regionais e autarquias. É preciso trabalho de equipa e liderança.

A integração de tecnologias como Big Data e Inteligência Artificial está a moldar o setor. Em Portugal, as empresas estão a ‘abraçar’ as oportunidades da logística 4.0?
As empresas do setor logístico têm feito um esforço brutal, em especial nestas últimas décadas no sentido de modernizarem e utilizarem as tecnologias disponíveis tais como o Big Data, Digitalização, Automação, Robotização, Inteligência Artificial entre outras ferramentas. A evolução tem sido muito grande. Quando falamos em empresas, temos nalguns casos que distinguir entre empresas multinacionais e empresas portuguesas, nomeadamente as PME´s que representam mais de 90% do nosso tecido empresarial. Em termos de empresas nacionais de dimensão, os investimentos estão a ser feitos no sentido de tornar as suas empresas mais competitivas e eficientes. No caso da PME´s, esse esforço também existe, mas nalguns casos poderão não ter a mesma capacidade de investimento e de recursos humanos preparados para todos estes desafios.

Nesse sentido, a capacitação dos trabalhadores para esta logística mais digitalizada é uma dificuldade?
É um fato que para muitas das funções que são necessárias hoje nesta logística mais digitalizada, são precisos recursos humanos muito mais bem preparados e com formação adequada para responderem aos desafios que hoje são colocados. É um facto que, para muitas funções, existe uma escassez de recursos humanos com formação adequada, tais como operadores de empilhador, motoristas entre muitas outras atividades. Existe falta de pessoas especializadas e é necessário que as empresas por um lado consigam atrair as pessoas, por outro terem que dar formação específica e no final conseguirem reter as pessoas. Este é seguramente um dos maiores desafios que as empresas têm hoje. É preciso dar mais atenção às pessoas e proporcionar um trabalho e um ambiente que seja mais motivador.

Apesar de ainda estar abaixo dos seus pares europeus, em Portugal o e-commerce tem crescido (o Barómetro de E-commerce previa o crescimento das vendas online no 1º semestre de 2024 e comparação ao período homólogo de 2023). Para a APLOG, quais são os desafios da logística no e-commerce?
Este é um setor que explodiu durante e após a pandemia. As vendas on-line continuam a crescer e essa tendência deverá continuar a aumentar. Para isso muitas empresas tais como operadores logísticos e empresas especializadas em transportes e nomeadamente no last mille têm vindo a equipar-se de forma cada vez mais profissional, para poderem responder de forma adequada aos desafios que o mercado está a colocar. Vieram novos projetos, novos hub´s com muita tecnologia, automação, digitalização e ferramentas muito sofisticadas de planeamento e controle das operações. A resposta penso que no geral tem sido muito positiva e os avanços são contínuos. A questão da sustentabilidade é também um tema muito relevante, nomeadamente com a eletrificação das frotas nas grandes cidades a ser já uma realidade bastante relevante.

No geral, quais são os obstáculos da moderna logística e quais serão os grandes desafios a enfrentar no futuro próximo?
Os obstáculos passam por diversos fatores, tais como a falta de recursos humanos especializados, em alguns casos, falta de imobiliário logístico disponível em zonas ao redor de Lisboa e Porto em timings que sejam exequíveis para as empresas, nomeadamente novos projetos internacionais em que a capacidade de resposta na implementação desses projetos pode ser determinante na escolha de Portugal ou escolherem outras geografias que possam trazer mais rapidez e qualidade. No futuro a curto prazo, questões como as taxas de juro, inflação e custos energéticos poderão ser relevantes para a concretização de alguns projetos. É também muito importante que os potenciais investidores sintam estabilidade nas diferentes decisões políticas em áreas como a fiscalidade, a justiça entre outras.

Esta entrevista foi publicada na edição 427

Sobre o autorHipersuper

Hipersuper

Entrevista

Pedro Queiroz: “A Comissão Europeia deve assegurar que ninguém seja deixado para trás”

Pedro Queiroz, diretor-geral da FIPA, assegura que a indústria agro-alimentar está determinada “em posicionar-se na vanguarda da transição para a sustentabilidade”. Mas defende que é preciso uma atenção às necessidades de certos setores e empresas, em particular as PME, “que podem ter dificuldades com algumas das medidas/políticas que decorrerão do processo e da transição”.

Pedro Queiroz, diretor-geral da FIPA, assegura que a indústria agro-alimentar está determinada “em posicionar-se na vanguarda da transição para a sustentabilidade”. Mas defende que é preciso uma atenção às necessidades de certos setores e empresas, em particular as PME, “que podem ter dificuldades com algumas das medidas/políticas que decorrerão do processo e da transição”.

O que é necessário para que a adoção de medidas de sustentabilidade e a regulamentação a adotar nessa área, contribuam para o crescimento das empresas em particular e do setor como um todo, em Portugal?
A indústria agro-alimentar está determinada em posicionar-se na vanguarda da transição para a sustentabilidade, que é essencial para o bem-estar, a prosperidade e a longevidade das nossas economias, das nossas sociedades e do nosso planeta. No entanto, muitas empresas são confrontadas com desafios resultantes de uma amálgama de choques externos, como a pandemia de Covid, a guerra na Ucrânia e os crescentes desafios climáticos.
O desenvolvimento de um quadro comunitário para os sistemas alimentares sustentáveis constitui uma oportunidade para a União Europeia dar um passo decisivo no sentido da criação das condições de mercado e do desenvolvimento de uma base regulamentar adequada para que as empresas se tornem mais sustentáveis e mais competitivas. Devido à amplitude e à escala do setor, é inevitável que os operadores avancem a ritmos diferentes.
A Comissão Europeia deve, por conseguinte, assegurar que ninguém seja deixado para trás e que todos os intervenientes possam participar numa transição justa para sistemas alimentares mais sustentáveis. No caso particular de Portugal, deve ser dada uma atenção específica (por exemplo, sob a forma de apoio financeiro, formação, I&I, etc.) às necessidades de certos setores e empresas – em particular as PME – que podem ter dificuldades com algumas das medidas/políticas que decorrerão do processo e da transição. Do mesmo modo, os agricultores devem ser apoiados na transição para sistemas alimentares mais sustentáveis, a fim de promover a resiliência climática, melhorar a saúde dos solos, a qualidade da água e a eficiência.

O que é urgente trabalhar, a nível europeu, em termos de legislação, que venha de encontro ao crescimento da indústria agro-alimentar?
Deve ser desenvolvido um quadro regulamentar que permita fornecer os incentivos e o apoio financeiro e tecnológico necessários para que os intervenientes na cadeia alimentar possam assumir a referida transição para sistemas alimentares mais sustentáveis. Este quadro, deve estar assente na segurança jurídica, na clareza e em condições de concorrência equitativas para os operadores económicos, assegurando a harmonização a nível da UE e uma legislação com visão de futuro. O quadro regulamentar deve ainda centrar-se nas operações e não nos produtos, os critérios mínimos de sustentabilidade devem ser claros, realistas e baseados em dados científicos, deve reconhecer a força da diversidade dos sistemas alimentares da Europa e assegurar a viabilidade económica e a competitividade a longo prazo de toda a cadeia.

Que balanço faz do 9º Congresso da Indústria agro-alimentar?
O melhor indicador que temos é o conjunto de mensagens muito incentivadoras que recebemos da maioria dos participantes. Consideramos que estivemos ao nível das melhores expetativas e elevámos o nível de exigência. Tudo graças a um grupo de excelentes oradores – com percursos de grande nível no meio empresarial, no associativismo, na academia, na política e na administração pública -, uma plateia de elevada qualidade, uma estrutura organizativa muito bem oleada e, com um reconhecimento particular, uma equipa interna que “veste a camisola”. Foram abordados temas de enorme atualidade e ficaram mensagens e aprendizagens muito relevantes para o futuro do nosso setor. Mais uma vez, a FIPA conseguiu marcar a diferença.

Entrevista publicada na edição 427 

Sobre o autorAna Grácio Pinto

Ana Grácio Pinto

Entrevista

Ângela Sarmento: “O atendimento ao cliente é uma das nossas prioridades”

Ângela Sarmento, diretora de marketing e comunicação do Grupo Apolónia, enaltece a aposta numa oferta diversificada, que combina produtos premium e básicos, e sublinha que esta tem sido essencial para o crescimento sustentado da marca. Em entrevista ao nosso jornal não tem dúvidas: a inovação e a satisfação do cliente continuam a ser pilares fundamentais para o sucesso do Apolónia.

Ângela Sarmento, diretora de marketing e comunicação do Grupo Apolónia, enaltece a aposta numa oferta diversificada, que combina produtos premium e básicos, e sublinha que esta tem sido essencial para o crescimento sustentado da marca no competitivo mercado do retalho alimentar. Além dos planos de expansão para Lisboa, Porto e Espanha, o grupo reforça o seu compromisso com a sustentabilidade, através de iniciativas como a redução de emissões de CO2 e o combate ao desperdício alimentar, enquanto mantém uma forte ligação à comunidade local. E não tem dúvidas: a inovação e a satisfação do cliente continuam a ser pilares fundamentais para o sucesso do Apolónia.

Como é que o grupo Apolónia tem conseguido manter-se relevante e diferenciado no mercado do retalho alimentar, especialmente num segmento que combina produtos premium e básicos?
Precisamente por isso, por combinarmos produtos distintos não só entre si, mas dos restantes players do mercado. Somos conhecidos por termos produtos diferenciadores e de qualidade superior, o que está diretamente ligado ao nosso principal foco que é a satisfação dos nossos clientes. Para isso, temos de responder não só às suas expectativas, mas também às suas necessidades de consumo.

Quais os principais resultados em 2023? Esperam crescer este ano?
Temos tido um crescimento sustentável ao longo dos anos e acreditamos que este ano não será diferente.

A presença de serviços como o sushi preparado na hora são elementos que diferenciam o Apolónia. Como surgiu a ideia de introduzir este tipo de serviços e como tem sido a aceitação por parte dos clientes?
É verdade que fomos o primeiro supermercado em Portugal a ter sushi preparado na hora e, na altura, isso foi altamente inovador, algo que está no nosso ADN. Gostamos de inovar, de trazer serviços distintos para os nossos clientes. A nossa equipa está constantemente à procura de soluções para inovar e acrescentar valor aos nossos clientes e é sempre com esse objetivo que vamos desenvolvendo os nossos serviços. A aceitação é geralmente boa, pois os nossos clientes já estão habituados ao nosso serviço diferenciador e, sobretudo, a serem ouvidos quando nos fazem sugestões.

Ângela Sarmento, diretora de marketing e comunicação do Grupo Apolónia

O conceito baseia-se na oferta de uma variedade única de produtos, tanto básicos como gourmet. Como é que conseguem equilibrar a variedade com a rentabilidade?
A nossa prioridade é a satisfação dos nossos clientes, pelo que a nossa preocupação principal é garantir uma oferta variada e de qualidade. Porém, na seleção de produtos e fornecedores, tentamos sempre garantir que as escolhas que fazemos são benéficas para os clientes, mas também para a empresa.

Os produtos estrangeiros desempenham um papel importante no Apolónia, desde a fundação. Como fazem a seleção destes produtos para garantir que respondem às necessidades e expectativas dos clientes?
Esta seleção é feita de várias formas. Começa na nossa equipa comercial, que procura ativamente por novos produtos, quer seja pelo meio dos fornecedores que temos, ou de novos, ou mesmo pelas viagens que faz para conhecer o que há lá fora. Passa também pela pesquisa que fazemos de tendências, mas sobretudo por escutarmos os nossos clientes e irmos ao encontro daquilo que procuram. Temos muitos clientes a sugerirem produtos, ou a pedirem-nos especificamente para termos determinadas referências e sempre que possível respondemos a esses pedidos.

Apesar da oferta de produtos de gama alta, rejeitam o rótulo de “supermercado gourmet”? Como define o posicionamento da marca em termos de oferta e público-alvo?
Durante muitos anos usámos a assinatura “O Verdadeiro Supermercado”, porque é isso que somos, um supermercado que tem os produtos que todos nós precisamos para o nosso dia-a-dia. Claro que temos produtos de gama alta, mas nas nossas lojas tanto é possível encontrar os produtos mais básicos e das marcas mais comuns, disponíveis em qualquer superfície comercial, como produtos de gama superior, ou mesmo exclusivos, e que respondem às preferências mais exigentes. Esta é uma característica intrínseca ao nosso objetivo de termos a maior variedade de produtos possível.
É verdade que temos um posicionamento de marca superior, muito ligado à qualidade dos nossos produtos e serviços, e claro que isso se reflete no nosso público-alvo que corresponde a indivíduos com um poder económico mais elevado. No entanto, acreditamos que o nosso supermercado pode ser para todos e tem produtos para todas as necessidades.

A expansão para o resto do país é um objetivo conhecido. Quais os planos? O conceito será diferente ou querem manter a mesma oferta de produtos e serviços?
Temos o objetivo de expandir para as zonas da grande Lisboa e do grande Porto, mas só irá acontecer quando surgir a oportunidade que responda não só às nossas exigências logísticas, mas também às necessidades do nosso target. Quando acontecer, a ideia será manter o nosso conceito, pois é por isso que somos conhecidos e é por isso que os nossos clientes de fora do Algarve nos pedem para abrirmos fora da região.

Expandir para Espanha é uma hipótese? Quais os principais desafios e oportunidades que vê neste mercado?
Sim, a expansão para o Sul de Espanha e Madrid é um objetivo a médio prazo. Estamos a falar de um mercado forte e diversificado, onde há uma procura crescente por experiências mais exclusivas e produtos de qualidade superior, o que está bastante alinhado com o nosso posicionamento. É uma boa oportunidade para expansão da marca, mas sabemos que teremos alguns desafios, como outros players já bem consolidados no mercado.

Que papel desempenha a comunidade estrangeira residente e os turistas no sucesso do Apolónia?
Todos os nossos clientes são importantes, então não fazemos distinção entre eles. Todos contam para o nosso sucesso e a estratégia é a mesma para todos: a sua satisfação. Isso passa por garantirmos que oferecemos produtos de qualidade, uma variedade inigualável e um serviço distinto. Claro que estamos atentos às nacionalidades que se têm vindo a destacar em termos de ocupação no Algarve e temos tentado responder às necessidades específicas das mesmas. Por exemplo, com o aumento do público americano temos vindo a notar um aumento da procura de produtos consumidos pelo mesmo, especialmente em alturas como o Thanksgiving, que já fez com que adaptássemos o fornecimento de perus para essa altura do ano.

Os clientes do Apolónia são conhecidos por sugerir produtos que gostariam de ver nas lojas. Como é que a empresa integra este feedback no processo de seleção e introdução de novos produtos?
Faz naturalmente parte da nossa estratégia. Talvez já tenham ouvido o lema do nosso fundador, o Sr. Avelino Apolónia, “Se não temos hoje, arranjamos para amanhã.”, e essa tem sido a base de resposta a esses pedidos. Sempre que algum cliente nos pede um produto em específico, avaliamos a viabilidade de comercializarmos o mesmo e só não o fazemos se não for possível.


O Apolónia trabalha com produtores locais para oferecer produtos frescos e regionais nas suas lojas? Considera que esta parceria é importante para reforçar a identidade da marca e responder às expectativas dos consumidores que procuram produtos de origem local?

A nossa vasta gama de produtos inclui, naturalmente, produtos locais e regionais. Sempre que possível, priorizamos a comercialização destes produtos, até porque tem sido uma tendência na procura.

Iniciativas como a Feira do Vinho e Queijo Apolónia são importantes? Qual o objetivo e qual o balanço que fazem?
Essas iniciativas são o que dá dinamismo às nossas lojas e promovem a nossa variedade de produtos, pelo que são naturalmente importantes. Não só porque nos ajudam a divulgar produtos de qualidade muitas vezes desconhecidos do público, como nos permitem mostrar a ampla variedade de referências que temos nas diferentes secções e categorias. O balanço é positivo, sobretudo nesta última Feira do Vinho e Queijo, em que promovemos a harmonização de dois produtos em que somos especialistas e que temos uma variedade inigualável no país. Houve uma boa adesão, os clientes gostaram e recebemos vários elogios pela iniciativa.

O Apolónia investe significativamente no atendimento ao cliente? Que tipo de formação recebem os colaboradores para assegurar esta experiência de topo? É diferenciador no contato com o cliente?
O atendimento ao cliente é uma das nossas prioridades, pelo que tentamos garantir que a nossa equipa está sempre ao nível que os nossos clientes estão habituados. Todos os colaboradores, assim que integram a equipa, na Formação de Acolhimento têm um módulo dedicado só ao atendimento ao cliente, onde aprendem a nossa filosofia de atendimento, os procedimentos gerais de atendimento e os procedimentos específicos. E sim, estamos certos de que somos diferenciadores no contacto com os nossos clientes. Quantos supermercados conhece em que existem colaboradores dedicados a ajudar os clientes a ensacar as compras e a levá-las ao carro? Ou que acompanham os clientes para aconselhar determinados produtos sempre que solicitado? Podia dar diversos exemplos de como o nosso contacto com o cliente é diferenciado e distinto. Não só porque estamos sempre disponíveis, mas porque sabemos aconselhar os nossos clientes, somos atenciosos e nunca descuramos o profissionalismo que nos caracteriza.

A aposta no mercado online é cada vez mais relevante no setor de retalho. O Apolónia tem planos para desenvolver as vendas online? Como é que trabalham a integração desta oferta na experiência de compra dos clientes?
Já há vários anos que temos loja online e que fazemos entregas em toda a região do Algarve. Recentemente, disponibilizámos as entregas em todos o país através da nossa loja online, de produtos não frescos, apesar de já o fazermos por pedido direto (por telefone ou email) desde sempre. Esta aposta faz parte do crescimento natural da marca, mas também da procura que existe pelos nossos produtos. Estamos naturalmente a trabalhar no desenvolvimento das vendas online e o próximo passo será encontrar uma alternativa para a entrega de produtos frescos em todo o país, garantindo a mesma qualidade que é possível encontrar nas nossas lojas físicas. A importância do desenvolvimento desta área de negócio está diretamente ligada à satisfação dos nossos clientes, pois enquanto não abrimos fisicamente fora do Algarve, esta é a forma que temos de fazer chegar os nossos produtos a todos os nossos clientes espalhados pelo país.

A sustentabilidade e a responsabilidade social são temas de grande importância para os consumidores. Que iniciativas tem o Apolónia em curso para garantir práticas sustentáveis e contribuir para a comunidade local?
Ao longo do ano, colaboramos com várias iniciativas de cariz social de instituições e grupos pertencentes às áreas envolventes das nossas 3 lojas físicas (Almancil, Galé e Lagoa). Somos uma empresa algarvia e consideramos importante contribuirmos para as diferentes causas e necessidades existentes na comunidade. Contribuímos essencialmente com a doação de bens ou cabazes alimentares, quer seja para iniciativas de apoio humanitário, animal, ou desportivo, pois é a melhor forma que temos de ajudar.
No que diz respeito à sustentabilidade, também temos várias iniciativas em curso nesse sentido: todos os dias combatemos o desperdício alimentar ao doarmos excedentes alimentares para instituições como a Refood ou o Banco Alimentar; temos painéis fotovoltaicos nas três lojas, que desde que foram instalados já nos permitiram evitar a emissão de 1360 toneladas de co2, o equivalente a 1860 árvores plantadas; estamos empenhados na promoção de uma mobilidade mais sustentável, com o alargamento do serviço de carregamento de veículos elétricos nas nossas lojas. Atualmente já estão disponíveis em Almancil e Lagoa, e até ao final do ano o serviço ficará também disponível na loja da Galé e temos disponíveis depósitos próprios para que os clientes possam depositar pilhas usadas, lâmpadas ou pequenos equipamentos elétricos.
Temos colaborado sempre com a APED na divulgação de campanhas de sensibilização com vista à promoção da cidadania ambiental e um consumo consciente, como foi o caso da campanha dos Resíduos Equipamentos Elétricos, que teve o intuito de mobilizar os cidadãos para a entrega destes equipamentos nos canais certos de forma a garantir a sua reciclagem; da campanha Datas Validade, para ajudar o consumidor a interpretar e distinguir as diferentes indicações e rentabilizar o consumo dos alimentos para evitar o desperdício; ou a campanha Plásticos, com foco no descarte adequado do plástico e o uso de alternativas reutilizáveis.

Qual é a sua visão para o futuro do Grupo Apolónia em Portugal? Onde vê o Grupo, por exemplo, daqui a cinco anos?
Vejo o Grupo Apolónia como uma empresa bem consolidada no mercado, mesmo estando fisicamente presente apenas no Algarve, pelo que o futuro só pode ser próspero. Tenho consciência de que o retalho alimentar é um mercado altamente competitivo, mas também sei que estamos à altura dos desafios que se avizinham, graças ao compromisso e dedicação da nossa equipa. Cinco anos é tempo suficiente para expandirmos a nossa presença de forma sustentável, com pelo menos mais uma ou duas lojas, e podemos alcançar o crescimento não só através das lojas físicas, mas também do fortalecimento das nossas plataformas digitais, oferecendo aos nossos clientes uma experiência omnicanal cada vez mais fluida. Se mantivermos a nossa essência, com foco no cliente e nos mantivermos atentos às suas necessidades e expectativas, o futuro só pode ser promissor.

Entrevista publicada na edição 427 do Hipersuper

Sobre o autorAna Rita Almeida

Ana Rita Almeida

João Baluarte, sócio responsável pelos estudos financeiros na OnStrategy

Entrevista

João Baluarte: “A existência de marcas verdadeiramente globais continua a ser um dos calcanhares de Aquiles do nosso crescimento económico”

João Baluarte, sócio responsável pelos estudos financeiros na OnStrategy, evidencia a força crescente de algumas marcas nacionais que têm conseguido afirmar-se num mercado altamente competitivo, impulsionadas pela consolidação, internacionalização e um contexto económico mais favorável. E aponta: “a existência de marcas verdadeiramente globais continua a ser um dos calcanhares de Aquiles do nosso crescimento económico. Com algumas exceções, continuamos a ter marcas, na sua grande maioria orientadas ao mercado nacional”.

A consultora OnStrategy apresentou recentemente os resultados do estudo anual das Marcas Portuguesas Mais Valiosas de 37 setores de atividade, desenvolvido recorrendo à metodologia de Royalty Relief, uma metodologia em conformidade com as normas ISO20671 (avaliação de estratégia e força) e ISO10668 (avaliação financeira), em que todas as marcas são auditadas e avaliadas com base em informação pública, nomeadamente relatórios e contas, dados de mercado e indicadores de força de marca.
Entre as 37 marcas líderes setoriais, identificadas a partir da totalidade das 100 marcas portuguesas mais valiosas, a CGD (+47%), o Pingo Doce (+38,4%), a Parfois (+34,12%), os CTT (+29,6%), a Wells (+29,4%) e a Portugalia (+28,6%) destacaram-se como as marcas que mais valorizaram face a 2023, sendo que a Distribuição/Retalho e Banca foram os setores que mais valorizaram.
Relativamente aos setores de produção, distribuição e retalho alimentar, as marcas líderes em 2024 foram o Pingo Doce no segmento de “Retail Food”, cuja proprietária Jerónimo Martins se destacou também como a marca de Holdings mais valiosa, a Delta, no segmento de “Beverages Non Alcohol”, a Super Bock, no segmento de “Beverages Alcohol”, a Lactogal, no segmento de “Food”, e a Portugália, no segmento de “Retail Restaurants”.

O estudo revela um crescimento significativo em várias marcas de retalho. Olhando para o mercado, quais os principais fatores que contribuíram para a valorização de marcas como o Pingo Doce ou a Parfois?
De uma forma geral, temos vindo a observar uma clara recuperação pós pandemia nas marcas no setor da distribuição e do retalho, com um claro reforço nos índices de força de marca. Por outro lado, o efeito inflacionista dos últimos anos permitiu um reforço nos volumes de negócio das principais marcas de retalho, conjugado com a manutenção ou reforço das suas margens operacionais, bem como o contexto altamente competitivo deste setor e dos seus subsetores e também da implementação ou reforço de fenómenos de consolidação e internacionalização. Adicionalmente, beneficiaram também de uma melhoria de risco da nossa economia. Todos estes efeitos resultaram numa melhoria no valor financeiro das marcas destes setores onde, são exemplos, a Parfois e o Pingo Doce.

No setor da distribuição e retalho alimentar, o Pingo Doce destacou-se com uma valorização de 38,4%. Neste setor, como tem observado o posicionamento e crescimento das marcas? É um setor forte e com muita concorrência. Como é que podem se diferenciar junto dos consumidores?
Mais do que destacar marcas, penso que é importante entender a tendência. O retalho e a distribuição em geral, são setores maduros e onde existe muita concorrência. Aquilo que temos vindo a observar é que o trabalho de marca neste setor tem vindo a revelar-se muito consistente, com os índices de força de marca a terem uma tendência de crescimento nos últimos cinco anos. A entrada de novos players no mercado e alguns fenómenos de consolidação também têm obrigado as marcas a serem muito competitivas e a terem, obrigatoriamente o posicionamento de marca correto, bem como ferramentas e mensagens consistentes e coerentes para as suas audiências. Aliado a um contexto inflacionista e a alguma ressaca do pós-covid, resultaram num crescimento bastante considerável nos dois últimos anos, beneficiando de um contexto atual e de um outlook económico positivo, em particular aquelas marcas que atuam maioritariamente no mercado português.
A marca Wells registou um aumento de 29,4% no seu valor. É uma marca que tem apostado na proximidade com o consumidor. Será também um fator de crescimento desta marca no segmento de “Retail Health & Wellness”?
Sim, sem dúvida. Neste caso, para além dos aspetos já referidos, beneficia também da situação específica do setor de retalho de saúde, ou seja, do crescimento da oferta de produtos farmacêuticos e dermocosméticos e também do aumento da oferta de prestação de cuidados de saúde.

A Parfois lidera no segmento de “Retail Specialist”. Quais são as principais tendências no setor de retalho especializado que a Parfois soube capitalizar para alcançar esta posição de destaque?
A Parfois tem um posicionamento de marca muito claro, uma segmentação de produto e de canais de distribuição muito assertiva e consistente, que aliada a uma estratégica de internacionalização permitiram alcançar essa posição de destaque. Diria mesmo que tem sido um exemplo no seu setor e no panorama das marcas portuguesas.

Como vê o posicionamento das marcas portuguesas nos vários setores? A inovação e o eixo da sustentabilidade fazem a diferença?
A existência de marcas verdadeiramente globais continua a ser um dos calcanhares de Aquiles do nosso crescimento económico. Com algumas exceções, continuamos a ter marcas, na sua grande maioria orientadas ao mercado nacional. O facto de um grande número das nossas empresas serem de pequena e média dimensão e, consequentemente a maioria das suas marcas, é um inibidor do seu crescimento, qualitativa e quantitativamente. Aquelas que por seu lado têm a escala que lhes permite sair fora de portas e alavancar a sua notoriedade e relevância, conseguem ombrear com as melhores nas suas indústrias. Nestas, a inovação e a sustentabilidade, seja ela ambiental, social ou económica, são fatores que têm cada mais relevância e pesam cada vez mais no total das dimensões e atributos que constituem a sua força de marca.

Considerando o contexto económico atual, quais são as suas previsões para a evolução das marcas de retalho e distribuição em Portugal, particularmente em termos de valorização e impacto no mercado interno e externo?
Quanto aos aspetos quantitativos que impactam a valorização, acredito que dependerá muito da economia internacional, mais do que da nossa economia. As tensões na Ucrânia e Médio Oriente, as eleições norte americanas e os seus impactos na economia europeia podem a ter algum impacto no seu crescimento e, inevitavelmente na portuguesa. Estes fatores podem ter impacto quer na evolução dos negócios quer na perceção de risco que poderá afetar o valor. Quanto aos aspetos comportamentais, de relação das marcas com os seus stakeholders, acredito que as principais marcas, sejam elas dos sectores do retalho e distribuição, ou dos restantes sectores continuarão a mostrar a resiliência e a consistente evolução que têm mantido nos últimos 10 anos, no rescaldo do pós Troika.

A metodologia Royalty Relief utilizada na avaliação das marcas baseia-se em dados públicos e indicadores de força de marca. Como é que esta metodologia se diferencia de outras formas de avaliação de marcas?
De uma forma geral, esta metodologia é aquela que é mais comumente aceite por auditores, banca e em disputas judiciais. É uma das metodologias recomendadas nas normas ISO 10668 e 20671, que definem os guidelines quantitativos e qualitativos de avaliação de marcas. De uma forma geral, é um processo que incorpora uma análise comportamental, definida por um Índice de força de marca, uma análise financeira, que incorpora projeções de volume de negócios, margens operacionais, royalties e taxas de desconto e uma análise legal, que inclui uma análise sobre a forma como a marca se encontra registada e protegida. Para cada uma destas dimensões recorremos a fontes de informação externas e a estudos de mercado, que permitem aferir da sua força nos segmentos e nas geografias onde atua. Nesse sentido, elimina muitos critérios de subjetividade que outras metodologias, como por exemplo o earnings split incorporam.

Esta entrevista foi publicada na edição 427 do Hipersuper

Sobre o autorAna Rita Almeida

Ana Rita Almeida

Alimentar

Jaime Piçarra: “A agricultura e a alimentação não dão votos”

Com um vasto currículo na área da segurança e soberania alimentar, Jaime Piçarra é especializado em economia agrária e sociologia rural e o atual secretário-geral da IACA ( Associação Portuguesa dos Industriais de Alimentos para Animais). Em entrevista ao Hipersuper sublinha que “não podemos negar as situações climáticas, temos que tentar fazer tudo aquilo que é possível para mitigá-las, mas sem comprometer a função da agricultura, que é a produção de alimentos”.

Fotografias Frame It

Jaime Piçarra tem dedicado a sua vida às questões da segurança alimentar e da importância da gestão agroalimentar tanto na geopolítica nacional e mundial como na vida dos cidadãos. Foi recentemente nomeado perito nacional na Organização do Tratado do Atlântico Norte, na área da segurança do abastecimento. Com esta nomeação, passa a integrar o Grupo de Planeamento de Agricultura e Alimentação da NATO. “Não podemos negar as situações climáticas, temos que tentar fazer tudo aquilo que é possível para mitigá-las, mas sem comprometer a função da agricultura, que é a produção de alimentos”, sublinha nesta entrevista ao Hipersuper.

Portugal é um país autossuficiente em vinho e em azeite. Mas em todo o resto, o país depende em 80% de matérias-primas. A segurança alimentar é um objetivo cada vez mais difícil de alcançar no nosso país?
Bom, eu penso que não. Eu tenho uma visão relativamente positiva quanto ao futuro. Apesar, de facto, de termos constrangimentos. Uns são nossos, outros são das políticas comunitárias, políticas europeias. Mas é possível atingir um equilíbrio entre as gestões ambientais e a produção de alimentos.
Aparentemente, estamos a viver uma época em que o ambiente está a predominar relativamente a outras questões. Porque as alterações climáticas são um facto, não vamos negar. Têm muito a ver com a produção agrícola e com outro fenómeno que é muito relevante: as migrações. E depois acabamos por sofrer, de facto, o impacto de tudo isto.
Não podemos negar as situações climáticas, temos que tentar fazer tudo aquilo que é possível para mitigá-las, mas sem comprometer a função da agricultura, que é a produção de alimentos. E é nessa perspectiva que eu acredito que irá haver, agora, no próximo mandato da Comissão Europeia – e isso é a minha esperança – algum recuo nas estratégias, por exemplo, ‘Do Prato ao Prato’, do ‘Green Deal’ provavelmente. E, portanto, poderá haver um maior equilíbrio, ou uma sensibilidade maior em termos de equilíbrio.
Porque, por outro lado, não é justo que a União Europeia imponha determinadas restrições aos seus agricultores e às suas empresas, e depois não seja capaz de impor as mesmas regras aos produtos que importa de países terceiros.
Por exemplo, os agricultores têm cada vez menos acesso a produtos fitofármacos, cada vez se reduz mais o número de substâncias ativas. A União Europeia faz essas restrições, muitas vezes, em nome da proteção dos consumidores, pelo impacto dos resíduos na alimentação ou nos solos, e não somos capazes de impor, de facto, essas regras aos países terceiros. O que é que acontece? Nós que somos importadores de matérias-primas, estamos confrontados com o facto de que muitas vezes os limites de resíduos de matérias primas tão importantes como o milho e a soja, são ultrapassados porque há substâncias em que simplesmente o limite é zero, portanto, não há limite.
E, depois, temos aqui problemas de segurança alimentar – isto é, de higiene, e não de disponibilidade de alimentos – que podem pôr em causa o abastecimento. Temos de pensar em políticas integradas, em que, sempre sem perder de vista a proteção do ambiente, possamos ter várias etapas. A Europa, e estamos a fazer isso em sedes, a nível internacional, tem que medir bem até que ponto é que não está a dar tiros no pé. E a ideia que fica é que o último mandato da Comissão Europeia foi muito ‘dar tiros no pé’. Vamos ver se neste segundo mandato, apesar da presidente von der Leyer ter sido eleita com os votos dos Verdes, se é possível atingir esse equilíbrio.

A estratégia do ‘Prado ao Prato’ e, até mesmo, a Política Agrícola Comum (PAC) estão a gerar uma regulamentação ‘excessiva’ em matéria de proteção ambiental e metas que poderão comprometer a soberania alimentar europeia? Por exemplo, um dos objetivos do ‘Prado ao Prato’ é o de que até 2030, 25% das terras agrícolas da UE sejam utilizadas para agricultura biológica.
Isso é utópico. Estou envolvido em questões de revisão da política agrícola desde 1992. Acompanhei a primeira grande reforma da PAC, curiosamente, fechada pela presidência portuguesa, e essa PAC teve dois aspetos que iriam marcar, depois, a evolução das PACs seguintes. Um foi o reconhecimento da multifuncionalidade da agricultura. Isto é, a agricultura não era só produção agrícola, produção de bens alimentares, mas também a proteção do ambiente, da paisagem, dos territórios. E como tal, os agricultores teriam de ser remunerados por esses serviços. Foi a primeira vez que se falou nos bens públicos. Esse foi um efeito importante.
E a outra questão muito relevante foi que antes de 1992 assistíamos na União Europeia a excedentes de carne bovina, de leite em pó, de cereais. E, aí, tínhamos dois problemas. Como não éramos competitivos em relação ao mercado mundial, a União Europeia tinha que pagar os custos em armazenar esses produtos e depois, para exportar, tinha que pagar as chamadas restrições à exportação. E isto era insustentável. Obviamente, estávamos numa altura em que a PAC representava a maior parte do orçamento comunitário, 70%, hoje é 30%.
Houve também um momento da União Europeia, que teve a ver com a crise das vacas loucas e as dioxinas, em 1999. Houve uma série de problemas de segurança alimentar que mudaram completamente a visão, a comissão começa a priorizar a proteção dos consumidores, o bem-estar animal. Portanto, digamos que passou a haver a visão de que, se calhar, o modelo de agricultura que estávamos a fazer não era o melhor e punha em causa outras coisas. E essa é uma viragem muito significativa, em que a agricultura perde peso político. O que nós estamos a tentar fazer cada vez mais é mostrar aos decisores políticos que somos importantes e somos relevantes. E que é possível produzir alimentos de uma forma sustentável e segura para os consumidores.
Mas também é importante que a Europa, quando tem determinadas regras, as tente negociar com os países terceiros e crie no seu espaço comunitário um processo de transição, por etapas, para serem atingidas as metas. Aquela questão que referiu de 25% de terras agrícolas em agricultura biológica, que é, enfim, uma meta aspiracional, não é vinculativo. Obviamente que em alguns países, se calhar, é mais fácil de atingir, como, por exemplo, a Áustria. Mas noutros países não, porque põe em causa, claramente, a produção de alimentos. E não sei se, do ponto de vista ambiental, por unidade de produto, é mais sustentável. O que eu acho é que, uma vez mais, deverá ser o consumidor a determinar se, em função da procura, devemos alocar determinada produção em determinado regime.

Em função da procura e do valor da oferta também?
O que aconteceu nos últimos tempos com a pandemia, mais tarde com a guerra, a inflação e o aumento de preços, é que estamos a falar de produtos com preços elevados. E a inflação alta demonstrou uma quebra no consumo desses produtos. Atenção, eu não discuto a procura desses produtos. Acho que o consumidor deve ser livre nas suas escolhas, e ainda não está provado que a agricultura orgânica é mais saudável ou mais saborosa nos produtos do que a outra, se forem cumpridos, de facto, intervalos de segurança. Até porque, infelizmente, não é possível alimentar o mundo com produtos da agricultura biológica.
Mas ainda em relação à reforma de 1992: em todas as reformas, um dos objetivos era a simplificação. Infelizmente nunca se conseguiu. Foi preciso este ano, com as demonstrações e greves dos agricultores, pensar-se em flexibilizar medidas, em simplificar. O processo ainda não está feito, aliás, há uma consulta pública e vamos ver no que ela dá. E depois há a tendência de cada Estado Membro, como dizia o saudoso ministro Sevinate Pinto, ‘ligar o complicómetro’.
Há muita coisa que tem a ver com Bruxelas, mas há muita coisa que tem a ver com Portugal. Por exemplo, não é admissível que os licenciamentos de explorações, de empresas, de atividades, demorem tanto tempo e anos e anos a legislar. Os custos de contexto em Portugal que era uma promessa, enfim, de todos os governos, vamos ver se este concretiza: simplificar os procedimentos legislativos e as aprovações dos processos.

E como estamos a falar de Portugal, que estratégias as autoridades competentes, devem adotar para garantir a segurança alimentar?
Bom, referiu há pouco os setores do vinho e do azeite, houve uma estratégia muito interprofissional, digamos assim. As frutas e hortícolas estão com uma capacidade de exportação grande. Mas depois, olhando para a área que nós representamos, temos as carnes claramente deficitárias, apesar de haver alguma exportação de carne de porco para mercados, por exemplo, na Ásia, mas estamos a falar de quantidades ainda muito pequenas. Exportamos animais vivos, bovinos e pequenos ruminantes para o mercado israelita e o mercado avícola está em expansão. E temos os ovos, que são um bom exemplo. Tradicionalmente, a produção tem sido excedentária, mas no ano passado, segundo o INE, fomos deficitários. E porque? Porque o consumo cresceu mais do que a capacidade de produção.
Mas para nós o ponto crítico tem a ver com as matérias-primas, com os cereais. Por exemplo, no trigo duro temos uma capacidade de aprovisionamento de apenas 5%; se formos ao milho, temos 25 a 30%, dependendo do ano – este ano já sabemos que vamos reduzir a área de milho, e portanto vamos ser ainda mais dependentes. Depois temos as proteínas vegetais, nomeadamente a soja, em que somos dependentes 100%.
Portanto, creio que não podemos perder de vista que a nossa segurança alimentar deve ser equacionada a nível da União Europeia, Nós não podemos ter pretensões em balanços de aprovisionamento excedentários em todos os produtos, não é possível, mas é possível fazer mais e melhor. Não é admissível que não tenhamos uma maior produção de cereais. E o que é que aconteceu nos últimos anos? Como a produção de cereais em Portugal não tem sido suficientemente competitiva ou acarinhada pelo poder político, os agricultores foram alterando as produções. E que tipo de produções temos? Temos produções como o olival ou o amendoal, que são culturas permanentes e não estou a ver que o agricultor vá arrancar essas culturas para produzir cereais. Mas tal não significa que o governo não aposte mais num plano de promoção de cereais, que aliás foi um documento estratégico que tinha vindo do anterior executivo, que nós também acompanhámos. E que não seja possível estimular a produção de cereais, com ou sem regadio, que é outra questão muito importante, com a biotecnologia, com a agricultura de precisão. Portanto, estimular o mais possível a agricultura para ser sustentável.

No seu entender, porque Portugal não tem capacidade de gerar stocks alimentares? Será pela pequena capacidade produtiva ou não temos espaços de armazenamento suficientes?
São as duas coisas. Nós temos uma incapacidade de produção e temos que olhar para ela, de facto. Em relação à produção pecuária, se nós somos deficitários ainda na produção de carne bovina ou carne suína ou em outro tipo de carnes, poderíamos dar as condições aos nossos agricultores, de fazerem essas culturas. Estamos a falar, muitas vezes, de sensibilizar câmaras municipais, porque há muitas câmaras que não querem que se produza pecuária nas suas zonas, têm o direito legítimo de o fazer, mas muitas vezes não se compreende porquê.
Temos que perceber, politicamente, o que é que queremos, porque a pecuária é muito importante. Neste momento, e cada vez mais, já é possível o aproveitamento de subprodutos, os efluentes, a economia circular, digamos, avançou muito e é possível, substituindo os fertilizantes de síntese, adubar as terras. Para culturas de cereais ou outro tipo de culturas. E, muitas vezes, o papel da pecuária não é suficientemente entendido e valorizado. Por outro lado, relativamente aos cereais, obviamente que vai ser possível e desejável aumentar a produção, mas nós nunca vamos ter produção para ser autossuficientes.
Mas tão ou mais importante do que isso, o que nos tornaria menos vulneráveis e menos dependentes da volatilidade dos mercados mundiais, seria ter stocks estratégicos. E esses stocks estratégicos têm a ver com duas coisas. Aumentar a armazenagem, isto é, investimentos para dotar as empresas de maior capacidade de armazenagem, a construção de silos. E, sobretudo, os portos, nomeadamente a Silopor, terem uma capacidade de armazenagem. Nós temos insistido muito na armazenagem da Silopor, para que tenha maior capacidade e não estarmos expostos a notícias como as de que só termos stocks para 15 dias.
Porque cada vez mais as cadeias de abastecimento são voláteis, há as questões do Mar Negro, há as questões do Mar Vermelho, há os custos, há as greves, há as condições climatéricas que também põem em causa a estabilidade das rotas. Há estes cenários de guerra e, infelizmente, parece que vamos ter algumas escaladas na guerra Rússia-Ucrânia. Há a próxima presidência dos Estados Unidos e não sabemos se vai ser mais isolacionista ou menos, e depois temos tensões entre a China e os Estados Unidos. Portanto, digamos que temos uma situação geopolítica e geoestratégica muito complexa, que não nos deixa tranquilos nas questões da segurança das cadeias de abastecimento.

A nível global o que não estarão a fazer as organizações e as nações para se alcançar o objetivo de até 2030, acabar com a fome e garantir o abastecimento alimentar a todas as pessoas? Até que ponto é uma questão de aumento de produção e não de disputa política dentro das organizações e de tomada de posições dos próprios países?
As organizações supranacionais são algo muito complexo. Por exemplo, a Organização Mundial do Comércio praticamente desapareceu e é muito importante que ela seja forte e regule cada vez mais os conflitos. Mas o que se mostrou foi uma impotência para regular esses conflitos. Parece que os países, cada um deles, faz aquilo que quer e sobra-lhes tempo. Tenho falado com colegas que trabalham na OMC e é aflitivo. Porque sentem uma enorme frustração em não conseguirem atingir os seus objetivos. Quem ganhou expressão nos últimos anos? Foi, de facto, a NATO, com a situação da guerra. E, felizmente para todos, a visão da NATO não é apenas defesa. A Nato, ultimamente, tem-se vindo a concentrar nas questões da alimentação e da segurança alimentar.
A NATO é muito mais do que defesa e uma das coisas que está a procurar privilegiar é a questão da estabilidade do funcionamento da segurança alimentar como motivo de paz. E, neste momento, há um conflito aberto. A Polónia, aliás, vai apostar este ano no seu orçamento, num valor histórico em termos de defesa. E penso que isso é uma estratégia que os outros países, os membros da NATO, irão fazer. A questão do investimento dos estados-membros na NATO é muito importante, porque não podemos estar à espera sempre que sejam os nossos amigos americanos a vir proteger a Europa e nós depois dizemos que estamos numa aliança e não cumprimos nada.
Uma das experiências que eu tenho tido agora, na minha ligação recente à NATO, é que não importa só que o país tenha, em caso de guerra ou de conflitos, a capacidade de abastecer as suas populações. Também tem que ter a capacidade de abastecer aqueles que, por alguns motivos de defesa, tenham que situar-se no nosso território ou progredir o nosso território para motivos de estabilidade ou de paz. Portanto, é a nossa população, mas também tem que estar disponível para que, em conjunto, consigamos dar essa segurança alimentar e do ponto de vista logistíco.
Aliás, neste momento, a NATO pediu para que os diferentes países priorizem as suas infraestruturas críticas. Nós, em Portugal, temos uma comissão de planeamento de emergência, de proteção civil. Estamos, neste momento, a realizar reuniões com alguma frequência e houve uma reunião recentemente, antes de férias, sobre a segurança das cadeias de abastecimento. Estivemos a discutir desde a água, a energia, o transporte, a grande ou pequena distribuição, os aspectos logísticos. E, portanto, esse poderá ser um fórum muito relevante, até porque isto não depende apenas do ministro da Administração Interna ou da Defesa. Também tem a ver com a Agricultura, tem a ver com a Infraestrutura. Aliás, este órgão depende diretamente do gabinete do Primeiro-Ministro.
Mas eu gostava que isto fosse levado a sério e fosse interiorizado politicamente, que estivéssemos muito mais preparados antes de acontecer um conflito. Na Europa, neste momento, também estamos a discutir um mecanismo de emergência e de segurança alimentar. Está a começar a haver, cada vez mais, uma ligação entre a NATO e as próprias políticas da União Europeia. E eu não tenho dúvidas que o próximo mandato da Comissão Europeia vai ter em conta cada vez mais a política de defesa. Tem que ter a agricultura nesta perspectiva que também faz parte da alimentação de uma política de Defesa.
E há outra questão. A presidente Van der Leyen deu a entender que queria ter um comissário ou uma comissária para as questões do Mediterrâneo, que têm a ver com as migrações.

Em relação ao Regulamentação Anti Desflorestação da União Europeia: é um exemplo da complexidade regulatória? O que está em causa e o que é urgente limar?
No fundo, é o abastecimento livre de desflorestação. Digamos que o objetivo da União Europeia é legislar para que possamos importar determinados produtos – e são sete neste momento: soja, café, cacau, borracha, palma, madeira e bovinos -, provenientes de regiões que não tenham sido desflorestadas a partir de 2020. Esta foi uma legislação que, estranhamente, foi apressada em termos da proposta da Comissão Europeia. À data havia um comissário europeu muito forte, o Frans Timmermans, mas, enfim, ele fez aquilo que o mandato da Comissão o deixou fazer. O que aconteceu é que, de facto, era preciso, digamos, alguma espetacularidade e mostrar liderança forte da União Europeia e então foi publicada a lei da desflorestação.
Foi discutido no Parlamento Europeu, um Parlamento Europeu que era muito sensível a estas questões ambientais, às questões do bem-estar animal, que são questões relevantes, a redução dos antibióticos, tudo isso são questões relevantes e nós não fomos contra. Pensamos é que tem que haver aqui algum equilíbrio. A legislação entrou, de facto, em vigor e a Europa quer que essas materiais-primas, possam vir de zonas não desflorestadas.
Temos agora outra questão, como provar que vêm de zonas não desflorestadas? É que estamos a falar de países muito complexos. Por exemplo, se nos Estados Unidos podemos admitir que parte do país, ou quase todo o país, já foi desflorestado há muitos anos, estamos a falar, por outro lado, de países dos quais nós importamos e são muito importantes, nomeadamente, o Brasil, a Argentina, o Paraguai. Temos a questão da floresta Amazônica. Por exemplo, o cadastro ambiental rural no Brasil permite que seja feita desflorestação. E quando falamos no café ou no óleo de palma, estamos a falar de países como Etiópia, Malásia, Indonésia, onde, de facto, sobrevivem em muitas zonas graças àquelas produções. Portanto, tudo isto é demasiado complexo.
Nós, em termos de FEFAC, temos um guia para a produção de soja responsável, soja sustentável, com vários critérios, social, ambiental, económico. E muitos dos processos de produção de soja estão dentro desses critérios. A Comissão Europeia não reconheceu como bom este sistema e quer um sistema de geolocalização. Portanto, saber por geolocalização onde é que são as parcelas. E mais, querem uma rastreabilidade física. Não sei se está a imaginar um pequeno produtor…

E quer que o produtor local invista nesse sistema?
Sim, sim. Através do sistema de ‘due diligence’, isto é, tem que haver um certificado emitido localmente, tem que ser reconhecido pela Comissão Europeia, tem que ser inserido numa plataforma, as autoridades de cada Estado membro têm que verificar se está conforme. É preciso um sistema de informação gigantesco, uma plataforma, os testes que foram feitos apresentaram um monte de problemas, o sistema cai…
Portanto, estamos aqui a introduzir complexidade e nós temos colocado à Comissão Europeia uma série de dúvidas, temos pedido explicações. Há três meses que o processo está parado no gabinete da comissária, da presidente da Comissão Europeia, estamos à espera de respostas a partir de Setembro.
Estamos a pedir o adiamento da legislação, da entrada em vigor. Para quê? Para que nos possamos sentar à mesa e preparar as coisas, porque nós não queremos fraude. Nós queremos saber como é que as coisas funcionam e neste momento há uma incerteza jurídica muito grande. No caso da soja, e de acordo com os nossos dados, apenas sete a oito milhões de toneladas de soja poderão cumprir o que está previsto, e fundamentalmente dos Estados Unidos, porque acreditamos que vai ser uma região de baixo risco de solicitação. Mas nós precisamos de 30 milhões. E precisamos de café, precisamos de palma, precisamos de chocolate e de bovinos.
E atenção, isto não é só para importação, também tem a ver com a produção interna e estamos a trabalhar com o ICNF e a DGAV. No caso do bovino de carne essa documentação tem que acompanhar a produção toda até ao retalho. Tendo em conta aquilo que fomos percebendo, o impacto para o nosso país poderá custar, em termos de alimentos compostos para animais, entre mais de 25 a 30 milhões de euros. O que significa que, de duas uma, ou a indústria vai incorporar, de facto, esta crescimento e aí vai perder competitividade, ou vai transferir para o consumidor, provavelmente, parte desses custos. No fim do dia, o que é que teremos? Produtos mais caros. E nós perguntamos se o consumidor tem consciência disto, se está disposto a pagar e se os decisores políticos, antes de tomarem medidas, não têm noção do impacto que as mesmas geram.
Não seria melhor trabalharmos globalmente em conjunto para atingir as metas? Poder-me-á dizer: será que as organizações internacionais serão capazes, depois, de impor estas regras? Mas temos que ir por aqui, senão, estamos a perder competitividade e a colocar em causa a tal segurança alimentar.

A ciência é um aliado do objetivo de segurança alimentar para todos?
Eu penso que é um grande aliado. Eu sei que a ciência tem um problema: não sabe comunicar, ou é difícil comunicar a ciência. E depois, há outro fenómeno- a comunicação nas redes sociais. Há uma desinformação muito grande, as pessoas leem pouco, leem cada vez menos e preocupam-se com os highlights e com os títulos. Mas há muita ciência. Cada vez mais há uma ligação entre o mundo empresarial, a investigação e a academia, as universidades. Por isso foi criado o consórcio FeedInov, de que a IACA é, em Portugal, o principal acionista, e estamos à procura de não só comunicar aquilo que fazemos, com dados concretos, a tentar responder a questões que as empresas colocam, estudando-as com a investigação e com as universidades, levando depois os resultados ao conhecimento público.

O desenvolvimento de outros produtos, como as proteínas insect based ou à base de algas, podem vir a ser uma fonte de alimentação complementar para o abastecimento humano e também animal?
Sim, são coisas que estamos a estudar, que têm de ser estudadas e que necessitam de escala. Mas podem ser uma fonte de alimentação complementar. Não de substituição, mas complementar. Disso, eu não tenho dúvidas. Agora, como tudo, passará sempre pela aceitação do consumidor, e por aquilo consumidor quiser, mas eu penso que poderá ser uma alternativa na alimentação animal, sobretudo na aquacultura, nos petfoods. Neste momento, é preciso escala e para haver escala é preciso haver aceitação. Mas penso que é uma questão de tempo.

Do que trata o projecto InsectEra?
O InsectEra, no fundo, é um PRR. A EntoGreen é que está a liderar o consórcio e no dia 23 de outubro vai realizar-se o congresso InsectEra, com o tema ‘Os insetos como ferramenta de sustentabilidade’. Um grande objetivo do projeto é a construção de uma fábrica em Pernes, para, de facto, ser possível começarmos a ter a tal escala e desenvolver produtos para estes setores todos. E nos animais, não é só a questão da alimentação pela alimentação; é que os insetos poderão ter um efeito de defesa e reduzir a utilização de micropianos e proteger a saúde do animal. Mas depois há consumidores e há empresas que, por questões ligadas à desflorestação, à biotecnologia, à sustentabilidade ou outra, querem trabalhar com insetos. Portanto, poderá ser, de facto, uma alternativa. Em termos de alimentação animal, penso que terá mais potencial do que eventualmente a alimentação humana. Mas vamos ver como é que o mercado reage.
As alterações climáticas e os conflitos armados são grandes ameaças ao abastecimento alimentar a nivel mundial. São realmente as maiores ameças? Ou o protecionismo praticado por nações e a dependência de grandes países produtores, como China, EUA e Brasil, são dificuldades igualmente grandes?
O que se nota é que há um descontentamento mundial grande em relação, e goste-se ou não, à maneira como têm funcionado as organizações supra-nacionais, a ONU, a Organização Mundial do Comércio, as diferentes estruturas dentro das Nações Unidas. O Secretário-Geral da ONU tem vindo a chamar a atenção, desde há muitos anos, para reformas e não tem sido fácil, porque há o veto do Conselho de Segurança. E o que temos vindo a notar é que o chamado Sul global, países como o Brasil, a China, a Índia, a África do Sul têm vindo a tentar convencer outros de que haverá uma política alternativa.
Mas ainda não se percebeu bem se eles querem destruir completamente essas organizações ou se querem construir por dentro. Há esta tensão entre a China e os Estados Unidos e a União Europeia. Não só alguns países estão a impor taxas aos veículos elétricos, como a China está a ripostar e, portanto, provavelmente vai impor sanções a produtos alimentares, a produtos nos quais a Europa é dependente. Vamos ver. A ameaça existe, mas eu não acredito que seja do interesse da China ou da Europa ou dos Estados Unidos abrir um foco de tensão permanente. Mas, obviamente, vamos viver aqui, se calhar, numa guerra fria em que vai ser importante manter os canais diplomáticos abertos.
Nessa perspectiva, não interessa, de facto, à Europa uma política proteccionista. O isolacionismo penso que não interessa a ninguém. Mas também, por outro lado, já percebemos que a globalização desenfreada e sem regras também não interessa. Portanto, digamos que o grande desafio que temos pela frente é tentar encontrar este equilíbrio num mundo instável em que não temos lideranças. Enfim, parece não termos líderes fortes. Cada vez mais julgamos com o peso da opinião pública e com o ruído e a desinformação, que é outra questão relevante.

É o primeiro perito português a integrar a NATO na área da soberania alimentar. Quais são as soluções para as quais gostaria de contribuir enquanto perito da NATO?
Eu vou fazer parte de um grupo de planeamento da agricultura e da alimentação, fundamentalmente na área de regiões do Mediterrâneo. E, portanto, aqui está a importância que a NATO está a dar a esta região, porque o Mediterrâneo tem muito a ver também, com o Mar Negro, com a Turquia. E se falarmos, enfim, na área de Egipto, Marrocos, Tunísia, bom, é uma área muito delicada.
E o que eu espero é, por um lado, pôr as questões da soberania alimentar e da insuficiência alimentar na agenda. Por outro lado, acentuar que isto respeita a todos. Esta é uma nomeação individual, não é nomeação política. É uma nomeação meramente técnica e porque quem me nomeou acredita que eu tenho alguma capacidade e conhecimento de abordar estas áreas, tenho informação, ando nisto já há alguns anos. Mas eu não dependo politicamente de ninguém, vou ter o apoio do staff do Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral, vou estar enquadrado no conselho de planeamento e proteção civil, que responde ao Primeiro-Miinistro.
Agora, o que eu penso fazer é tentar que as organizações ligadas à fileira agroalimentar, Confagri, CAP, CNA, APED, FIPA, participem juntamente com o Governo e transferir, se for possível, para aqui, o grupo de diálogo que funcionou durante a pandemia. Nós vamos limitar-nos a dar recomendações. O Grupo de Planeamento de Agricultura e Alimentação depende de um comitê de direção de resiliência que responde diretamente ao Secretário-Geral da NATO. Não vou ter mais nenhum papel do que fazer ouvir a minha voz e isso vou tentar fazer e prestigiar Portugal. Vou-me empenhar nisso. Se conseguir sensibilizar para que as políticas públicas tenham em conta, de facto, estes impactos, acho que já não é mal de todo. Vou tentar contribuir para a mudança e vou empenhar-me com todas as minhas forças e com tudo aquilo que eu sei.

A minha última questão parte do título de um artigo que escreveu há relativamente pouco tempo e que se chama ‘A comida não dá votos. E a falta dela?’ Isto é um alerta?
É um alerta. Penso que foi a Dra. Manuela Ferreira Leite que disse, e foi mal interpretada, ou, pelo menos, percebe-se o que ela quis dizer, sobre vivermos seis meses numa ditadura, sem democracia, para as pessoas darem valor, àquilo que têm. Eu não queria que isso acontecesse, mas, de facto, a comida não dá votos.
E o que é que eu quis dizer com isso? Que a agricultura e a alimentação não dão votos. Porque na campanha, falou-se pouco da agricultura. Aliás, na campanha para as eleições europeias, falou-se nada da Europa. Há uma iliteracia muito grande relativamente à União Europeia, como é que ela funciona, e a Europa ali passou ao lado. De facto, houve promessas, estive em Santarém durante a campanha (eleitoral), ‘a agricultura era isto’, ‘o Governo ia reverter e fazer e acontecer’. Ainda não se viu nada.
O que eu acho que é importante é o agricultor ter apoio, haver proximidade e ser apoiado. Também não me parece que, como funcionava a agricultura antigamente, dessem um grande apoio, porque havia insuficiência de meios. Aliás, é outra questão. Nós, na DGAV, na nossa área, temos uma insuficiência enorme de meios. O Estado precisa de se renovar, precisa de gente. Porque cada vez se tem mais competências e menos pessoas para as executar.
E, portanto, o que eu quis dizer é que, então, se a comida não dá votos, talvez se faltar comida, as pessoas aprendam e valorizem mais a importância que a alimentação tem na nossa vida.

Esta entrevista foi publicada na edição 426 do Hipersuper

Sobre o autorAna Grácio Pinto

Ana Grácio Pinto

Entrevista

“A logística urbana é sem dúvida um grande desafio para todo o setor”

“As cidades deverão dar cada vez mais atenção a este tema da logística urbana. Existem medidas que têm sido tomadas e projetos em curso, mas existe um longo caminho a percorrer”, define ao Hipersuper, Afonso Almeida, presidente da direção da APLOG.

Afonso Almeida, presidente da direção da APLOG, sublinha o desafio que a logística urbana representa para todo o setor.

A logística urbana é um dos grandes desafios para os players do setor? Na abertura da conferência Cidades & Logística, referiu que de 2022 para 2023, o tráfego aumentou 20% em Lisboa e Porto.
A logística urbana é, sem dúvida, um grande desafio para todo o setor. O aumento exponencial da entregas on-line, em especial nos últimos anos durante e pós pandemia, fez com os players do setor tivessem que se modernizar de forma muito rápida para poder responder às necessidades do mercado. Através da tecnologia, da digitalização, da automação, entre outras ferramentas, é possível hoje fazer entregas por todas as cidades em tempos muito reduzidos. Um estudo apresentado pela Inrix, uma consultora norte americana especializada em análise de dados de tráfego, mostra que a maioria das grandes cidades na Europa e no mundo tiveram um aumento de tráfego muito significativo. No caso de Lisboa e Porto os dados apresentados de 2023, mostram um crescimento do tráfego em mais de 20% em relação ao ano anterior. Esta situação deve mostrar-nos uma grande preocupação, sendo muito importante perceber as causas para este aumento e fazer com que as cidades possam tomar medidas urgentes para minimizar esta situação.

A logística urbana deve dar prioridade a conceitos como a habitabilidade e a sustentabilidade nas cidades? Nesse sentido, os lockers e as entregas de última milha com veículos alternativos deveriam ser priorizados?
As cidades deverão dar cada vez mais atenção a este tema da logística urbana. Existem medidas que têm sido tomadas e projetos em curso, mas existe um longo caminho a percorrer. É um tema que nunca está terminado, e deve ser importante envolver todas as partes interessadas, no sentido de conseguir arranjar as melhores soluções para a cidade, tendo uma visão de futuro mais sustentável. Existem já lockers a funcionar em alguns locais mas ainda estamos numa fase algo inicial. Devemos olhar para projetos noutras cidades e noutros países, que nos indicam caminhos interessantes. A forma como se faz as entregas da última milha deverá ser claramente otimizada com a implementação de hub´s em diferentes zonas da cidade, que permitam reduzir claramente o número de viaturas que existem hoje a efetuar entregas na cidade de Lisboa e Porto. A eletrificação das frotas deverá ser acelerada e também o uso de novos veículos de diversos tipos mais sustentáveis.

No global, para onde apontam as soluções? Como obter uma logística urbana eficaz e sustentável?
As soluções devem passar claramente por um trabalho sério das autarquias, alinhadas com políticas centrais, envolvendo especialistas e trabalhar em conjunto para arranjar soluções par este problema atual e real. É preciso investir neste tema com mais planeamento, rapidez e estratégia de médio longo prazo. Por esse mundo fora existem soluções interessantes e inovadores que podem ser analisadas e ver a possibilidade de poder aplicar nas nossas cidades as soluções que possam fazer sentido. Questões como dos horários de entregas, locais de descargas, hub´s estrategicamente locados em locais de Lisboa e Porto que permitam reduzir o tráfego, centralizando entregas com uma redução significativa do número de veículos em circulação. A questão dos lockers é fundamental, pois vamos ter que nos convencer que não é sustentável continuarmos a receber as nossas encomendas em casa. Se continuarmos neste caminho, a tendência será continuar a aumentar o tráfego e o congestionamento das cidades, entrando em contraciclo com o que se pretende para ter cidades mais sustentáveis.

Esta entrevista foi publicada na edição 426 do Hipersuper

Sobre o autorAna Grácio Pinto

Ana Grácio Pinto

Alimentar

“Realizar os WCA em Viseu e na Região Centro é um sentimento de enorme orgulho e satisfação”

A cidade de Viseu recebe, em novembro, os World Cheese Awards 2024. Considerados os ‘Óscares do Queijo’, decorrem pela primeira vez em Portugal. Motivo para uma entrevista a Bruno Filipe Costa, o impulsionador da vinda do evento para Portugal. “A organização portuguesa sempre defendeu a visão que, mais do que ser em Portugal, era na Região Centro, o que significaria receber este evento no berço de um dos mais antigos, mais tradicional e de maior prestígio internacional, entre os queijos nacionais: o Queijo Serra da Estrela”, destaca.

Como decorreu o processo até a Guild of Fine Food decidir realizar o World Cheese Awards 2024 em Portugal?
Num evento com a dimensão e relevância dos World Cheese Awards, a escolha da região e país anfitriões é encarada como um passo determinante no processo de organização de cada edição, desempenhando um papel significativo, não só para o sucesso do próprio evento, mas sobretudo para a promoção e divulgação dos melhores queijos do mundo em mercados reconhecidos pela sua importância na produção queijeira a nível mundial, que é um dos principais objetivos dos World Cheese Awards.
Dito isto, o processo acabou por ser bastante longo devido, não apenas aos valores envolvidos, mas à necessidade de garantir o envolvimento de uma região que nos permitisse reunir as condições certas para receber o evento. A par disso, a existência de um espaço físico com as dimensões e características adequadas para o evento, a logística, os hotéis, os voos, tudo foram variáveis, por vezes desafiantes de solucionar, e que levaram a que o processo de negociação se estendesse por largos meses. Começámos a falar com a Guild of Fine Food em agosto de 2023, alcançámos o acordo em fevereiro de 2024 e só no final de maio foi possível formalizar com todas as entidades envolvidas. De ressalvar a postura sempre aberta e simpática com que a Guild of Fine Food sempre recebeu a delegação portuguesa.

No final, o que pesou para que o país fosse escolhido? A qualidade dos queijos produzidos em Portugal foi um fator importante?
Acredito que tínhamos a proposta que melhor personificava o evento. Por um lado, era um país que ainda não tinha recebido os WCA, com a mais-valia de que o erámos, ao mesmo tempo, um dos países com melhor gastronomia e produção artesanal. Desde o início, a organização portuguesa sempre defendeu a visão que, mais do que ser em Portugal, era na Região Centro, o que significaria receber este evento no berço de um dos mais antigos, mais tradicional e de maior prestígio internacional, entre os queijos nacionais: o Queijo Serra da Estrela. Tudo isto, combinado com o empenho e profissionalismo da nossa candidatura, onde tenho de destacar o Paulo Salvador, resultaram na vitória de Portugal nessa decisão.

Como se processa a competição e as escolhas do júri?
Vou tentar simplificar um processo que engloba alguma complexidade. Os cerca de 4500 queijos a concurso são divididos por grupos de 45 unidades (100 mesas) e cada uma dessas mesas recebe um grupo de jurados que irá pontuar cada queijo individualmente, numa prova cega e sem saber nada sobre cada um deles – origem, produtor, etc. Assim, teremos um queijo vencedor em cada mesa, resultando num lote de 100 queijos apurados para passar à grande final. Nessa segunda avaliação, um grupo restrito dos mais prestigiados juízes do mundo irá realizar uma nova prova cega. Dessa segunda pontuação, irão resultar as 13 medalhas Super Gold – Os Melhores Queijos do Mundo 2024.

O que destacaria, para além do concurso, como importante no programa deste evento? Haverá outras ações?
A Feira de Produtores é um dos pontos de maior atratividade deste evento. Obviamente que assistir ao vivo, e poder provar, alguns dos melhores queijos do mundo, podendo interagir, no mesmo espaço, com autênticas estrelas mundiais, é uma oportunidade ímpar e talvez única. No entanto, não só de super chefs e jornalistas internacionais mediáticos se faz o evento. As verdadeiras estrelas são os nossos produtores. Numa tenda com 1.100 metros quadrados, os visitantes poderão, não só provar os melhores queijos do mundo, como celebrar aquilo que de melhor se faz em Portugal a nível gastronómico. Serão três dias de queijos, vinho, enchidos e doces, ou seja, os melhores sabores e aromas estarão disponíveis a todos aqueles que nos quiserem visitar.

Referiu que a escolha de Viseu como cidade do evento teve em conta a sua cultura gastronómica e tradição da indústria queijeira. Houve também uma preocupação em descentralizar a realização de grandes eventos?
Sim, isso é bastante claro. Tanto eu como o Paulo Salvador tínhamos esse objetivo delineado desde o primeiro momento. É importante, num país tão pequeno, poder criar condições para que outras cidades e regiões tenham o destaque internacional que tanto merecem. Poder realizar os WCA em Viseu e na Região Centro é um sentimento de enorme orgulho e satisfação, e talvez o maior prémio de termos ganho esta organização. Cada dia que passo na região, com os produtores e com as pessoas, cresce a minha admiração e profundo agradecimento por aquilo que melhor representa Portugal: aqueles que, diariamente, muitas vezes enfrentando profundas adversidades e assimetrias, elevam o nome do país, através do seu trabalho, do seu talento, produtores que criam, com as suas próprias mãos, verdadeira riqueza, contribuindo para o crescimento e desenvolvimento regionais. Viseu e a Região Centro mereciam esta distinção e tenho a certeza de que será impactante, para quem nos visita de fora de Portugal, conhecer esta terra e esta gente.

Que importância pensa que venha a ter para Viseu e para a região da Beira? Acredita que possa ir além da divulgação do setor e dos seus queijos DOP ou de cariz ‘único’ e dar visibilidade a outros produtos endógenos? Ou até a outros setores, como o do turismo?
Tenho a certeza e tudo faremos por isso. Teremos mais de 100 jornalistas internacionais no território ao longo dessa semana, além de influencers e profissionais de quatro continentes, a quem iremos apresentar a região. Nessa semana, teremos o nosso foco, extraconcurso, na promoção das pessoas, do turismo, dos produtos e, numa palavra, do Centro. Esta pode ser a melhor ação de promoção internacional para esta região e espero que possamos contribuir para futuras exportações e ganhos turísticos e de notoriedade.

E, num plano mais alargado, o que poderão Portugal e os produtores a concurso ganhar com a realização deste evento mediático?
Acima de tudo, acredito que ganham dimensão mundial. Viseu é, neste momento, a ‘Capital Mundial do Queijo’ e isso, por si só, já nos garante uma visibilidade internacional que irá perdurar nos próximos anos. Nesse plano mais alargado, os produtores vão ganhar palco internacional para alavancar os seus produtos e marcas, aumentando significativamente o seu espectro de clientes.

 

Sobre o autorAna Grácio Pinto

Ana Grácio Pinto

Carlos Gonçalves, CEO e co-fundador da Casa Mendes Gonçalves
Alimentar

Carlos Gonçalves: “Não queríamos ser mais um e hoje continuamos a não querer”

Carlos Gonçalves assume plenamente a afirmação que dá titulo a esta entrevista. Mas, com a mesma intensidade, afirma “o orgulho” em que a Casa Mendes Gonçalves seja, há 42 anos, “uma empresa de pessoas”. “Foram as pessoas que nos trouxeram até aqui”.

A Casa Mendes Gonçalves chegou ao mercado há 42 anos e logo com um produto que tanto teve de arriscado como de inovador. O vinagre de figo firmou-se e provou que vale a pena arriscar e diferenciar-se. E os dois fundadores, responsáveis pelo seu lançamento, mostraram que inovar e apoiar a produção nacional, vale ainda mais a pena. “Fazemos as coisas porque nos apaixonamos por elas, porque acreditamos nelas e a nossa história mostra isso. Temos tido sucesso e o sucesso é esse: as pessoas acreditarem e fazerem”, define Carlos Gonçalves, CEO e co-fundador da Casa Mendes Gonçalves nesta entrevista ao Hipersuper.

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Começou ainda adolescente a trabalhar com o seu pai, na produção de vinagres, e decidiram-se pela criação de um vinagre de figo. Essa aposta arriscada, mas ao mesmo tempo inovadora, definiu logo ali o que seria a Casa Mendes Gonçalves?
Sim. Sempre que acompanho uma visita à fábrica e chego à área onde estão os figos, digo que nós temos duas características. Costumo dizer, a brincar, que há 42 anos a palavra inovação só estava no dicionário ninguém a usava. Mas não queríamos ser mais um e hoje continuamos a não querer. Quisemos fazer um produto diferente. A outra característica, que também sempre nos marcou, foi a produção nacional, produzir com matérias-primas nacionais, de perto de nós. E o figo reunia essas duas características: é do concelho de Torres Novas e é um produto bastante diferenciador, com muita qualidade.
E era sempre uma empresa a começar, com um homem de 60 e um miúdo de 15 anos a fazerem uma coisa que ninguém fazia e a adicionarem bastante complexidade e risco. Mas o processo valeu a pena.

Referiu o facto de a empresa apostar nos produtos da região. O crescimento levou a Casa Mendes Gonçalves a diversas geografias e continentes, mas continua a manter-se na Golegã. Esta ligação é também parte do seu percurso de sucesso?
Não só se mantém, como se aprofundou. Nós, empresas familiares, para além de acharmos convictamente que temos uma responsabilidade muito grande, temos também uma facilidade grande de o fazer. Ou seja, por um lado em termos de decisões nós podemos pensar as coisas a médio e longo prazo. Não temos que pensar a quatro anos, a princípio não somos despedidos, ficamos cá, portanto temos essa possibilidade. E hoje em dia esse é um bem enorme, o de poder planear o futuro sem o imediatismo.
Por outro lado, é isso mesmo que diz: nós estamos na nossa terra com a nossa gente, num sítio que conhecemos e isso dá-nos uma vantagem competitiva enorme. Se estivéssemos noutro sítio qualquer não aconteceria. Portanto essas duas coisas juntas dão-nos uma possibilidade de mudar o nosso mundo, como eu costumo dizer.
As empresas familiares têm essa responsabilidade que, no nosso caso, assumimos claramente, de que a sociedade toda evolua connosco e que nós, a cada momento, possamos ser produtores desse desenvolvimento. Não só dar emprego, mas que haja outros negócios à volta. Digo muito convictamente: estaria muito satisfeito se houvesse mais empresas na Golegã e se houvesse empresas maiores que nós. Era sinal que tínhamos feito o nosso papel e já não precisávamos estar sozinhos a ‘puxar a carroça’, já haveria mais gente a puxar.

Carlos Gonçalves, CEO e co-fundador da Casa Mendes Gonçalves


Os molhos foram uma aposta natural para quem já fazia vinagres alimentares ou viram nesse novo produto também uma forma de se diferenciarem?

É um pouco das duas coisas. Por um lado, uma continuidade daquilo que nós fazíamos e de uma empresa que estava mais ou menos ‘esgotada’ por ali. Nós começamos a fazer vinagre, fizemos muitos e diferentes vinagres, embalagens diferentes, negócios diferentes, apareceu a distribuição em Portugal e estávamos em todo lado, fazíamos as nossas marcas, as marcas próprias, até as marcas concorrentes… Portanto, o negócio de vinagre estava muito esgotado e os molhos foram um seguimento natural, dentro da mesma área de negócios, muitas vezes com os mesmos compradores, e uma evolução natural daquilo que fazíamos. E, claramente, uma oportunidade de podermos diferenciar-nos. É isso também com a Paladin e hoje o que trazemos são sabores diferentes, os sabores portugueses. A Paladin, no relançamento, foi muito por aí, por sabores diferentes que não existiam muito ligados ao nosso sabor português e aos nossos ingredientes.

Foi o que viram na Paladin, que adquiriram em 2000? Uma mostarda que podia ‘sair’ do circuito das roulottes, digamos assim, dar origem a uma gama de produtos e ganhar as vendas no retalho?
Quando comprámos a Paladin, tinhamos muito pouco conhecimento da área, mas investimos, começámos a fazer uma fábrica. Digo sempre que sabia menos que zero porque algumas coisas que eu achava que eram certas estavam erradas, portanto, literalmente, sabia menos que zero. Foi um risco grande ir para uma área de negócio muito diferente, muito mais competitiva que o vinagre sem ter esse conhecimento. Mas fomos à procura da oportunidade e rapidamente contratamos colegas com conhecimento e que desenvolveram o negócio aqui em casa.
Quando olhamos para o mercado, estamos perante um mercado bem diferente do tradicional, um mercado muito competitivo dominado pelas grandes multinacionais, muito dinâmico a todos os níveis. E, portanto, uma empresa da Golegã, de Portugal, que estava a começar sem conhecimento nenhum, ir ‘de frente’ seria mais ou menos um suicídio. Mas escolhemos os dois caminhos, de que já falámos hoje, e com muito orgulho continuamos a seguir: a portugalidade – não seria credível que nenhuma multinacional viesse a abrir uma fábrica em Portugal e fazer as coisas com os nossos ingredientes e a inovação/versatilidade, ser rápido a chegar ao mercado.
Como costumo dizer, usando a linguagem futebolística, puxámos o jogo para o nosso lado, para o nosso campo onde tínhamos uma vantagem competitiva. Hoje isso trouxe-nos o ‘prémio supremo’ e que é produzirmos para alguns que eram os nossos concorrentes.
A Paladin era uma marca de mostarda, tinha uma referência no mercado tradicional, e nós vimos a oportunidade de ser a nossa marca dos molhos. A nossa marca era a Peninsular, que estava muito ligada a vinagres, e quando iniciamos os molhos começámos com a Peninsular que era o que tínhamos. Mas rapidamente vimos que a Paladin poderia ser a nossa marca para molhos e também a nossa marca para internacionalizar.

Para além de inovar, também anteciparam tendências…
Sim, é o que procuramos fazer ainda hoje. Temos uma equipa de colegas no departamento de Investigação e Desenvolvimento e as minhas colegas e os meus colegas vão literalmente a todos os cantos do mundo. Procuramos estar atentos às tendências e também procuramos antecipar as tendências da alimentação que hoje são conhecidas e traduzir essas tendências em produtos que sejam fáceis de usar e adaptados aos nossos hábitos de consumo.

Carlos Gonçalves, CEO e co-fundador da Casa Mendes Gonçalves

O que está a mudar na Casa Mendes Gonçalves, que investimentos em sustentabilidade estão a fazer como consequência dos critérios ESG?
Eu prefiro a expressão que usou, ESG, porque traduz melhor. Sustentabilidade começa a ser um termo que quer dizer tudo e não quer dizer nada e principalmente quer dizer greenwashing e nós procuramos estar afastados disso. O que queremos fazer está bem assente nos três pilares ESG. Nós somos uma empresa industrial temos uma pegada, gastamos água, gastamos energia. Queremos, antes de mais, medir o nosso real impacto, criar medidas para reduzir e então se houver algo que nós não consigamos reduzir ou eliminar, compensar. Não lhe vou dizer que todos os nossos telhados têm painéis. Agora ainda estamos a construir mais e já temos os painéis encomendados porque é quase uma obrigação, hoje, fazê-lo.
Olhamos muito para o social, o ‘S’ para nós é fundamental. Temos orgulho em ser uma empresa de pessoas há 42 anos e foram as pessoas que nos trouxeram até aqui. A complexidade que temos na sociedade levou-nos a uma responsabilidade muito maior nessa área. O concelho da Golegã tem cinco mil habitantes e nós empregamos mais de 400 pessoas. Temos refugiados, que recebemos através de um programa em parceria com a fundação Aga Khan, num plano não para um ano ou para quatro anos, mas para 20 anos. Para que as várias crianças que já nasceram na Golegã, daqui a 20 anos possam contar uma história de sucesso. E, noutra vertente, também dos jovens que emigraram. Temos na empresa quatro ou cinco jovens que estavam a trabalhar no estrangeiro e que vieram trabalhar para a nossa empresa. Portanto, não é uma inevitabilidade que os jovens portugueses não voltem, querem voltar desde que nós lhes demos todas as condições. Porque nós temos que valorizar as pessoas pelo rendimento que dão, eu não conheço nenhum país no mundo que se tenha desenvolvido com salários baixos. Temos um plano de alojamento que nunca tinha sido oferecido e vamos estruturá-lo agora melhor, com regras.

Como trabalha a sustentabilidade económica na empresa? Há um foco no reinvestimento dos lucros, por exemplo? As parcerias, quer com a indústria, quer com as insígnias do retalho têm a sua importância, para além da vossa produção própria?
Claro que nós temos de ganhar dinheiro, claro que se temos este projeto de desenvolver as nossas pessoas, de pagar bem às pessoas, de ter esta ação social, a empresa tem que ter resultados. Mas governance é mais do que isso, claro que no fim traduz-se em resultados, mas é ter gente com capacidade, gente com vontade de fazer diferente e gerir bem a empresa em todos os aspetos.
É fazer parcerias, e hoje, cada vez mais, felizmente, se fala nisso. Parcerias com os nossos fornecedores, com os nossos clientes, que nós preferimos chamar parceiros, precisamente por isso. Porque se nós criarmos um produto extraordinário, mas não tivermos matérias-primas, se não tivermos uma prateleira de supermercado para o colocar ou um restaurante, serve-nos de muito pouco. Ali é que efetivamos a nossa criação, é na venda. Portanto tudo isso é governance.
Precisamos investir no desenvolvimento da empresa, continuar a investir em pessoas, em equipamentos, em conhecimento fundamentalmente, e estamos à beira de o fazer. Iremos já no próximo ano, com toda a estrutura, entregar uma parte à sociedade através da nossa fundação. A empresa vai ser da fundação e, portanto, aquilo que já fazemos hoje vamos fazê-lo de uma forma estruturada. Falando, mais uma vez, em governance, todos nós que estamos nesta casa sabemos o fim para o qual estamos a trabalhar, temos muito bem definido o que é que vamos fazer no fim e toda a gente ter isso como foco.

Qual será o principal foco da fundação? A educação, a formação?
Sim, a educação e a formação são, para nós, quase uma obsessão. Mais uma vez digo que não conheço nenhuma sociedade, nenhum país que se desenvolva baseada em salários baixos e também não conheço, na história da humanidade, nada que se desenvolva sem conhecimento. E temos de o trazer às nossas pessoas, à empresa, à nossa região e esse será um drive muito, muito importante.
O outro está relacionado com o princípio da nossa atividade. Nós somos uma agroindústria e precisamos de produtos agrícolas, queremos muito produzir matérias-primas para nós, queremos testar formas de produzir matérias-primas, estamos a falar de qualquer produto agrícola, mas deixando na terra algo mais. Deixando o solo mais rico do que estava hoje e isto através da agricultura regenerativa, mas sempre com o drive do conhecimento, ou seja, vamos buscar o conhecimento onde ele existe hoje, trazer para aqui, testar e difundir. São os dois grandes drives. Queremos construir uma escola que seja para todos.

Carlos Gonçalves, CEO e co-fundador da Casa Mendes GonçalvesSerá no âmbito do projeto Vila Feliz Cidade? O projeto iniciou-se em 2019, mas teve a ideia em 2017. A agricultura regenerativa está a ganhar força a nível global, mas tanto em 2017 como em 2019, esta era uma abordagem de que pouco ou nada se falava. Porque decidiu avançar com este projeto e em que moldes é desenvolvida a parte agroflorestal?
Como digo, quando ouvimos que há algum conhecimento, há alguém que está a fazer alguma coisa diferente em alguma parte do mundo, vamos procurar saber os fundamentos, se realmente está a ter resultados, se é baseado em ciência vamos aprender e vamos testar. Adquirimos uma área com esse objetivo e estamos a utilizar 33 hectares, porque só tomaremos os outros 20 daqui a algum tempo.
Começámos por plantar os nossos pimentos picantes, fizemos 20 e tal variedades porque queríamos testar, ver as condições, ver os rendimentos. O próximo em que vamos investir é mostarda, muito nesta vertente da agricultura regenerativa, de proximidade, o terreno está aqui ao lado. Em relação aos pimentos picantes, por exemplo, posso lhe dizer que comprávamos fora, na América do Sul, uma grande parte e hoje produzimos aqui em agricultura regenerativa e conseguimos ser competitivos.
O que nós procuramos fazer, desse nosso projeto regenerativo, é criar modelos de negócio que sejam rentáveis para quem faz. Também queremos atrair jovens, atrair pessoas para o fazer, o nosso projeto é muito este: testar, comprovar e ensinar para que outros façam, para criarmos massa crítica com produtores à nossa volta, e, portanto, se queremos ter produtores à nossa volta, eles têm de ter rendimento. As pessoas que trabalham no campo, que fornecem as matérias-primas, têm que viver melhor, têm que ter um rendimento da sua atividade e com os pimentos comprovamos que isso é possível: é possível comprar em condições competitivas e ter um produto melhor porque está próximo e porque é colhido e processado logo para a indústria.
Tivemos uma reunião com um grande produtor local, o engenheiro João Coimbra, para testarmos a mostarda, que, para além de todas estas questões, vem de longe, vem do Canadá. Queremos trazer (a produção) para perto em parceria com outros agricultores de preferência aqui ao lado. Se trouxermos para Portugal é bom, se trouxermos para o Ribatejo é melhor, se trouxermos para a Golegã é melhor ainda.

A escola que referiu seria construída dentro do espaço do projeto?
Sim, porque tenho realmente este foco grande na escola. O projeto é de uma escola para os filhos dos meus colegas. Um berçário, um infantário, uma escola do primeiro ciclo. Com a estrutura que temos e com o apoio da Fundação Aga Khan, e com a credibilidade que o nosso projeto começa a ter, é fazer um projeto que envolva o estado português através do Ministério da Educação e da Segurança Social, a autarquia, a direção de educação da região. Uma iniciativa privada, mas que seja uma escola pública acessível a todos. Estamos a avançar, com conversas concretas com os ministérios para fazer um projeto piloto nesse sentido.

Referiu a questão da procedência das matérias-primas. Com a pandemia e depois com os conflitos externos, o aumento dos preços, como estão a enfrentar a insegurança no fornecimento? É possível encontrar um abastecimento de matérias-primas mais próximas?
É o que estamos a fazer com este projeto. Estamos a testar e a mostrar que é possível fazer isso, trazer as matérias-primas, os circuitos curtos. Falei na mostarda, toda a vida se produziu aqui mostarda e deixou-se de produzir por qualquer razão que o homem há-de explicar. Com a guerra Rússia-Ucrânia, para ter uma noção, 52% do nosso negócio desapareceu naquela primeira noite, não tínhamos matérias-primas para mais de metade do que nós fazemos. Como deve calcular, foi uma noite bem passada… na altura tínhamos 300 e tal pessoas e no dia a seguir não tínhamos matéria-prima, não tínhamos óleo, não tínhamos açúcar, não tínhamos amido. Isto faz-nos pensar ainda mais e olhar ainda mais para estas dependências e fazer aquilo que lógico e óbvio. Nós sempre produzimos aqui, temos todas as condições de produzir. E além do mais nós, estando aqui no Vale do Tejo com estas características de terreno, de água e de clima, é quase criminoso não o fazer.

Como conseguiram na altura ultrapassar a falta de matéria-prima?
O mais grave para nós foi o óleo de girassol, que era produzido na Rússia e na Ucrânia – produziam mais de metade do óleo de girassol do mundo – e a outra parte na América do Sul, na Argentina, nomeadamente, e não era época de campanha. Portanto, estávamos na campanha da Ucrânia. A partir do momento em que um grande país produtor é bombardeado e o que o bombardeia é o outro fornecedor, cortam-se os circuitos.
Portanto, deixou de sair naquele dia e foi substituído, talvez 10 dias depois, por óleo de colza, com todos os custos associados, com o triplo do preço, com os racionamentos. Nós mudámos as nossas fórmulas todas, foi um período difícil. Eu digo que começámos a empresa de novo, foi praticamente começar a empresa de novo. Porque, em alguns casos os ingredientes eram transversais a quase tudo o que fazemos e, portanto, tivemos de fazer fórmulas novas, testar. Em alguns casos havia questões legais porque o rótulo dizia óleo de girassol e já não era óleo de girassol, o consumidor ia ver que o sabor era diferente, e o preço.
Mas deixe que lhe diga, porque é justo, que foi notável a união de toda a gente, com a distribuição, com a produção primária, para podermos encontrar soluções. No nosso caso vou-lhe dar um exemplo que compreenderá: o óleo foi para o triplo do preço naquele momento, naqueles 10 dias não havia consumidor nenhum que comprasse uma maionese três vezes mais cara, não é um artigo de necessidade para ninguém. Portanto não nos bastava arranjar uma solução e dizer ‘está aqui a solução e custa três vezes mais’. Tínhamos de arranjar uma solução de preço e a reformulação implicou os ingredientes e implicou também mexer no custo porque havia ali um ingrediente que estava completamente ‘disparatado’.

Carlos Gonçalves, CEO e co-fundador da Casa Mendes Gonçalves


Depois de passar por uma situação difícil, era compreensível que adiasse investimentos. Entretanto decide investir numa participação na empresa britânica a Rubies in the Rubble, da qual a Casa Mendes Gonçalves já era fornecedora – neste caso do tomate que está na base do ketchup da marca britânica que foi considerado o melhor ketchup do Reino Unido, pelo jornal The Sunday Times. O que levou a esse investimento?

Procuramos fazer esses investimentos e ter essa clarividência e, lá está, nas empresas familiares é mais fácil. Não cortamos nas pessoas nem cortamos nos investimentos porque estava em causa o nosso futuro e se cortássemos naquela altura iríamos pagar caro mais à frente. E a Rubies in the Rubble é um pouco isso, é continuar a investir naquilo em que acreditamos.
A Rubies teve a ideia de fazer, na altura, chutneys e depois quando conhecemos e com o Eng. Martin Stilwell, que investiu connosco, a Rubies criou esta fórmula com tomate português e com fruta portuguesa, maçã, pera, para substituir o açúcar. E o prémio supremo foi ser considerado o melhor ketchup no Reino Unido com a qualidade do nosso tomate. Tudo aquilo que tenho estado a dizer, dos circuitos curtos, de produzir perto, de transformar imediatamente, obteve esse prémio lá e esperamos que um dia o tenha cá também.

O investimento nessa empresa tem a ver com um plano de expansão da Casa Mendes Gonçalves?
Tem a ver com esta ideia que temos sempre presente de que conseguimos realmente levar pelo mundo o que são os nossos sabores, o que é a qualidade dos nossos produtos, dos nossos ingredientes. E com a inovação de fazer um produto mass market com o desperdício alimentar e com as nossas matérias-primas. Portanto, é um win-win que nós acreditamos que podemos trazer agora para Portugal e levar para outros países. Porque acreditamos que é possível levar a mensagem de que um produto realmente de grande qualidade, e um produto agrícola tão banal como o tomate, pode fazer um ketchup muito bom e que as frutas que nós deitamos fora quase como uma inevitabilidade podem se tornar um ingrediente bom para a saúde porque evitam açúcar e dão um sabor ainda mais extraordinário ao produto.

Em termos de investimentos há projetos que estejam a desenvolver ou que vão iniciar?
Sim, nós não cortamos nos investimentos e estamos a admitir pessoas. Nesta área de tendências dos produtos fermentados, fruto de projetos de investigação e desenvolvimento que tivemos, neste caso com a Sonae e com o ISA, vamos lançar produtos nessa área. Toda esta tendência de produtos mais naturais, com mais sabor e com ingredientes naturais, é a nossa área de negócios em formatos mais ‘amigáveis’ do consumidor e da restauração, que é um negócio cada vez mais importante para nós.
Hoje com a alimentação cada vez mais vegetariana nós olhamos para isso, entramos nessa área. Portanto se há um consumidor que é vegan, que quer um molho vegan, vamos fazer um molho vegan; se é vegetariano, vamos fazer um molho vegetariano.

No âmbito do vosso plano de internacionalização, quanto representam os mercados externos?
Representam 20%, mas queremos chegar, em quatro, cinco anos, aos 40%, 50% do nosso volume de negócios.

Nesse sentido haverá uma aposta em novos mercados ou o foco é crescer onde estão?
Nós queremos consolidar. Nesta lógica de ficarmos por cá mais 400 anos (risos), temos tempo e nesta lógica de a nossa administração não precisar mostrar resultados imediatos, também temos tempo.
Veja o que aconteceu com a Paladin. Tivemos um plano, demorou anos a chegar até aqui, fizemos todo um caminho e criamos todo um plano. Se formos aqui para o lado, eles são cinco vezes maiores que nós, não vamos ser importantes lá porque somos portugueses. Com certeza temos de fazer um trabalho pensado e demorado no tempo. Olhamos muito para reforçar aquilo que temos e aquilo que acreditamos que vai ser importante para nós, ou seja, Marrocos, Espanha, o Médio Oriente, cada um num segmento. Na Europa fazer aquilo que nós fazemos aqui: parcerias fortes com empresas de distribuição que acreditem no que nós fazemos. Ou seja, que a sinergia seja com a qualidade, com os produtos e não seja com o preço.
Deixe-me dar o exemplo da Rubies in the Rubble: não foi chegarmos lá e ganharmos o prémio. Estamos há anos a fornecer para a empresa, precisámos ser relevantes, e precisaram conhecer o que fazíamos para nos dar esse prémio.

Daqui a 42 anos e mais 42 anos, onde estará a Casa Mendes Gonçalves? Qual é o caminho que está a traçar e que espera que a Casa Mendes Gonçalves siga quando já não tiver o Carlos Gonçalves a administrá-la?
Já tem esse caminho e não é por eu cá estar. Agora, estamos a fazer estes projetos, a pensar no ketchup, no piripiri, amanhã serão outros. Eu digo que temos de trabalhar o ESG e a inovação e acredito que a esmagadora maioria dos meus colegas e das minhas colegas estão cá por isso. Nós temos de desenvolver a sociedade, acreditamos que é o certo e acreditamos que temos de ser honestos connosco próprios antes de mais nada. Se fizermos isso vamos ter sucesso. Amanhã estaremos, como estamos hoje, a fazer produtos inovadores. Quando nós lançamos a Paladin fizemos coisas que nunca ninguém tinha feito, quando nós nascemos fizemos coisas que nunca ninguém tinha feito e isso faz-se não porque se estala os dedos ou se vai meditar para o Monte Evereste e se tem uma ideia. Isto faz-se porque se tem um plano e porque as pessoas estão bem, porque se sentem bem aqui, porque são livres de errar.
Mas, fundamentalmente, nós queremos realmente mudar o mundo começando por mudar o nosso mundo. Não sei se teremos capacidade de mudar o mundo, provavelmente não; mudar o nosso, temos. E isso é o que esta empresa vai ser, vai ser uma fundação, primeiro que mais, vai entregar os seus rendimentos a uma fundação e vai desenvolver a sua terra a sua região, o seu país. Acreditando, porque se não acreditássemos nisso, nada valia a pena.
Fazemos as coisas porque nos apaixonamos por elas, porque acreditamos nelas e a nossa história mostra isso. Temos tido sucesso e o sucesso é esse: as pessoas acreditarem e fazerem.

Esta entrevista foi publicada na edição 426 do Hipersuper

 

Sobre o autorAna Grácio Pinto

Ana Grácio Pinto

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Gonçalo Santos Andrade: “Vamos fazer história!”

Em entrevista ao Hipersuper, Gonçalo Santos Andrade, presidente da Portugal Fresh, antecipa um momento histórico para o setor com a maior representação de sempre de empresas portuguesas na edição de 2024 da Fruit Attraction, em Madrid: 54 participantes e um stand de 708m2.

Quais as expetativas para esta edição da Fruit Attraction? A presença portuguesa mostra a força das nossas empresas nestes setores?
As expectativas da Portugal Fresh para esta edição da Fruit Attraction de 2024 são muito altas. Nunca ocupámos tanta área, nem participámos com um número tão elevado de empresas como este ano. Vamos fazer história! O stand conjunto ocupa a maior área de sempre – 708 metros quadrados – e conta com a presença recorde de 54 empresas, organizações e associações de produtores e parceiros. Iremos, juntos, promover as frutas e legumes produzidos em Portugal com uma presença forte na capital espanhola, que mostra bem o dinamismo deste setor.

O objetivo passa por reforçar e procurar novos mercados mas a Portugal Fresh faz mais nesta feira: divulga Portugal. Também passa por aí o sucesso da presença em Madrid?
Sem dúvida. A presença em Madrid permite-nos demonstrar como a aposta na qualidade, na segurança alimentar e na tecnologia do nosso modelo agrícola também são as nossas vantagens competitivas. Debaixo de um único chapéu, promovemos Portugal de forma muito mais eficaz e impactante.

As exportações de frutas, legumes e flores cresceram 13,4% nos primeiros seis meses do ano, face ao mesmo período do ano anterior. A presença em feiras internacionais como a Fruit Attraction fazem a diferença nestes resultados?
As principais feiras internacionais são autênticos centros de negócios onde temos acesso aos principais compradores internacionais. O grande objetivo é maximizar o valor à produção, procurando canais e soluções com valor acrescentado.
As vendas para os mercados externos crescem consecutivamente desde 2010, ano em que a Portugal Fresh foi criada. Em 2022, atingimos o marco histórico dos 2000 milhões de euros de exportações; em 2023 este valor aumentou para os 2303 milhões de euros. Queremos aproveitar todo o potencial do nosso país, onde a produção de frutas, legumes e plantas ornamentais está avaliada em 5000 milhões de euros (dados de 2023).
O grande objetivo da Portugal Fresh é reforçar a competitividade das empresas. E a promoção feita de forma conjunta e estruturada tem trazido inúmeras vantagens, não só em termos de rentabilização de custos e recursos, mas também no que toca à visibilidade da presença de Portugal. Passam milhares de visitantes por estas feiras empresariais e é aqui que se reúnem os principais players mundiais.

Como trabalha a Portugal Fresh para a internacionalização do setor?
Para continuar a ajudar as empresas a crescer, a Portugal Fresh tem em curso um Projeto Conjunto de Internacionalização para 2023-2025, apoiado pelo Portugal 2030 – Programa Operacional Competitividade e Internacionalização, e que prevê um investimento global de 1.561.663,52€ euros, financiado em 48,8% pelo FEDER – Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional.
Além da presença na Fruit Logistica, em Berlim, na Fruit Attraction, em Madrid, e na IPM Essen, realizamos missões empresariais e ações de prospeção nos Estados Unidos, Chile, Índia e Polónia. Este ano, em Abril, participámos na 1ª edição da Fruit Attraction em São Paulo, no Brasil.
A nossa aposta é consolidar clientes nos mercados com maior volume de vendas, nos países onde o PIB per capita é mais elevado e também em cidades onde a presença da comunidade portuguesa é relevante. Abordamos ainda geografias com crescimento demográfico e com elevada concentração de consumidores, atrativas quer do ponto de vista logístico, quer económico. Países como o Luxemburgo, a Irlanda, a Suíça, o Qatar e a Noruega entram nas nossas prioridades devido ao PIB que apresentam. Já Nova Deli e Bombaim, na Índia, Tóquio, no Japão, Cidade do México, no México, e São Paulo, no Brasil, são atrativas pela demografia e logística.

As expectativas são de crescimento nas exportações mas para isso não chega a aposta em inovação e tecnologia. A disponibilidade de recursos hídricos é uma preocupação urgente?
Muito urgente. A evolução positiva das exportações precisa de ser acompanhada por investimentos concretos no acesso à água e na gestão dos recursos hídricos. Esta é a nossa principal batalha pois, sem uma gestão adequada da água, dificilmente conseguimos superar metas, crescer e ganhar maior competitividade. Temos vindo a defender, repetidamente, que é urgente avançar com a modernização da área de regadio existente para evitar perdas de água na distribuição antes de chegarem aos agricultores.
É urgente um plano estratégico nacional para a gestão deste tema. É urgente a criação de uma via verde para a construção de charcas e reservatórios de água e a construção de barragens para múltiplos fins. Este é um tema que continuará no topo das preocupações.

O que nos torna mais competitivos que outros países exportadores? De que forma os produtos deste setor se diferenciam?
Pela sua localização, Portugal possui um clima único na Europa e com forte influência do Atlântico. Esta diferenciação climática traz-nos, não só, qualidade e sabor, como nos permite produzir, por exemplo, framboesa na região do Sudoeste Alentejano durante as 52 semanas do ano. O clima ameno e mais estável ao longo do ano, com temperaturas não muito altas no verão e não muito baixas no inverno é uma grande vantagem competitiva. Permite-nos prolongar mais as campanhas. Ao mesmo tempo, também nos destacamos pela diversificação da oferta. Além dos pequenos frutos, distinguimo-nos na produção de tomate, citrinos, peras e maças, hortícolas, etc. A qualidade e o sabor são outros dois ingredientes fundamentais em que a produção nacional dá cartas.

Sobre o autorAna Rita Almeida

Ana Rita Almeida

Entrevista

“O e-commerce é uma realidade cuja posição pretendemos reforçar no imediato”

Pedro Subtil destaca o crescimento financeiro do Grupo os Mosqueteiros em Portugal e sublinha que estes resultados mostram um desempenho positivo, destacando-se a contínua expansão e o fortalecimento da presença no mercado português.

Em entrevista ao Hipersuper, o presidente do Grupo os Mosqueteiros em Portugal comenta os resultados de 2023, destacando um crescimento sólido com um volume de negócios de 2,9 mil milhões de euros, um aumento de 7,8% face ao ano anterior. O Grupo, que gerou mais de 350 novos postos de trabalho e inaugurou 10 novas lojas, totalizando 357 pontos de venda, reafirma o seu compromisso com a expansão no país. Pedro Subtil aborda também os desafios da estrutura de gestão descentralizada e os planos ambiciosos para 2024, incluindo a abertura de novas lojas e o reforço do comércio eletrónico.

Quais os principais resultados do Grupo os Mosqueteiros em Portugal em 2023? Como compara com os anos anteriores?
Em 2023, o Grupo os Mosqueteiros em Portugal obteve resultados significativos, registando um volume de negócios de 2,9 mil milhões de euros, o que representa um crescimento de 7,8% em comparação com 2022.
Além do crescimento financeiro, o Grupo inaugurou 10 novas lojas, totalizando 357 pontos de venda e criou mais de 350 novos postos de trabalho, fechando o ano com mais de 14 500 colaboradores. Estes resultados mostram um desempenho positivo, destacando-se a contínua expansão e o fortalecimento da presença no mercado português.

Quais foram os dados de crescimento para cada uma das insígnias – Intermarché, Bricomarché e Roady – em 2023? Destaca alguma?
Em 2023, o Intermarché cresceu 7,7%, atingindo um volume de negócios de 2,8 mil milhões de euros. O Bricomarché registou um crescimento de 7,3%, com um volume de negócios de 184 milhões de euros. A insígnia que se destacou particularmente foi a Roady, com um crescimento de 11%, alcançando um volume de negócios de 48 milhões de euros

A estrutura organizacional do Grupo os Mosqueteiros distingue-se no mercado. Quais são as principais vantagens e desafios deste modelo de gestão para o Intermarché em Portugal?
A estrutura organizacional do Grupo os Mosqueteiros distingue-se no mercado pela sua gestão global partilhada pelos proprietários das lojas, mais de 287 aderentes, que operam de forma independente. Este modelo de gestão oferece diversas vantagens e desafios para o Grupo em Portugal. As principais vantagens incluem a proximidade com as comunidades, onde os proprietários das lojas, sendo parte das comunidades locais, conseguem adaptar a oferta às necessidades específicas dos clientes, garantindo um serviço mais personalizado e próximo. Além disso, a autonomia e flexibilidade proporcionadas pela independência dos empresários permitem uma rápida adaptação às mudanças do mercado e uma gestão mais ágil, que pode responder eficazmente a desafios e oportunidades locais. Outra vantagem é o compromisso e envolvimento dos proprietários, que, sendo também gestores, têm um elevado nível de compromisso com o sucesso das suas lojas, resultando em melhor atendimento ao cliente e eficiência operacional.
Adicionalmente, o Grupo os Mosqueteiros está em contínuo desenvolvimento e sempre aberto a todos os que desejem investir no seu próprio negócio. Oferecemos a oportunidade para empreendedores se tornarem parte de uma rede sólida e bem-sucedida, beneficiando da notoriedade, apoio logístico e comercial de um grupo internacional. Esta estrutura permite que os empreendedores tenham o seu próprio negócio, integrando uma estrutura comum que facilita o crescimento e sucesso no competitivo mercado de retalho.

Houve mudanças nos canais de distribuição em 2023? Que papel desempenha o comércio eletrónico na estratégia do grupo?
O e-commerce é, sem dúvida, uma realidade cuja posição pretendemos reforçar no imediato. Sabemos o quanto o consumidor valoriza a conveniência, a poupança de tempo e a rapidez de compra e de entrega, se associarmos a isso a oferta qualitativa e de baixo preço do Intermarché teremos os drivers essenciais para continuar a desenvolver este canal com sucesso.
Em 2023 tivemos uma nova ferramenta a reforçar os nossos canais de distribuição através de uma parceria de sucesso com a Uber Eats.
Temos já um conjunto de cerca de 70 lojas podendo por agora chegar às 120. Disponibilizamos uma gama de cerca de 9500 referências e estimamos ficar próximos de duplicar o nosso volume de negócio face a 2023. São dados muito interessantes e embora ainda exista um longo caminho a percorrer é um exemplo de que estamos empenhados em introduzir este e outros serviços, para atingir o sucesso e a modernidade nos canais de distribuição da nossa insígnia.

Como avalia o impacto da situação económica atual em Portugal nas operações do grupo? Que medidas têm sido tomadas para mitigar esses impactos?
A situação económica atual em Portugal apresenta desafios significativos, especialmente para as famílias, e o Grupo os Mosqueteiros está plenamente consciente do impacto que isso tem nas suas operações. Para mitigar esses impactos, temos implementado várias estratégias e campanhas destinadas a defender o poder de compra dos consumidores, que é uma prioridade no nosso posicionamento.
Uma das principais medidas é o nosso “Compromisso”, que se foca em garantir preços acessíveis e justos, sem comprometer a qualidade dos produtos. Além disso, o grupo tem investido fortemente no desenvolvimento de produtos da marca própria Por Si, que oferecem uma excelente relação qualidade-preço e são uma alternativa competitiva para os consumidores que procuram poupar sem abdicar da qualidade.
Este enfoque na defesa do poder de compra dos consumidores está no ADN do Grupo os Mosqueteiros, desde sempre, pelo que continuamos comprometidos em apoiar as famílias portuguesas durante tempos económicos desafiantes, mantendo o nosso compromisso com a qualidade e a acessibilidade.

Quais os planos para 2024 quando falamos de abertura de lojas? Qual o investimento previsto?
Para 2024, o Grupo os Mosqueteiros tem um plano ambicioso que faz parte de uma estratégia de crescimento para os próximos anos. Estamos a planear abrir cerca de 15 novas lojas por ano, ao longo de cinco anos, o que resultará na criação de aproximadamente 3.000 postos de trabalho durante este período, ou seja, uma média de 500 novos empregos por ano. Este plano de expansão prevê um investimento na ordem dos 240 milhões para os próximos 5 anos.
Este investimento permitirá não apenas a expansão do nosso parque de lojas, mas também fomentará o empreendedorismo, ao recrutar novos aderentes que terão a oportunidade de criar o seu próprio negócio. Acreditamos que esta estratégia contribuirá significativamente para o desenvolvimento da economia local, enquanto dinamiza a nossa relação comercial com parceiros e fornecedores.

Como olha para a compra por parte da Auchan da totalidade da operação do Grupo Dia em Portugal? O Intermarché cai no ranking. Como olha para estes números?
A aquisição do Grupo Dia em Portugal pela Auchan, validada pela Autoridade da Concorrência, representa uma mudança significativa no panorama do retalho nacional. No entanto, no Intermarché, estamos confiantes na solidez da nossa estratégia de proximidade e na oferta de produtos de qualidade a preços acessíveis, o que nos permitirá continuar a fortalecer a nossa posição no mercado.
Desde a nossa chegada a Portugal em 1991, temo-nos focado em estar próximos dos nossos clientes, oferecendo uma experiência de compra diferenciada. A nossa presença de norte a sul do país, aliada à dedicação à sustentabilidade e à adaptação às especificidades de cada região, são pilares fundamentais que nos permitem manter a confiança dos nossos clientes. Mesmo com esta mudança, acreditamos que a nossa abordagem única continuará a ser uma escolha preferencial para muitos consumidores.

Apesar do crescimento, a verdade é que o Intermarché tem perdido quota de mercado. Qual a estratégia para combater esta perda?
Para enfrentar esta nova realidade competitiva, o Intermarché está a adotar várias estratégias, incluindo a expansão contínua da nossa rede de lojas. Desde o início do ano, já abrimos três novas lojas Intermarché.
Estamos a apostar também num novo conceito de loja, com um forte investimento no novo conceito “Feito Aqui”, com comida fresca e saudável preparada no local, com uma oferta de uma ampla variedade de receitas. A aposta no segmento de refeições de qualidade é complementada com a secção de “Pronto a Comer”, que disponibiliza uma seleção de produtos frescos e congelados, projetada para atender à crescente procura por opções rápidas e saudáveis. Outra característica distintiva deste novo conceito de loja são as novas secções que apresentam uma oferta exclusiva de queijos de corte, frutas e legumes, garrafeira refrigerada, refeições frescas e talho, proporcionando uma variedade de produtos que refletem as tradições culinárias locais e internacionais.
Estamos também a investir em inovação e tecnologia para melhorar a experiência de compra dos nossos clientes, além de reforçar o nosso compromisso com práticas sustentáveis e responsabilidade social. Acreditamos que estas iniciativas, juntamente com o nosso foco na qualidade dos produtos e no serviço ao cliente, nos permitirão manter uma posição sólida entre os líderes do mercado e continuar a crescer de forma significativa em Portugal.

O Intermarché valoriza as comunidades locais onde cada loja está inserida. Como é que o Intermarché garante a valorização, por exemplo, dos mercados de proximidade?
O Intermarché valoriza as comunidades locais onde cada loja está inserida, e esforça-se para se adaptar às necessidades específicas dessas comunidades de diversas formas. Um dos principais exemplos é o nosso apoio contínuo a associações e coletividades locais. Ao colaborar com estas organizações, conseguimos responder a necessidades específicas e contribuir para o bem-estar social e cultural das áreas em que operamos.
Além disso, valorizamos também os produtores locais através do nosso “Programa Origens”, que promove e integra produtos nacionais nas nossas lojas. Este programa permite que os clientes tenham acesso a produtos frescos e autênticos, diretamente dos produtores locais, enquanto ajuda a fortalecer a economia local.

Qual o balanço quando falamos de novas lojas? Quais são os planos de expansão do grupo para 2024? Estão previstas novas aberturas de lojas?
O balanço em termos de novas lojas tem sido positivo, alinhado com o nosso plano de crescimento. Temos um business plan que projeta a abertura de cerca de 15 lojas por ano ao longo de cinco anos, abrangendo as três insígnias do grupo: Intermarché, BricoMarché e Roady. Este plano de expansão está em plena execução, refletindo o nosso compromisso com o crescimento e a consolidação da nossa presença em Portugal.
Para 2024, mantemos a nossa estratégia de expansão, com um investimento anual entre 17 e 20 milhões de euros, destinados à abertura de novas lojas, valores que fazem parte de um plano mais amplo de investimento de 240 milhões de euros ao longo de cinco anos, que permitirá reforçar a nossa rede e criar novas oportunidades de emprego e negócios em diversas regiões. Estamos empenhados em continuar a crescer de forma sustentável e a fortalecer o nosso impacto económico e social nas comunidades onde operamos.

A inovação é um fator de diferenciação. Como trabalham este eixo para se distinguirem no mercado português?
A inovação é, de facto, um dos pilares fundamentais que nos permite distinguir no mercado português. No Intermarché, trabalhamos constantemente para introduzir novos conceitos e produtos que atendam às necessidades em evolução dos nossos clientes e nos permitam destacar da concorrência.
Uma das formas como incorporamos a inovação é através do desenvolvimento de novos conceitos de loja que melhoram a experiência de compra dos nossos clientes. Estas inovações incluem o design moderno das lojas, a introdução de serviços como o self check-out para tornar o processo de compra mais eficiente e rápido, e as novas secções que apresentam uma oferta exclusiva de queijos de corte, frutas e legumes, garrafeira refrigerada, refeições frescas e talho, proporcionando uma variedade de produtos que refletem as tradições culinárias locais e internacionais.
Além disso, os novos produtos “Por Si” reflete também o nosso compromisso com a inovação. Esta gama de produtos é cuidadosamente desenvolvida para oferecer qualidade e valor, adaptando-se às tendências de consumo e preferências dos clientes. Estamos sempre atentos às mudanças no mercado e às expectativas dos consumidores, o que nos permite introduzir produtos que não só satisfazem as suas necessidades, mas também lhes oferecem novas experiências.
Ao focarmo-nos na inovação contínua, garantimos que o Intermarché permanece na vanguarda do setor de retalho em Portugal, proporcionando aos nossos clientes soluções que realmente fazem a diferença nas suas vidas diárias.

Gostava de falar mais dos produtos PorSi. Qual o peso de vendas desta marca? Representa um aumento?
Os produtos da marca PorSi têm tido um impacto significativo nas vendas do Grupo os Mosqueteiros. Em 2023, a marca PorSi atingiu um volume de negócios de 395 milhões de euros, o que representa uma progressão de 18,05% em relação ao ano anterior. Este aumento demonstra a crescente popularidade e aceitação dos produtos da marca entre os consumidores, que valorizam a combinação de qualidade e preço acessível que a marca oferece.
A marca PorSi tem-se destacado ao proporcionar uma vasta gama de produtos que se alinham com as necessidades e preferências dos nossos clientes. Este crescimento contínuo reforça o nosso compromisso em expandir e melhorar a oferta de produtos, garantindo que continuamos a satisfazer as expectativas dos consumidores e a consolidar a nossa posição no mercado.

Os planos passam por aumentar esta oferta? Quais os segmentos? Alternativas saudáveis, por exemplo?
Sim, os nossos planos incluem expandir a nossa oferta, especialmente em segmentos que refletem as tendências atuais de consumo, como as alternativas saudáveis. Estamos comprometidos em oferecer uma variedade ainda maior de produtos que atendam às crescentes preocupações dos consumidores com a saúde e o bem-estar.
Uma parte importante desta estratégia é o desenvolvimento e expansão das nossas gamas “Por Si Viva Bem” e “Por Si Bio”. A linha “Por Si Viva Bem” é focada em proporcionar opções alimentares que promovem um estilo de vida saudável, incluindo produtos com menos açúcar, menos gordura e ingredientes mais naturais. Esta gama é ideal para consumidores que procuram melhorar a sua alimentação sem abdicar do sabor e da conveniência.
Por outro lado, a linha “Por Si Bio” é composta por produtos biológicos que atendem aos padrões de produção sustentável e ecológica. Esta gama é direcionada para consumidores que valorizam produtos naturais e ambientalmente responsáveis.
Ao aumentar a nossa oferta nestes segmentos, estamos a responder aos interesses dos nossos clientes, oferecendo-lhes escolhas que se alinham com os seus valores e estilos de vida. Este foco em alternativas saudáveis reflete o nosso compromisso em promover o bem-estar dos nossos clientes e em adaptar-nos às tendências de mercado em constante mudança.

Uma marca que tem sido premiada com prémios como, por exemplo, o Sabor do Ano. Como olham para este reconhecimento?
Para nós, Intermarché, receber prémios como o “Sabor do Ano” é uma validação importante do nosso compromisso com a qualidade e a satisfação dos nossos consumidores. Este tipo de reconhecimento reforça a nossa dedicação em manter elevados padrões de excelência em todas as etapas, desde a seleção de produtos até à experiência final do cliente. Vemos estas distinções como uma motivação adicional para continuar a melhorar e inovar, garantindo que os nossos produtos não só atendem, mas superam as expectativas dos nossos clientes.
Estes prémios também refletem o esforço e a paixão da nossa equipa, que trabalha incansavelmente para assegurar que cada produto cumpre os mais altos padrões de qualidade e sabor. Continuaremos a investir em qualidade, inovação e sustentabilidade, pois acreditamos que estes são os pilares essenciais para manter e expandir o nosso sucesso no mercado.

E a marca de vinhos Seleção de Enófilos que conheceu um novo conceito em 2023. Qual o balanço? Foi uma aposta vencedora?
De facto, a nossa marca Seleção de Enófilos apresenta-se rejuvenescida desde o início de 2023, mas mais do que isso a marca tem-se reforçado em gama com uma oferta de regiões demarcadas e monocastas de elevada qualidade.
Tem sido uma aposta ganha, sem dúvida, numa altura em verificamos uma estabilidade das vendas na categoria dos vinhos no mercado, as nossas lojas apresentam o crescimento acima dos 10% em YTD na nossa marca Seleção de Enófilos, o que é bastante significativo e demonstrativo da qualidade dos nossos vinhos.

A aposta na marca própria retira espaço nas prateleiras para marcas de fabricante? Qual a estratégia?
A nossa estratégia no Intermarché é encontrar um equilíbrio entre os produtos de marca própria e as marcas de fabricante, garantindo que oferecemos uma seleção diversificada que se ajusta às necessidades dos nossos clientes. A aposta em produtos de marca própria não visa retirar espaço às marcas de fabricante, mas sim complementar a oferta, proporcionando opções de qualidade a preços competitivos.
A nossa marca própria é desenvolvida com o objetivo de oferecer alternativas que garantam valor e qualidade, atendendo às expectativas dos consumidores que procuram produtos acessíveis sem comprometer os padrões. No entanto, reconhecemos que muitos clientes têm preferências específicas por certas marcas de fabricante, pelo que continuamos a dar-lhes um espaço importante nas nossas prateleiras.
Ao manter este equilíbrio, conseguimos responder de forma eficaz às diferentes expectativas e necessidades dos consumidores, assegurando que todos encontram o que procuram nas nossas lojas. Esta abordagem permite-nos oferecer uma experiência de compra completa, que combina variedade, qualidade e valor.

Que ações de responsabilidade social o grupo desenvolveu em 2023? Quais são os planos para 2024 nesta área?
Em 2023, desenvolvemos várias ações de responsabilidade social no Grupo os Mosqueteiros, focadas principalmente em apoiar a comunidade local, promover a sustentabilidade e criar impacto positivo nas regiões onde operamos. Em 2023, contámos com mais de 3 milhões de euros em donativos nos mais de 362 pontos de venda das nossas três insígnias e nas estruturas centrais, no seguimento do nosso compromisso contínuo para com as comunidades.
As nossas iniciativas contribuíram também para a criação de emprego, apoio à produção nacional e colaboração com instituições locais para dinamizar o tecido económico e social. Trabalhámos para garantir práticas sustentáveis em todas as nossas operações, assegurando um equilíbrio entre o desenvolvimento económico e a preservação ambiental.
Para 2024, pretendemos intensificar os nossos esforços na área da responsabilidade social, continuando a apoiar causas locais e expandindo as nossas iniciativas de sustentabilidade. O nosso compromisso é contribuir ainda mais para o desenvolvimento económico das regiões onde estamos presentes, sempre com um enfoque no bem-estar social e na preservação ambiental.

Hoje investir nos colaboradores é cada vez mais valorizado. Como trabalham este eixo? Existem programas de formação ou outras iniciativas de desenvolvimento de recursos humanos por exemplo?
Valorizamos o investimento nos nossos colaboradores e acreditamos que isso é essencial para o sucesso a longo prazo. Trabalhamos este eixo através de várias iniciativas focadas em proporcionar uma qualidade de vida no trabalho otimizada, com benefícios centrados em três pilares: bem-estar do colaborador, família e saúde.
Oferecemos uma variedade de programas de formação em várias áreas, permitindo que os nossos colaboradores desenvolvam novas competências e cresçam profissionalmente. Acreditamos que a formação contínua é fundamental para preparar os nossos colaboradores para os desafios futuros e garantir um crescimento sustentável do grupo. Em 2023, o Grupo os Mosqueteiros reforçou o seu compromisso com o desenvolvimento dos recursos humanos através de um protocolo de formação com o CECOA, destinado a fortalecer as competências dos colaboradores e melhorar a sua competitividade.
Além disso, introduzimos benefícios como dias de férias suplementares, reconhecendo a importância do descanso e da recuperação para a produtividade e satisfação no trabalho. Também oferecemos a possibilidade de teletrabalho, permitindo que os colaboradores conciliem melhor a vida pessoal e profissional, e proporcionamos acesso a seguros de saúde, assegurando o bem-estar físico e mental dos nossos colaboradores. Com estas e outras iniciativas, o Grupo os Mosqueteiros reforça o seu compromisso com a qualidade de vida no trabalho, garantindo que os colaboradores se sintam valorizados e motivados.

Mais de 100 lojas do Grupo os Mosqueteiros receberam o selo PME Líder. Qual o real significado desta distinção?
Este reconhecimento destaca o mérito e desempenho excecionais das nossas lojas. O selo PME Líder reconhece a excelência operacional e a robustez financeira, bem como as estratégias de crescimento sólidas que implementamos, que nos permitem enfrentar e responder eficazmente às exigências do mercado. Este reconhecimento reforça a confiança do mercado nas nossas empresas, aumentando a nossa reputação e credibilidade junto de clientes e parceiros, abrindo portas a novas oportunidades de negócio e melhores condições de negociação.
Além disso, o selo sublinha o nosso compromisso com a sustentabilidade, inovação e qualidade na gestão, espelhando o impacto positivo que temos na economia local através da criação de emprego e apoio à produção nacional e instituições locais. Trabalhamos diariamente para garantir que as nossas lojas dinamizem o tecido económico e social nas comunidades onde operamos.
Esta distinção serve de incentivo para continuarmos a elevar os padrões de excelência que nos caracterizam, sempre com o objetivo de superar as expectativas dos nossos clientes e contribuir para o desenvolvimento económico das comunidades onde estamos presentes.

Qual é a sua visão para o futuro do Grupo os Mosqueteiros em Portugal? Onde vê o Grupo, por exemplo, daqui a cinco anos?
A nossa visão para o futuro do Grupo os Mosqueteiros em Portugal é continuar a fortalecer a nossa presença no país, mantendo sempre o ADN que nos caracteriza. Planeamos investir significativamente tanto a nível nacional como regional, com a abertura de cerca de 80 novas lojas nos próximos anos, o que contribuirá para o desenvolvimento económico local.
Ao expandir a nossa rede de lojas, não só criaremos novos postos de trabalho para colaboradores, mas também ofereceremos oportunidades para empresários que queiram aderir ao nosso grupo e abrir o seu próprio negócio. Este crescimento permitirá criar valor não apenas para a empresa, mas também para o país e para as pessoas, incluindo colaboradores, clientes e empresários.
O nosso objetivo é continuar a apoiar as comunidades locais, promovendo parcerias que incentivem o consumo de produtos regionais e ajudem a dinamizar as economias locais. Daqui a cinco anos, vejo o Grupo os Mosqueteiros como um líder ainda mais consolidado no mercado português, reconhecido pelo seu compromisso com a qualidade, inovação e responsabilidade social, sempre focado em criar valor para todos os que interagem connosco.

 

Sobre o autorAna Rita Almeida

Ana Rita Almeida

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