“Marcas precisam ter base comercial em Portugal para ganharem credibilidade”
As marcas confrontam-se todos os dias com desafios relacionados com a protecção das propriedades industrial e intelectual dos produtos. Mas, num momento em que a Europa pretende criar um mercado digital único, torna-se mais difícil lidar com falsificações e impõe-se a necessidade de uma “cultura de marca”
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As marcas confrontam-se todos os dias com desafios relacionados com a protecção das propriedades industrial e intelectual dos produtos. Mas, num momento em que a Europa pretende criar um mercado digital único, torna-se mais difícil lidar com falsificações e impõe-se a necessidade de uma “cultura de marca”.
João Paulo Girbal foi reeleito à frente da Centromarca. O seu terceiro mandato é dedicado ao tema “Ganhar Marca”. Em entrevista ao HIPERSUPERTV, o Presidente explica por que é importante a criação de uma cultura de marca em Portugal. Os desafios que as marcas enfrentam variam consoante os ambientes concorrenciais que se vivem em cada mercado, nacional ou internacional. “Esses ambientes são menos ou mais fortes consoante a concentração de quem compra, ou seja, a distribuição, ou conforme a atuação vigilante ou não das autoridades competentes”.
Marcas são repositórios de confiança
O “sonho” da Centromarca passa por criar ou contribuir para uma cultura de marca em Portugal. Mas afinal para que serve tal cultura?
Segundo João Girbal, as marcas são sinónimo de confiança para os consumidores. “Sabemos que qualquer área onde se aplicam marcas, sejam produtos de grande consumo, que se adquirem nos supermercados ou mercearia, quer sejam produtos de têxtil, vestuário, calçado, ou até marcas de telefones, computadores, são repositórios de confiança. Os consumidores identificam-se com as marcas e estão dispostos a comprá-las porque acreditam que lhes trazem algo, que muitas vezes pode não ser uma mais-valia física. Como por exemplo no caso das marcas de água mineral – há dezenas delas e dificilmente os consumidores conseguem distinguir as diferenças quanto à constituição de cada uma, mas sabem que se consumir uma determinada marca associa-se a uma imagem, qualidade e garantia, de acordo com a sua preferência”. Os consumidores “estão disponíveis para votar [no melhor produto das diferentes marcas] com a sua carteira, desde que os produtos se possam apresentar no mercado de uma forma leal”, sem discriminações de preços entre produtos iguais, que não dê margem de lucro nem de espaço para a concorrência.
Esta atitude por parte do público “tem demorado muito a acontecer mas temos conseguido resultados muito positivos. Por exemplo, as pessoas sabem e identificam quando acontece a contrafação, quando um produto diz que é o que não é”. No entanto, quando se tratam de produtos que fazem alusão a outros e ganham em vendas por isso, os consumidores portugueses ainda não conseguem reconhecer a falta de valor. “Numa nuance mais detalhada, as cópias parasitárias, os ‘looks alikes’, isto é, os produtos que se assemelham ou lembram características de outros, com nomes muito parecidos com o original ou com uma apresentação gráfica que faz suscitar a dúvida, o cliente compra mas chega a casa e repara que não era o produto da marca que queria. Este tema é ainda muito pouco trabalhado em Portugal e para termos uma cultura de marca a funcionar no País temos que impor o respeito por aquilo que é propriedade das marcas”.
Ambiente concorrencial em Portugal
Ao nível do quadro regulamentar, o mercado português tem “evoluído bastante nos últimos anos”, considera o responsável que, no entanto, aponta “aspetos a melhorar”.
O quadro regulamentar permanecia inalterado há décadas até à recente publicação do decreto-lei 166, que diz respeito às Práticas Individuais Restritivas do Comércio (PIRC), também chamada de lei do comércio. “De facto precisava de ser atualizada e de uma forma geral o efeito foi positivo mas há aspectos a melhorar, nomeadamente, tudo o que tem haver com a fiscalização. O quadro legal foi aprovado mas depois é preciso haver uma atuação para se tornar uma realidade. Essa atuação começou a dar os primeiros passos há pouco tempo e esperemos que continuem”.
A lei mudou mas o responsável considera que, enquanto a mudança não acontecia, os ‘players’ que funcionam no mercado foram sofrendo grandes alterações. “Ao longo das últimas décadas observamos uma concentração da distribuição em Portugal, aumentando o poder negocial relativamente aos seus fornecedores com as consequências que isso implica”. Mais do que uma questão legal, na relação entre distribuição e produção, tanto primária como transformadora, “há aspetos que têm que ser consensuais, de caráter voluntário e isto está a ser trabalhado dentro da PARCA”, grupo criado pelo Governo para trabalhar um código de boas práticas, com intervenientes ao nível da produção primária, transformação e revenda, além das autoridades. “Espero que em breve dê resultados. Temos as empresas produtoras, as revendedoras, toda a indústria de comunicação, que divulgam e também contribuem para a informação e edução dos consumidores. Enfim, uma série de profissionais, técnicos e especialistas, cientistas e advogados de patentes, que trabalham este tema das marcas e de alguma forma estão empenhados que a cultura de marca aconteça em Portugal”.
Chamar o produto pelo nome
As marcas proporcionam a quem as trabalha emprego e sustentabilidade. “Imagine-se uma empresa portuguesa que exporta um determinado produto. Se não tiver uma marca forte para esse artigo, uma outra empresa de outro mercado, com condições de produção diferentes, com menos custos e onde não há tanta legislação laboral, de proteção ambiental ou fiscal, pode substituir esse fabricante com um produto igual. No passado, Portugal era conhecido por ter uma indústria têxtil de qualidade e por produzir sapatos de qualidade mas para outras marcas que não portuguesas. Quando houve a liberalização do comércio, mais concretamente na China, as marcas que compravam produtos físicos portugueses substituíram os nossos por produtos feitos em geografias mais baratas”. Nesta altura, “assistimos ao elevado desemprego na indústria têxtil, agora a recuperar extamente por causa do esforço das marcas desta área. No calçado acontece a mesma coisa”, explica o Presidente da Centromarca.
É importante elevar o nome de uma marca para que soe a qualidade e confiança, em qualquer parte do mundo, emprestando credibilidade às restantes marcas fabricadas no mesmo país. “Os exemplos mais conhecidos talvez sejam na área dos computadores. As pessoas querem um iPhone ou um Samsung Galaxy, especificamente. Quando os consumidores pedem um produto pelo seu nome é muito mais difícil substituir esse produto por outro que venha de outro lado”. Apesar de “já se ter percorrido um grande caminho, ainda há muito a fazer até podermos dizer que somos um país de marcas fortes, reconhecidas a nível mundial e que emprestam credibilidade à marca Portugal”, defende, acrescentando que este processo dá sustentabilidade às exportações, garante emprego de qualidade, investigação e desenvolvimento, que se traduz depois em impostos e em mais valias para o País”.
A cultura de marca passa também por criar um mercado de referência para que os produtos sobrevivam nos mercados exteriores. “Dizia-se muito que Portugal tinha que produzir bens transaccionáveis, que se possam vender aqui e lá fora mas se não tiverem uma referência, como estarem associadas a uma grande multinacional, precisam de um mercado de referência. É preciso haver uma base comercial em Portugal para solidificarem e terem ambição, senão dificilmente avançam”.
Startups beneficiam com cultura de marca
Há outros aspectos que beneficiam com o surgimento de uma cultura de marca. “Por exemplo, estas iniciativas à volta do empreendedorismo, as startups que estão a aparecer pelo país todo e não se limitam apenas a Lisboa e Porto. Estão aparecer iniciativas que promovem novas empresas, que tenham vocações mundiais, ambições globais e desde o principio que têm toda a vantagem em nascer como marcas”.
Com a deflação acentuada nos últimos anos, as empresas centraram-se muito na comunicação promocional para aumentar receitas e deixaram de lado a inovação. Apesar de já se notar um inversão da situação, mais por causa das novas empresas criadas, há muitas com dificuldades em saírem do ciclo vicioso das promoções. “Há empresas mais fortes que começaram a apostar em inovação mais rapidamente que as outras. Estas, pela sua natureza, têm a marca no centro da preocupação e começaram mais cedo do que as outras. Depois há aquelas que vão nascendo e querem fazer as coisas bem de raiz e há também muitos milhares de empresas aflitas porque têm de pensar como vão pagar salários aumentar as vendas para crescer e cumprir planos”.
Desde há quatro anos que o volume comprado pelos lares portugueses nos bens de consumo está em redução constante. O retalho alimentar fechou 2014 com uma quebra de 1,2% no volume de negócios em parte devido à deflação. As empresas “sem passado”, nascem já cientes de que o espaço de negócio com mais oportunidades, actualmente, está no mercado digital.
Aumentar a confiança no online
João Girbal acredita que o comércio electrónico representa uma grande revolução para o setor, sendo que no futuro a maior parte dos obstáculos vão desaparecer. “Em Portugal ainda não se compra de tudo, compra-se muito filmes, musica, computadores. A estatística que vi recentemente era que o comércio electrónico ainda representava uma pequena percentagem das vendas de um grande operador, dos mais ativos e Portugal nessa área”.
Como em Portugal ainda se verifica um nível de confiança muito ténue por parte dos consumidores no que diz respeito ao consumo online, é importante investir em informação, já que, neste canal, o cliente compra a marca que conhece. “Um dos aspectos fundamentais é aumentar a confiança dos consumidores nas compras online e uma forma de o fazer é também através de uma cultura de marca, porque no online as pessoas vão comprar as marcas que conhecem”.
No entanto, sublinha que muita da insegurança demonstrada pelos portugueses pelo mais recente canal de comércio é derivada da informação errada que as marcas muitas vezes transmitem, dando a ideia errada ao consumidor. “Temos que garantir informação correta aos consumidores, o que não acontecem muito, têm que corresponder às expectativas do consumidor e dar oportunidades de devolução. Tem que se perder o medo de fazer isto. Sabemos o produto que queremos e não faz sentido deslocarmo-nos para obtê-lo, gastar gasolina e tempo. Termos transporte individual mas é natural que o seu custo suba nos próximos anos e o que faria sentido era que os produtos ‘commodities’ aparecessem em casa quase de uma forma automática, através de um processo mais eficaz, transparente e capilar. As lojas físicas, por outro lado, “terão um formato completamente diferente do que são hoje. Por que hoje há prateleiras com muitos produtos disponíveis, que percorremos para comprarmos uma ínfima coisa. Na internet, não temos essa limitação do espaço físico. O espaço electrónico vai se impor em menos uma geração”, conclui.