Carlos Neves, Presidente da APROLEP
Transformar o leite para concorrer num mercado imprevisível
“Em Portugal, é imperativo reduzir a importação de produtos de valor acrescentado”. Quem o diz é Carlos Neves, Presidente da Associação de Produtores de Leite de Portugal, que revelou ao HIPERSUPER as preocupações da fileira de leite português
Ana Catarina Monteiro
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O fim das quotas leiteiras na União Europeia foi anunciado para Abril do próximo ano. A indústria portuguesa corre o risco de oportunismo na importação de excedentes no mercado europeu.
Carlos Neves, Presidente da Associação de Produtores de Leite de Portugal, revelou em entrevista ao HIPERSUPER as preocupações da fileira de leite português.
Que efeitos terá o fim das quotas leiteiras para o sector, na Europa e, concretamente, em Portugal?
O fim das quotas vai provocar maior instabilidade na evolução dos preços e da quantidade produzida, com ciclos mais curtos e imprevisíveis. A longo prazo, dentro de dez anos, as perspectivas da União Europeia para o mercado mundial de lácteos são optimistas. Espera-se um aumento gradual do consumo nos países emergentes. No entanto, podem surgir imprevistos, como o actual embargo da Rússia que agravou um ano já complicado. Para os próximos meses estou muito apreensivo, sobretudo por causa do embargo russo. Há o risco de oportunismo na importação de excedentes do mercado europeu.
Quando se começarão a sentir esses efeitos?
Os produtores sentem mais rapidamente o efeito. Quanto ao consumo, não consigo avaliar mas, sem dúvida que uma variação de cinco cêntimos, por litro de leite, afecta menos o consumidor que o produtor. Esses cêntimos em milhares de litros podem fazer a diferença entre sobreviver ou fechar a produção.
Historicamente, o preço do leite para o consumidor português é dos mais baixos da Europa e não prevejo que isso se altere nos próximos tempos. Compreendo que isso esteja ligado ao baixo rendimento dos portugueses mas torna-se complicado para o agricultor, uma vez que, produzir um litro de leite em Portugal ou na Alemanha custa quase o mesmo. Temos a mão-de-obra mais barata, mas gastamos mais com a rega e o cultivo de terrenos mais pequenos e repartidos.
Como é que os produtores se estão a preparar para os desafios que se avizinham?
Os produtores de leite tem vindo a investir para serem mais eficientes e responderem às exigências ambientais, de bem-estar animal e de segurança alimentar, impostas pela União Europeia. O leite é um dos alimentos mais analisados e os resultados das análises ao leite português provam a sua excelente qualidade.
Da parte da produção, temos de obter mais e melhores forragens nos campos para alimentarmos os animais, reduzindo os custos com importação de matérias-primas, como cereais e soja, para o fabrico de rações. Depois, estamos também dependentes da capacidade da indústria valorizar o leite através do fabrico de queijos e iogurtes, produtos em que há muita importação. Estamos igualmente dependentes das opções da distribuição. Se houver importações maciças para usar o leite em promoções para atrair os consumidores, veremos o nosso produto desvalorizado. Nesta situação, o país perde com a saída de dinheiro e aumento do défice comercial.
Qual a actual produção nacional de leite? Portugal é auto-suficiente?
Produzimos cerca de 1.800.000 toneladas de leite em Portugal e somos quase auto-suficientes. Tivemos um auto-aprovisionamento de 94%, em 2013, em leite e produtos lácteos. No caso do leite para consumo produzimos 108% das necessidades.
E no campo das exportações, qual o saldo da balança comercial?
O saldo da balança comercial é negativo, cerca de 200 milhões de euros, porque exportamos leite cru ou leite UHT a baixo preço e importamos essencialmente queijo e iogurtes com maior valor acrescentado. Inverter esta situação dependerá das opções de indústria e distribuição.
Quais os mercados com mais peso em termos de exportações?
Os produtores de leite vendem leite cru a intermediários ou indústrias nacionais, privadas ou cooperativas. Há alguma venda de leite cru para Espanha mas é pouco significativa. Só depois de transformado o leite é que as indústrias exportam, sobretudo para Espanha. Sabemos que tem surgido também oportunidade de negócio para o Norte de África, para os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa e outros países.
Em que devem apostar os produtores e distribuidores do leite para valorizar este alimento?
Penso que devemos manter a qualidade, controlar custos, inovar nos produtos e fidelizar o consumidor que prefere o que é produto nacional.
Que grandes desafios enfrentam os produtores portugueses a prazo?
Produzir leite num mercado imprevisível, concorrendo no mercado europeu com agricultores que historicamente recebem mais ajudas da PAC (Política Agrícola Comum da União Europeia) e tem menores custos de produção por causa do clima, do solo e da dimensão dos terrenos.
Temos de manter o foco na segurança alimentar, no respeito pelo ambiente e pelo bem-estar animal e não podemos abrir as fronteiras da Europa a produtos de países que não seguem os nossos padrões de exigência. Temos de ser capazes de reforçar a cooperação em organizações de produtores e cooperativas, de modo a partilhar os bons e maus momentos ao longo da cadeia de produção, indústria e distribuição.