O ABC da Concorrência, por José Antonio Rosseau (2ª parte)
Não perca a II parte da rubrica “ADN da Distribuição” deste mês, sobre um tema mais do que nunca na ordem do dia: a concorrência
José António Rousseau
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7º Gene – CONCORRÊNCIA (2ª parte)
Nos últimos anos temos assistido a uma verdadeira revolução na indústria da grande distribuição alimentar que tem no aprofundar da internacionalização o seu próximo episódio. A grande escala a que operam os grandes retalhistas, possível mediante a introdução de tecnologias de ponta na gestão logística permitiu a obtenção de ganhos de eficiência. Regra geral, estas alterações alteraram de forma positiva a forma como os consumidores se relacionam com o comércio a retalho. A possibilidade de efectuar acções de one-stop-shopping, com disponibilidade de uma oferta de produtos bastante alargada e a preços potencialmente mais reduzidos, são benefícios assinaláveis.
O peso crescente das grandes cadeias de distribuição é acompanhado por um aumento bastante significativo do seu poder de mercado perante os fornecedores. De facto, as relações comerciais nos mercados de aprovisionamento, agora caracterizadas por níveis de dependência económica bastante elevada por parte de alguns fornecedores, são uma característica desta nova realidade.
Contudo, o facto do poder de compra estar no actual contexto do mercado da grande distribuição, cada vez mais associado a poder de compra nos mercados a jusante, através da vantagem comparativa que os grandes retalhistas conseguem obter pela negociação de condições de compra mais vantajosas junto dos fornecedores e as possíveis consequências no nível de eficiência e equidade da afectação do mercado, tem suscitado um debate em torno do papel da politica de concorrência neste contexto.
Poder de compra
De facto, no contexto das relações concorrenciais entre distribuidores e fornecedores, o exercício de poder de compra é o resultado da capacidade de alguns retalhistas obterem dos fornecedores termos de troca mais favoráveis do que aqueles disponíveis a outros, ou que seriam expectáveis em condições normais de mercado um mercado concorrencial, incluindo-se aqui não só os descontos, mas toda uma série de obrigações contratuais que podem ser encaradas como restrições verticais, impostas pelos retalhistas aos fornecedores.
Tais restrições podem traduzir-se, por exemplo, na selecção de fornecedores e custos de entrada por via do referenciamento e entrada em linha de produtos; na locação de espaço na prateleira, níveis de exposição ou topos de gôndola; na exigência de descontos retroactivos sobre transacções já efectuadas; em cláusulas de cliente mais favorecido que impossibilita o fornecedor de vender a qualquer outro retalhista a um preço mais baixo; em contribuições para despesas de promoção não justificadas; na imposição de rappel incondicional sem correspondência com o volume de vendas anual; na imposição ou dilatação de prazos de pagamento com ameaça de desreferenciamento;
O poder de compra, se associado à capacidade de exploração de poder de mercado a jusante, pode ser prejudicial se colocar em causa a viabilidade dos fornecedores e/ou a sua disponibilidade para investirem em novos processos e produtos. De facto, o acréscimo de poder de compra tem como situação limite, a sobrevivência apenas das marcas absolutas e relativas, sendo que as marcas transparentes, isto é, todos as demais marcas cuja percepção e reconhecimento para o consumidor é fraca ou até inexistente, tenderão a ser ver as suas margens reduzidas e eventualmente a serem substituídos por produtos de marca própria.
Apesar do exercício do poder de compra poder afectar negativamente tanto os mercados a jusante como a montante, do ponto de vista das regras de concorrência é difícil ignorar que podem existir ganhos económicos importantes. Sob certas condições que já referi, a obtenção de melhores termos de troca nos mercados de aprovisionamento podem ser passados aos consumidores, traduzindo-se em preços mais baixos para estes.
Relações comerciais
As relações comerciais entre retalhistas e fornecedores obedecem ao modelo comum de contratos de compra e venda de bens e/ou serviços, estabelecido ao abrigo de um enquadramento legal de direito privado civil e comercial, pelo que a iniciativa para a contratação tanto poderá surgir da parte dos fornecedores como dos distribuidores.
Para formalização dessas relações comerciais utiliza-se um documento formal, designado por contrato comercial ou acordo geral de fornecimento, aplicável a qualquer transacção com qualquer fornecedor ou para qualquer produto a fornecer, sendo a sua estrutura geralmente, constituída por duas partes: condições gerais e condições específicas.
A primeira parte, sob a designação de condições gerais, caracteriza-se por prever os termos e as condições nucleares no âmbito das quais a relação comercial entre as partes se vai estabelecer e, não sendo objecto de negociação mas meramente de aceitação/adesão pelo fornecedor, é universalmente aplicável a qualquer fornecedor ou a qualquer produto objecto de transacção. Por sua vez, a parte das condições específicas, caracteriza-se por revestir a forma de formulário, apenas sujeito ao preenchimento das rubricas relevantes para efeitos da transacção em causa.
Do conteúdo deste documento podemos identificar quatro áreas de grande sensibilidade, nomeadamente, a imposição unilateral de condições através de uma componente tipo contrato de adesão; descontos e outras contrapartidas; penalizações e prazos de pagamento.
Quanto à primeira área, a definição prévia das condições gerais pelo distribuidor conferem uma natureza de contrato de adesão nos termos do qual o fornecedor aceita sem discussão tais condições ou não faz contrato.
A área das Penalizações, na medida em que é unilateral e aplicável apenas aos fornecedores, faz pressupor a existência de um desequilíbrio contratual entre distribuidores e fornecedores, no âmbito das respectivas relações comerciais.
Quanto à sua natureza, a penalização poderá ser, ou não, pecuniária, sendo paga neste caso, mediante emissão de nota de débito a ser repercutida na factura seguinte, sendo diversas as situações contratualmente previstas que, com maior frequência, dão lugar a penalizações, tais como, a não entrega, total ou parcial, da encomenda; o atraso, em termos de dias ou de horas, na entrega e a menor qualidade ou falta de qualidade da encomenda ou de parte desta.
Por fim, a área dos prazos de pagamento apresenta dois tipos de problemas: a imposição contratual, por parte dos distribuidores, de prazos muito longos, sobretudo, para o caso de produtos com prazos de validade limitados e os atrasos no pagamento por via de mora ou mesmo de incumprimento contratual.
Tudo isto é natural e legal. Tudo isto não é novo nem diferente do que sempre foi nas últimas décadas. Tudo isto irá continuar a acontecer nas relações comerciais entre produtores e distribuidores. Mas tudo isto pode e deve também evoluir positivamente através de um acentuar das relações de interacção e colaboração entre produtores e distribuidores, de formas de trabalho conjuntas (cooptição)com o objectivo de prestarem mais e melhores serviços aos consumidores.
Leia AQUI a primeira parte da rubrica “ADN da Distribuição” que este mês é sobre concorrência.
José António Rousseau
Consultor e docente no IADE/IPAM
www.rousseau.com.pt