O ABC da Concorrência, por José Antonio Rosseau
A rubrica “ADN da Distribuição” deste mês é sobre um tema mais do que nunca na ordem do dia: a concorrência.
José António Rousseau
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7º Gene da Distribuição: CONCORRÊNCIA
(1ª parte)
Concorrência é um conceito maldito. Mal-amado por uns, por outros idolatrado. Aceite no plano dos princípios, frequentemente contestado na sua aplicação prática.
Tantas vezes pronunciado em vão ou sem razão quando se qualifica de desleal. Por força de interpretações subjectivas, quantas vezes não é objecto de equívocos e de considerações erradas.
Na verdade, concorrência tanto pode ser vista como uma luta entre produtores de bens ou prestadores de serviços com o objectivo de conquistarem a maior quota de mercado possível, como uma situação de mercado em que os diferentes produtores e/ou vendedores de um bem ou serviço, interagem com os respectivos compradores e consumidores, com o objectivo de alcançarem maiores vendas, lucros ou quotas de mercado, utilizando para tal diferentes políticas de preços, de qualidade de produtos ou de serviços, num livre jogo da oferta e da procura e sem intervenção do Estado.
No mercado da Distribuição se considerarmos a concorrência na sua vertente de oferta, poderemos defini-la como o conjunto de pontos de venda que comercializam os mesmos produtos ou prestam os mesmos serviços numa determinada zona de influência. E, nesta acepção, podemos distinguir entre concorrência directa ou intratipo, ou seja, aquela que é exercida por pontos de venda que actuam no mesmo segmento ou obedecem ao mesmo conceito de loja (supermercado versus hipermercado ou supermercado versus supermercado) e indirecta ou intertipo, isto é, aquela que é exercida em segmentos diversos ou de acordo com conceitos diferentes, mas que se cruzam parcialmente no sortido (lojas de departamento versus hipermercado).
Horizontal ou vertical
A concorrência pode ainda ser horizontal ou vertical, consoante ocorra entre agentes económicos do mesmo tipo (retalhista versus retalhista ou industrial versus industrial) ou agentes económicos situados em níveis distintos do circuito de distribuição (retalhista versus industrial) como acontece nas MDF versus MDD.
Depois de décadas em que não existiu verdadeira concorrência em Portugal, com a entrada do país na UE, tudo mudou para todos. Não possuindo um cultura de concorrência, não a praticando e, como tal não sabendo bem como fazer, os operadores económicos portugueses demoraram a aceitar a nova realidade e alguns ainda hoje a não aceitam.
E, se no âmbito da concorrência horizontal esta já não se estranha, (excluindo a percepção dos pequenos retalhistas para os quais tudo é concorrência desleal), o verdadeiro foco concorrencial situa-se hoje na concorrência vertical existente entre distribuidores e produtores.
Mas, estas práticas que se observam entre fornecedores e distribuidores no âmbito das suas relações comerciais, decorrentes de um poder de compra acrescido por força de um certo grau de concentração, só serão enquadráveis nos objectivos da legislação de concorrência, caso estas tenham por objecto ou como efeito restringir de forma sensível a concorrência.
E tal, até ao momento, nunca aconteceu e muito menos se conseguiu demonstrar.
Pelo contrário, estudos de análises econométricas revelaram que a centralização de compras e a integração vertical de alguns grupos retalhistas permitem obter preços mais baixos na compra dos produtos, sendo os ganhos daí decorrentes, repercutidos nos consumidores, verificando-se assim uma efectiva transferência dos resultados positivos do poder de compra da distribuição para os consumidores.
Acesso à prateleira
Todavia, por força da sua expansão, as empresas de distribuição têm-se revelado, na terminologia da AdC, como verdadeiros “porteiros” de acesso ao mercado e aos consumidores das MDF. Não obstante a importância que revestem os grupos de distribuição para o escoamento das MDF, em termos económicos a questão da eventual qualificação destas redes de distribuição, enquanto infra-estrutura essencial para a indústria de aprovisionamento, apenas se coloca nos mercados onde existe concorrência entre empresas de distribuição e os seus fornecedores, ou seja, nos mercados onde existem MDD em concorrência com os MDF no acesso ao espaço de prateleira das lojas.
Ora, e como conclui a AdC no seu Relatório de Setembro de 2010, parece pouco verosímil que, de uma perspectiva económica e jurídica, se possa concluir que a rede de distribuição dos grupos retalhistas possa constituir uma infra-estrutura essencial “stricto sensu” para escoamento das MDF dos fornecedores.
De facto e, em particular, no caso nacional, o principal argumento contrário a uma tal qualificação é a inexistência de indícios de falta de concorrência entre os grupos de distribuição quer no aprovisionamento nos mercados onde existam MDD, quer, em geral, ao nível dos mercados locais de venda a retalho ao consumidor final. Por outras palavras, seria necessário àquela qualificação de infra-estrutura essencial da rede de distribuição dos grupos retalhistas, demonstrar que estes grupos dispõem nos mercados em causa, em especial, ao nível do aprovisionamento, de uma posição dominante colectiva
Bem pelo contrário, a crescente oferta por parte dos grupos de distribuição de produtos com a sua marca, comercializados em exclusividade nas suas lojas e, em concorrência com os produtos da indústria, tem consequências de natureza concorrencial, de eficiência económica em termos do bem-estar do consumidor.
Embora a comercialização de produtos MDD nos principais grupos de distribuição seja uma realidade iniciada há vinte e cinco anos, a crescente sofisticação desses produtos, num contexto de, aumento de concentração nos mercados retalhistas e consequente aumento do seu poder de compra e, de crise económica e financeira que hoje atravessamos, implica que se suscitem questões que se situam no centro da discussão sobre as relações comerciais entre retalhistas e fornecedores.
Marcas da Distribuição
Na sua génese, e sem contar com a famosa linha de produtos brancos lançada no inicio dos anos oitenta pelo Pão de Açúcar, as MDD começaram por ser produtos oferecidos em categorias de produtos básicos e funcionais onde a componente de inovação tecnológica e diferenciação era diminuta e o factor mimético era regra.
O preço baixo e a menor qualidade eram evidentes, pelo que apenas constituíam um segmento específico relativamente reduzido do mercado. Porém, hoje em dia, o perfil das MDD é bastante diverso e segmentado, incluindo desde produtos de preço mais baixo a produtos inovadores capazes de concorrer com os MDF líderes de mercado, e para os quais o preço não é o único factor de competitividade.
Para o consumidor trata-se, na maior parte dos casos, de ponderar a relação preço-qualidade das MDD com as MDF, sendo que a qualidade é uma característica subjectiva, cuja apreciação se pode alterar após a experiência de consumo, mas a estratégia da distribuição na comercialização de MDD tem tido basicamente como objectivos, oferecer uma alternativa aos produtos de marca de industrial e desenvolver uma relação de confiança com o consumidor que se traduza na fidelização destes em termos de preferência face aos outros concorrentes.
O tipo de concorrência introduzida pelas MDD pode gerar dois tipos de efeitos nas vendas da categoria que resultam, para além dos factores relacionados com a conjuntura económica, das escolhas agregadas dos consumidores. Pode estar associado a um efeito de expansão de mercado, onde as MDD contribuem para o alargamento, ou a “democratização” do consumo de uma determinada categoria e/ou, pode estar associado a um efeito de transferência agregado onde o crescimento das vendas em volume destes produtos tem como contrapartida a redução no volume de vendas das MDF, uma vez que o retalhista age aqui no duplo papel de concorrente e cliente dos seus fornecedores.
Contudo, os próprios fornecedores com poder de mercado podem responder à expansão das MDD adoptando uma estratégia de diferenciação que explore o grau de substituibilidade entre os dois tipos de produtos, uma vez que o grau de substituibilidade entre MDD e MDF e o grau de concorrência entre retalhistas, determinam o sucesso das estratégias de preço de ambos os lados do mercado.
(A segunda parte do texto sobre a Concorrência na Distribuição vai ser publicada na próxima terça-feira, 22 de Maio)
José António Rousseau
Consultor e docente no IADE/IPAM
www.rousseau.com.pt