De Espanha, bons ventos e um longo verão
Afinal, os bons ventos sopram de Espanha, onde o verão é mais logo e farto!
Serei apenas eu que tenho a sensação de que, em saudosos tempos de uma infância e adolescência despreocupadas, havia, marcadamente, quatro estações do ano? Pois. Acredito não ser apenas eu. E, continuando em considerandos meteorológicos, mas, desta feira, politicamente pouco corretos, há quanto tempo não ouvem um ‘de Espanha, nem bons ventos, nem bons casamentos’?
Deve perguntar-se neste momento: mas, e o que é que estas duas referências têm a ver com retalho e distribuição? Provavelmente, mais do que imagina.
Com a entrada no mercado espanhol no início do ano, temo-lo em constante monitorização e o contato com operadores, no terreno, em Espanha, mostra também resultados atuais e perspetivas futuras muito distantes das portuguesas.
Em Portugal, estamos no verão, tendo tido uma primavera envergonhada, mais aparentada a um outono, que deixou os setores do vestuário e bebidas, para apenas referir dois, nas ruas da amargura. Fabricantes e representantes ainda não fizeram vendas e a distribuição e retalho já clamam por promoções. Situação em que nenhum dos intervenientes sai a ganhar.
Já em Espanha, a AECOC, uma das maiores associações empresariais do país, que agrega indústria, distribuição e operadores, representa mais de 20% do PIB e 4,5 milhões de postos de trabalho, comunicava que metade das empresas de grande consumo estava otimista relativamente ao fecho de 2024.
Mas não é tudo. 80% dos distribuidores e 76% dos fabricantes esperam um crescimento em valor e uma forte recuperação em volume no fecho deste ano. O grande consumo cresceu 1,7% no primeiro trimestre de ’24, comparativamente com os 0,9% de ’23.
Mas, porque é que esta tendência positiva contrasta com a que verificamos quotidianamente no terreno, junto de clientes, que vão das matérias-primas, produção, distribuição, retalho, até aos serviços? Respostas exatas e “a verdade”, não temos, mas podemos observar condições objetivas diversas entre estes dois países da Península Ibérica.
Desde logo, a sazonalidade é mais concentrada em Portugal. Em Espanha estende-se de junho a setembro, o que dobra este período e faz diluir este fator. Empiricamente, sabemos que uma das diferenças culturais entre estes dois povos ibéricos tem impacto nos hábitos de consumo. Os portugueses tendem a ser mais cautelosos com os seus gastos no verão, priorizando produtos essenciais e com um bom custo-benefício. Os espanhóis, por seu lado, são geralmente mais propensos ao lazer e entretenimento durante o verão, investindo em viagens, restauração, e atividades ao ar livre.
Acresce ainda o nível salarial médio após impostos, o custo, não apenas do cabaz de produtos essenciais, mas também de outros bens de consumo, o impacto das taxas de juro foram e são mais incisivas em Portugal e levaram parte dos rendimentos da famílias, os arrendamentos e empréstimos, em termos médios, são mais baixos em Espanha, entre outros. Uma amalgama que faz com que Espanha tenha uma classe média e média-baixa menos estrangulada que a nacional, o que se reflete no desempenho distinto no retalho e distribuição entre os dois países ibéricos.
Afinal, os bons ventos sopram de Espanha, onde o verão é mais logo e farto!