João Esteves, partner e líder do departamento de retalho da Cushman & Wakefield
João Esteves: “A chave é ir antecipando as oportunidades, tendências e novas dinâmicas”
Em entrevista ao Hipersuper, João Esteves, partner e líder do departamento de retalho da Cushman & Wakefield, analisa as principais tendências do mercado e antecipa os desafios e oportunidades que moldarão o futuro do setor.
Ana Rita Almeida
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O setor do retalho em Portugal atravessa uma fase de forte dinamismo e reinvenção, marcada pela consolidação de formatos tradicionais e pela ascensão de novos conceitos. É o que mostra a 43ª edição do Marketbeat Portugal – publicação semestral, desenvolvida pela Cushman & Wakefield, que resume a atividade do mercado imobiliário nacional em 2024.
Como descreve a atual dinâmica do mercado de retalho em Portugal?
O mercado de retalho em Portugal encontra-se numa fase de transformação e forte dinamismo, com o aparecimento de novos conceitos e setores emergentes.
De acordo com dados da procura de retalho agregados pela Cushman & Wakefield, já se registaram quase 600 aberturas em 2024, com claro domínio do comércio de rua e onde a atividade mais representativa foi a restauração, com aproximadamente 53% do total.
Ao nível dos sub-setores de retalho, o mercado de centros comerciais e high street retail encontra-se bastante consolidado, verificando-se nos últimos anos um claro crescimento do cluster OOTR (out of town retail) composto por retail parks e big boxes.
As rendas prime atingiram novos máximos em diversas zonas urbanas. Que fatores explicam este aumento? Acredita que o mercado conseguirá sustentar estes valores nos próximos anos?
As rendas prime têm atingido novos máximos históricos em todos os sub-setores, sobretudo devido à enorme procura de marcas nacionais e internacionais por localizações turísticas e/ou de elevado tráfego – mas que apresentam atualmente uma oferta algo limitada. Outro fator importante que pode explicar este aumento é o conjunto de critérios cada vez mais exigentes por parte das marcas, que não se coadunam, por vezes, com a oferta existente.
Acreditamos que estes valores serão sustentáveis nos próximos anos, tendo em conta que esta evolução natural das rendas é um fenómeno que está intrinsecamente ligado aos ciclos de crescimento económico (consumo privado e vendas a retalho), dinâmicas de oferta e procura e a crescente qualidade das marcas deste setor.
Após um primeiro semestre mais contido, o terceiro trimestre trouxe sinais de recuperação no investimento imobiliário comercial. O que considera ter impulsionado este aumento de 3% no volume acumulado até setembro? E quais são as expectativas para o último trimestre, considerando a previsão de um volume adicional de 680 milhões de euros?
A grande mudança face a anos anteriores é o ressurgimento do investimento em centros comerciais de grande dimensão. Este fenómeno já tinha tido início em Espanha há 2 anos e chegou finalmente a Portugal. Para além das transações já realizadas, é provável que venham a concretizar-se ainda outras até ao final do ano – assim se justificando o volume acima mencionado.
O relatório sugere uma maior concentração da oferta futura em retail parks. O que está a atrair os investidores para este segmento específico? E como esta tendência se alinha com as mudanças nos padrões de consumo dos portugueses?
Conforme o último estudo publicado pela C&W Portugal (Marketbeat Outono), verifica-se que o formato de retail park agrega cerca de 87% da oferta dos próximos três anos, o que coloca este segmento específico numa posição de destaque – sobretudo face aos centros comerciais, um setor já bem representado em Portugal e onde a adição de oferta se vai manifestar sobretudo por expansão de alguns ativos existentes.
Os retail parks têm crescido muito, sobretudo porque (i) podem ser desenvolvidos em localizações com menor densidade populacional, (ii) permitem às marcas expandir com menor investimento inicial e rendas mais baixas e (iii) têm margens interessantes para os promotores (custos de terreno e de construção mais reduzidos).
Do lado dos retalhistas, temos registado um assinável crescimento da procura de marcas com posicionamento discount.
O relatório indica uma forte presença de investidores estrangeiros, com 83% do total investido até ao momento. Que fatores explicam esta predominância do capital estrangeiro? Acredita que esta tendência se manterá nos próximos anos ou espera uma maior participação de investidores nacionais?
Essa percentagem é bastante comum no investimento em imobiliário comercial em Portugal, traduzindo o forte apetite dos investidores estrangeiros pelo nosso mercado. Este ano tivemos um ano atípico, com uma presença anormalmente elevada dos investidores domésticos na primeira metade do ano, mas com as transações de grandes centros comerciais (quase sempre realizadas com capital estrangeiro) a aumentar o peso proporcional dos internacionais.
O relatório destaca uma possível estabilização das yields de referência e, em certos casos, até uma redução nas taxas de rentabilidade para os ativos mais procurados. Como interpreta esta tendência?
As yields de referência passaram por uma subida muito rápida e significativa entre 2023 e 2024, sobretudo por consequência de igual movimento das taxas de juro. Estas últimas já começaram a descer na segunda metade do corrente ano e essa trajetória descendente irá manter-se no próximo ano provavelmente, pelo que é natural que as taxas de rentabilidade sigam a mesma direção (embora não com a mesma magnitude).
No panorama atual, quais são as principais tendências no comportamento do consumidor? Há mudanças no tipo de produtos mais procurados?
As tendências dos consumidores têm sofrido constantes alterações nos últimos anos, largamente impulsionadas pelos avanços da tecnologia, integrada com os espaços físicos, e pela criação de modelos híbridos que proporcionam experiências imersivas.
A possibilidade do cliente comprar online, levantar o produto e efetuar devoluções na loja, através de processos totalmente automatizados (mas sempre com o essencial “toque” humano), são experiências altamente valorizadas pelos clientes.
A circularidade, responsabilidade social e sustentabilidade são também tendências que estão no topo das prioridades das marcas e que são cada vez mais valorizadas pelos clientes, promovendo práticas ecológicas que reduzem a pegada ambiental e criam um espírito de comunidade. Estes são fatores decisivos para as marcas criarem engagement com os consumidores.
Que impacto têm tido as pressões inflacionistas no setor do retalho? De que forma a subida dos custos operacionais e a perda de poder de compra dos consumidores estão a influenciar as estratégias dos retalhistas?
O aumento generalizado dos preços e a consequente subida dos custos operacionais têm reduzido o poder de compra dos consumidores e influenciado as estratégias dos retalhistas.
Como tal, as mais variadas estratégias de marketing e de aplicação dos vários tipos de desconto no preço de venda ao público como estímulo de compra, bem como a proliferação de marcas e conceitos de retalho que propiciam o discount têm-se revelado, para já, como vencedoras no modelo de consumo atual.
Como vê a evolução do comércio online em comparação com o retalho físico? A procura por espaços físicos permanece robusta, mas que papel atribui ao e-commerce e ao omnicanal no crescimento do setor?
Não obstante ligeiro abrandamento, o comércio online mantém a sua trajetória de continuado crescimento a par do retalho físico. Estas duas formas de consumo são, cada vez mais, vistas pelos especialistas do setor como duas faces da mesma moeda. Hoje em dia, a maior parte dos retalhistas aplicam com sucesso estratégias omnicanal que se complementam e que se irão repercutir numa melhor dinâmica e experiência de compra por parte dos consumidores.
Quais são as suas perspetivas para o setor do retalho em Portugal? Que desafios e oportunidades antecipa e como é que a Cushman & Wakefield se está a preparar para responder?
As perspetivas são as melhores. O retalho tem demonstrado enorme resiliência ao longo do tempo, o que juntando com a elevada qualidade dos seus conceitos, procura dos consumidores e consequente evolução positiva das vendas, certamente se irá traduzir no crescimento sustentável do setor. Como líder do departamento de retalho da Cushman & Wakefield em Portugal, acredito que o setor de retalho, tal como os outros, sempre terá os seus desafios, sendo que a chave é ir antecipando as oportunidades, tendências e novas dinâmicas já referidas anteriormente, que vão surgindo e que devem ser reconhecidas com assertividade e de forma proactiva. Acreditamos na nossa elevada experiência, know-how histórico do setor e capacidade de resposta das nossas equipas e, com essa base, poderemos providenciar as melhores soluções aos nossos clientes na vanguarda do que melhor se faz neste mercado.
Entrevista publicada na edição 428