Madalena Rugeroni, country manager da Too Good to Go, segura o saco do projeto, e a equipa deste projeto
Quando o desperdício alimentar se transforma em negócio
Em Portugal, mais de 400 espaços do canal Horeca já aderiram ao serviço que transforma o desperdício alimentar em refeições
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A Too Good to Go ficou disponível no Porto no início de fevereiro, três meses depois de aterrar em Lisboa. Em Portugal, mais de 400 espaços do canal Horeca já aderiram ao serviço que transforma o desperdício alimentar em refeições, vendidas depois ao público em formato de “caixas surpresa”, através de uma app. Expandir a todas as capitais de distrito e captar os supermercados são objetivos do projeto.
Um terço dos alimentos produzidos, a nível mundial, acabam por ser desperdiçados, o que equivale, em termos económicos, a uma perda de 1,3 biliões de dólares ao ano. Estes valores agravam-se quando confrontados com os cerca de 800 milhões de pessoas que passam fome em todo o mundo.
Os dados são da Too Good to Go, que surgiu em 2016, na Dinamarca, para fazer face a esta dualidade. O projeto gravita em torno de uma aplicação digital, através da qual são vendidos os excedentes de restaurantes e outros estabelecimentos, enquanto refeições económicas, que os utilizadores podem recolher nos próprios espaços.
Quatro anos após a sua criação, a plataforma está já disponível em 15 países, confirmando assim a urgência da causa. Portugal inclui-se nesta lista desde final de outubro do ano passado. Mais recentemente, em janeiro deste ano, o projeto chegou aos Estados Unidos, que se tornou o primeiro país de fora da Europa a receber a Too Good to Go.
Só no mercado norte-americano, onde a ferramenta ficou disponível nas cidades de Nova Iorque e Boston, estima-se que o desperdício chegue às “63 milhões de toneladas de alimentos” por ano, segundo indicou o CEO da empresa dinamarquesa, Mette Lykke. Isto supõe 40% do lixo produzido naquele país e “aproximadamente 160 mil milhões de dólares”, em termos financeiros. Um valor que o governo dos Estados Unidos tem intenção de reduzir em 50% até 2030” e é visto como uma oportunidade por parte da plataforma anti-desperdício.
Oito mil refeições vendidas em janeiro
Em Portugal, “o desperdício alimentar chega a um milhão de toneladas por ano, o que representa cerca de 50 mil refeições por dia” ou, por outras palavras, “20% do lixo produzido”, explica Madalena Rugeroni, country manager da plataforma para Portugal, em declarações ao Hipersuper por ocasião do lançamento da plataforma no Porto, no início de fevereiro.
Até agora, a Too Good to Go estava disponível apenas em Lisboa, onde arrancou com 50 estabelecimentos parceiros e, em três meses, ampliou o número para mais de 350. Ao todo, já “salvou” mais de 18 mil refeições em Portugal. “Só no mês de janeiro entregamos oito mil refeições”, comenta a country manager, apontando para o aumento constante do número de utilizadores e parceiros da plataforma. O objetivo é que este ano a plataforma consiga chegar a todas as capitais de distrito em Portugal continental.
No Porto, o projeto começou com uma rede de 60 “restaurantes independentes, cafetarias e pastelarias” que já vendem as “caixas mágicas”. Depois de chegar à invicta, o próximo destino é Faro, onde está já a ser estudada a implementação da plataforma. O que deve acontecer “entre março ou abril”, antecipa Madalena Rugeroni. “Escolhemos as cidades para onde vamos consoante a adesão que registamos na plataforma, da densidade populacional e de estabelecimentos. Neste sentido, queremos responder à adesão que os consumidores em Faro têm demonstrado”, frisa a responsável.
Plataforma testa parceria com Meu Super e Auchan
Além do alcance geográfico, a Too Good to Go está empenhada em aumentar a tipologia dos comerciantes ligados ao projeto, e captar parceiros de maior envergadura, com os distribuidores do canal alimentar. Em outros países, a plataforma já colabora com cadeias como o Lidl ou o Intermarché, entre outros. Por cá, arrancou recentemente com um projeto-piloto para se aproximar dos supermercados. Neste âmbito, está a ser testada a parceria com “cerca de três lojas” das cadeias Meu Super e Auchan, em Lisboa, numa iniciativa que envolve também “outras lojas e mercearias mais pequenas”, explica a country manager. “Como o nosso objetivo é criar o maior impacto possível, temos todo o interesse em associar-nos às cadeias alimentares de maior dimensão”.
A Auchan juntou-se à plataforma em final de dezembro passado, nomeadamente através da loja instalada no Almada Fórum. A Makro é outra das distribuidoras em Portugal que já se aliaram ao projeto, no entanto, com esta cadeia “a parceria é um pouco diferente, até porque os clientes só conseguem entrar nas lojas Makro com o cartão da cadeia”, ressalva Madalena Rugeroni.
Para os estabelecimentos, as vantagens de aderir a esta plataforma passam sobretudo pela “angariação de novos clientes e a visibilidade associada à imagem de sustentabilidade, mas também permite “obter um rendimento extra a partir de produtos que, de outra forma, iriam parar ao lixo”. Os espaços aderentes recebem uma comissão de “entre 20 a 25%” das vendas da plataforma.
Empresa quer colaborar com Governos
Na reta final, as “caixas surpresa” são levantadas nos restaurantes em horários pré-estabelecidos e não está nos planos da Too Good To Go avançar com entregas ao domicílio, por uma questão de princípio. “Queremos ter o menor impacto ambiental possível”, lembra a responsável.
Atualmente a empresa detém 18 colaboradores em Portugal, que operam a partir de Lisboa. O número de postos de trabalho deve crescer este ano para entre os “25 e os 30” colaboradores.
A nível mundial, a aplicação reúne mais de 37 mil estabelecimentos, em 15 países, 19 milhões de utilizadores, que já permitiram salvar mais de 30 mil refeições. A meta para este ano passa por chegar aos 75 milhões de utilizadores e começar a colaborar com “Governos de pelo menos cinco países”, antecipa Madalena Rugeroni. A empresa dinamarquesa quer ainda lançar programas educativos expandir as parcerias com hotéis, bombas de gasolina e organizações não-governamentais, como a Refood e a CASA (Centro de Apoio aos Sem Abrigo).
Em quatro anos de existência, a plataforma conseguiu atrair um investimento total de 16 milhões de euros, a partir de business angels, mas neste momento “não está prevista a captação de mais fundos”, diz a country manager. O último, levantado em fevereiro de 2019, representou uma injeção de seis milhões de euros.
“Porto caminha para liderar recolha de resíduos orgânicos na Europa”
A Too Good to Go estima que, no Porto, sejam desperdiçadas cerca de 14 mil toneladas de comida por ano. Helder Claro, coordenador da área de planeamento da Porto Ambiente, corrige o valor para “entre 23 a 26 mil toneladas de alimentos” que todos os anos vão parar ao lixo, sendo que o desperdício alimentar representa 23% da matéria indiferenciada recolhida no Porto.
Na qualidade de responsável pela recolha do lixo da cidade, a Porto Ambiente tem vindo a investir na separação de resíduos orgânicos, com iniciativas que, segundo o responsável, estão a tornar o Porto “pioneiro nesta matéria, a nível europeu”.
Há mais de dez anos que a empresa municipal tem implementado um circuito de recolha de resíduos orgânicos em estabelecimentos comerciais, que conta atualmente com 780 espaços aderentes, entre restaurantes, cantinas, supermercados. O sistema consiste na distribuição de contentores, de várias dimensões, para depósito de matéria orgânica separando-a do lixo indiferenciado, à semelhança do que acontece com plástico, vidro e papel. A recolha é feita porta-a-porta. “A ideia é utilizar a nossa rede de ecopontos na cidade e adicionar um novo contentor apenas para resíduos orgânicos”, explica Hélder Claro, em declarações ao Hipersuper, durante o evento de lançamento da Too Good to Food no Porto.
A partir desta rede, a Porto Ambiente encaminha cerca de 6.700 toneladas de resíduos por ano para a Lipor, a operadora que assume posteriormente o tratamento e a valorização. A parceria entre as duas empresas já se materializou no Nutrimais, um produto para a agricultura, feito a partir destes resíduos. Segundo o coordenador de planeamento da empresa municipal, “menos de 3%” da matéria orgânica entregue à Lipor segue para aterro.
Porto avança com separação de resíduos orgânicos em prédios
Dos espaços comerciais, Porto Ambiente alargou o sistema aos domicílios, estando desde julho de 2018 a testar este tipo de recolha em moradias. São cerca de 1.700 as casas desta tipologia na cidade que fazem separação de matéria orgânica.
A próxima etapa passa por incluir também prédios e arranca no próximo mês de junho, com uma “forte campanha de sensibilização”, que se traduz na “entrega de contentores de forma pessoal ou personalizada”, garantindo uma comunicação direta para esclarecer todas as informações sobre o sistema. “Queremos entregar pequenos contentores para as cozinhas e um maior para ser recolhido na porta dos prédios. (…) O objetivo é também garantirmos, à partida, a qualidade dos resíduos”, explica o responsável. A Porto Ambiente pretende envolver 30% população com esta campanha, durante a qual pretende distribuir 135 mil contentores pequenos, por toda a cidade.
A recolha em moradias está também a ser alargada à zona oriental do Porto, onde são esperados mais 1.000 locais aderentes à rede de separação de resíduos orgânicos, no próximo ano.
Dada a inovação nesta área, o Porto foi selecionado para desenvolvimento do projeto-piloto CityLoops, a par de sete outras cidades europeias. A iniciativa, financiada por fundos comunitários, visa encontrar soluções para reintroduzir os resíduos na sociedade, numa lógica de economia circular. Envolve também Sevilha, em Espanha, e outras cidades da Holanda, Finlândia, Noruega e duas na Dinamarca. Em Portugal, será desenvolvida a área dos “sistemas alimentares” e o projeto cobrirá cerca de 20% da população com a recolha de resíduos orgânicos, explica o Hélder Claro. “Juntando os projetos da Porto Ambiente e o CityLoops, daqui a “entre dois a quatro anos, 50% dos domicílios na cidade estarão abrangidos no circuito de recolha seletiva de resíduos orgânicos”, conjetura o responsável.