O património cultural como fator de atração de turistas a uma cidade. O caso da cidade do Porto
“A cidade do Porto configura um excelente exemplo do potencial do turismo como fator de desenvolvimento e mundialização de marca turística e imagem, recordando para mais o facto de dar o nome e servir de entreposto ao mais antigo e mais genuinamente histórico produto e marca de Portugal: o Vinho do Porto”
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Por Vitor Teixeira – Professor da Escola das Artes da Universidade Católica Portuguesa
Susana Costa e Silva – Professora da Católica Porto Business School e Diretora do Mestrado em Marketing da CPBS
Sandra Raquel Castro – Aluna de Mestrado em Marketing da Católica Porto Business School
O turismo é uma das atividades económicas com maior dinamismo no mundo atual e com um enorme potencial de desenvolvimento, assente, sobretudo, na diversificação económica e na valorização de recursos endógenos. A cidade do Porto configura, neste âmbito, um excelente exemplo do potencial do turismo como fator de desenvolvimento e mundialização de marca turística e imagem, recordando para mais o facto de dar o nome e servir de entreposto ao mais antigo e mais genuinamente histórico produto e marca de Portugal: o Vinho do Porto.
Mas, como a atualidade mostra de forma clara, essa marca histórica e idiossincrática do velho burgo portuense já não é a única via de desenvolvimento para a cidade, entretanto delapidada do seu pioneiro valor industrial, coração antigamente da mais antiga região industrial portuguesa. Mas não choremos sobre o passado nem lamentemos o presente, pensemos antes em como construir o futuro, que pode ser altamente alavancado, económica e culturalmente, no turismo, com base no potencial histórico, artístico, cultural e inovador do Porto, já também um berço, com matriz pujante, das indústrias criativas, em que se afirma a cada dia.
O património cultural do Porto é, neste sentido, um dos recursos endógenos mais importantes da cidade, englobando, materialmente, as igrejas, conventos e mosteiros, casas e palácios, praças, conjuntos arqueológicos, centro histórico, entre outro (património material, no qual se lança aqui o desafio do património industrial…), mas também bens imateriais como a literatura, a música, a gastronomia, a linguagem e os costumes/ tradições, que são a identidade cultural do povo, para mais numa cidade que é também berço de revoluções e insurreições, ciosa da sua identidade e personalidade coletiva, patenteada numa história plena de dinâmica empreendedora e de consciência de cidadania política e regional. A identidade é um fator fulcral sobre o qual a cidade constrói a sua imagem, as suas raízes e é nela que se encontra um dos principais fatores de atração de turistas.
Potencialidade do património cultural do Porto
As caraterísticas distintivas do Porto, as que lhe conferem identidade própria, estão associadas ao Centro Histórico, um dos berços da cidade, e às suas gentes, para além das suas labirínticas ruas estreitas e velhos edifícios em torno da Sé (Morro da Sé ou da Penaventosa, a cividade antiga), ao Rio Douro (a cidade burguesa, comercial, moderna, internacional…) e, na outra margem (Entreposto, as chamadas Caves), também, ao Vinho do Porto.
Desde cedo, a cidade assumiu uma trajetória virada para o mundo com grande enfoque nas relações comerciais internacionais (assim como nacionais, com o ‘hinterland’ nortenho e o Douro Vinhateiro), relações essas materializadas e plasmadas na sua arquitetura emblemática, expressão de gosto, riqueza e mundividência. A este propósito, de referir que se celebrarão este ano (a 5 de dezembro) vinte anos sobre a elevação do Centro Histórico do Porto na Lista de Bens e Sítios classificados como Património Cultural da Humanidade da UNESCO.
O Centro Histórico do Porto conserva pois, na diacronia, de forma artisticamente valorizável, os testemunhos de épocas e periodizações artísticas e estilísticas sucessivas. Podemos a este respeito elencar a época Romana e a SuevoVisigótica, nas mais remotas, mas principalmente os estilos Românico, Gótico, Renascimento e Maneirismo Barroco e Neoclássico, Moderno e Contemporâneo, além da Arte Nova e do Património Industrial. A arquitetura no Porto é, sem dúvida, um dos pontos fortes em termos culturais, quer o núcleo fundamental do edificado no centro histórico, quer a arquitetura do século XX e XXI não apenas no Centro como por toda a cidade, pautada por nomes mundialmente conhecidos (Fernando Távora, Siza Vieira ou Souto de Moura) que em muito contribuíram para o prestígio da denominada Escola de Arquitetura do Porto, em boa parte oriunda da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto. O edifício do Museu de Arte Contemporânea de Serralves veio reforçar ainda no final do século XX este poder atrativo da arquitetura do Porto e, já no século XXI, este poder viu-se enriquecido com o edifício da Casa da Música, obra de Rem Koolhaas, arquiteto holandês. Este projeto surgiu na renovação arquitetónica e urbanística de certas áreas da cidade no âmbito do Porto 2001, Capital Europeia da Cultura, certame de grande dimensão que ajudou ainda mais a catapultar a tradição inovadora e criativa, bem como o património material e imaterial da cidade e das suas gentes.
Tendo por base todas as motivações atrás elencadas e outras que certamente existirão, num plano mais imaterial ou não tão evidente em termos patrimoniais, o potencial turístico da cidade foi recentemente comprovado, com a distinção de melhor destino europeu de 2012 pela European Consumers Choice. No website da organização é possível confirmar esta atribuição: “Com a variedade de recursos disponíveis, o Porto conquista todos os seus visitantes, desde aqueles que o procurem pela história e autenticidade àqueles que o busquem para explorar uma nova cidade, mais cosmopolita e contemporânea”. De referir ainda que, em 2014, o Porto constou na lista dos 20 melhores destinos. No que diz respeito à confirmação do estatuto que a cidade do Porto tem vindo a granjear, de referir que, de acordo com as conclusões do estudo “O Perfil do Turista que visita o Porto e o Norte de Portugal”, os visitantes têm vindo a realizar mais compras, a gastar mais, recomendado o destino e manifestando a intenção de regressar. Este facto é por si só fundamental para alicerçar nestas constatações a base para uma reorientação estratégica que se espera que a cidade concretize do ponto de vista dos negócios que ali se acolhem. De facto, e com base no mesmo estudo, podemos constatar que os visitantes da cidade do Porto ficaram bastante satisfeitos com a visita à cidade, já que numa escala de 1 a 7 pontos, foi obtida uma média global de 6,29 pontos, o que não deixa de ser um valor admirável.
Verificou-se ainda que o alojamento, a hospitalidade, o “value for money”, a limpeza, a gastronomia, os parques naturais e o comércio, foram os atributos em que os turistas revelaram maiores índices de satisfação. O estudo revela ainda que são os franceses, espanhóis, alemães e ingleses com idades maioritariamente entre os 19 e 40 anos que mais visitam a invicta. 16,1 % dos inquiridos elegem o “património” como uma das principais razões para visitarem a cidade, ficando ainda no top das preferências a “beleza natural” e o “preço” com 31,1 % e 25,9% das preferências, respetivamente.
Iniciativas de conservação e divulgação
O serviço municipal tem a seu cargo a proteção do património cultural da cidade, tendo essencialmente responsabilidades de conservação e divulgação. Estas desdobram-se em múltiplas atividades, entre as quais se destacam: proteção e classificação de imóveis, aconselhamento sobre intervenções, visitas guiadas, pesquisa e estudo, apoio ao licenciamento de obras e arqueologia. Pode dar-se como exemplo de reabilitação recente a restituição da imponência do edifício situado em plena Praça da Liberdade que já foi convento (dos Lóios, ou Cónegos Azuis de S. João Evangelista, ou de S. Elói, por estar junto à antiga porta homónima, na muralha gótica, dita Fernandina), depois palácio, mais tarde banco e que, agora, abre portas como um hotel de cinco estrelas que vem aumentar e promover as potencialidades turísticas da cidade. Apesar de todas estas funcionalidades, o espaço continua carimbado com o nome que traz desde o século XIX: Palácio das Cardosas.
A tarefa de divulgação da cidade é também levada a cabo pela Associação de Turismo do Porto (ATP) que é a responsável pela promoção externa do destino Porto e Norte de Portugal. Esta associação lançou um portal online, “Porto and the North: the essence of Portugal”, 2013.
“O novo portal responde ao aumento da procura de informação turística através dos canais online e integra ferramentas capazes de potenciar diretamente as vendas do destino. Será, seguramente, um importante aliado para os objetivos de crescimento de turismo internacional para o Porto e Norte de Portugal nos próximos anos, como refere Vladimiro Feliz, presidente da ATP. Com esta nova ferramenta de trabalho, a ATP2 propõe o incremento do número de dormidas no ano de 2015, para 2,6 milhões, assim como o reforço nos mercados em crescimento e de procura sazonal.
Concomitantemente, o site “Porto Turismo – Oportunity to discover” encontra-se a funcionar como um verdadeiro guia onde o turista pode apoiar-se para programar a sua viagem e descobrir o que a cidade tem de mais belo. O website está dentro da linha seguida pela marca “PORTOCULTURA”, que tem como estratégia construir uma missão cultural para a cidade, introduzindo a contemporaneidade, mas tendo por base o que a cidade tem de mais genuíno – a sua identidade.
O património da cidade do Porto deve ser, pois, encarado como um domínio estratégico, uma vez que nele reside um precioso fator de atração turística. Os benefícios do aumento do número de visitantes são evidentes, tanto a nível económico como social. O turismo, como se sabe, contribui positivamente para a balança comercial portuguesa e impulsiona a economia, gerando emprego e dinamismo na região. Além disso, o intercâmbio cultural é também enriquecedor tanto para os que recebem como para os que visitam a cidade.
O mercado turístico do Porto encontra-se em constante evolução, pelo que previsões e projeções constituem um desafio a que o tecido empresarial da região não pode ficar indiferente. Há a constante necessidade de definir parâmetros essenciais, como as tendências da procura, a ação da concorrência (outros destinos turísticos e outras propostas de valor dentro da cidade) e o desempenho dos mediadores de mercado (companhias aéreas, cruzeiros, Internet, redes sociais). É ainda importante desenvolver atividades promocionais, infraestruturas, e acima de tudo, apostar na formação, qualidade e certificação dos agentes que desenvolvem funções turísticas na cidade, desde os funcionários dos hotéis até aos guias turísticos. Sugere-se que todos os agentes económicos dos sectores da Economia e do Turismo, numa sinergia potenciadora de novos negócios e fortalecimento de um mercado com grande potencial de desenvolvimento, falem a uma só voz, de modo a proporcionar uma experiência única aos turistas. É com base nestas experiências singulares que se podem catapultar os negócios existentes e alavancar o próprio mercado, ali alicerçando novas propostas de valor mais consentâneas com o atual panorama de negócios na cidade do Porto.
No horizonte da promoção turística e desenvolvimento deste sector como importante atividade económica no Porto e seu ‘hinterland’, impõe-se uma aposta na qualidade e na inovação, na diferença, nomeadamente no que diz respeito à oferta de novos produtos turísticos ou renovação dos que já existem. Tudo isto deve ser alicerçado no potencial paisagístico e humano, monumental e patrimonial, em novos roteiros, ou redefinição dos já existentes. Uma especial ênfase deve ser dada ao património enológico e comercial, a começar no Vinho do Porto ou outros produtos vínicos, como o Vinho Verde e as bebidas espirituosas, em franco crescimento a nível de exportações e impacto económico.
Podemos, pois. exponenciar o Porto como cidade da arquitetura e da engenharia civil, antiga e contemporânea, de experimentalismos nesse campo, de inovação e arrojo, de sucesso nas suas escolas de arquitetura, design, de moda e artes cénicas, por exemplo.
Pontes em ferro, em betão, pontes na memória (a das Barcas), o Porto é uma cidade de rio e de cruzar o mesmo. É também uma cidade de tradições e lendas, estribos da sua história e da de Portugal. Cidade de revoluções, de coragem indómita, de luta e de gentes aguerridas, o Porto plasma a sua história milenar nos seus monumentos, que atravessam a diacronia da história da arte, nos seus estilos e gramáticas artísticas, como também nos seus museus e coleções, espólios artísticos, públicos ou privados, nos seus espaços de cultura. E é ainda uma cidade de sociabilidade, de que são exemplo os cafés históricos, que juntam património material e imaterial, história e histórias de vidas.
Recordaríamos aqui os Judeus que se refugiram na Cidade desde os anos 30, fugindo à voragem da Guerra. E por cá ficariam, solicitando aos proprietários de cafés que abrissem esplanadas, como nas suas cidades do Centro da Europa. Nesta cidade granítica e brumosa, pluviosa, esse povo em diáspora acabou por trazer um ‘elan’ novo a uma cidade que se fazia na modorra intacta da ‘pátine’ intemporal… Cafés com literatura, arte, tertúlia, focos de lutas e “diatribes” literárias e culturais, o Porto é um marco nesse aspeto cultural, como nas suas livrarias e polos culturais. Quantos novos roteiros ou renovações dos antigos se poderiam criar nesta “tessitura” histórica e cultural desta singular cidade, potenciando-se como fatores de atração e dinamização turística.
Bibliografia:
António, Magalhães, Duarte, Pereira, Joaquim (2010), “City Marketing- My place in XXI- Gestão estratégica e Marketing de cidades”, 1ª edição, Vida Económica-Editoria
Celeste, Pedro (2010), “Que marketing para o turismo em Portugal?”, Jornal Expresso, 9 de julho 2010
IPDT- Instituto do Turismo (2º trimestre 2013), “O Perfil do Turista que visita o Porto e Norte de Portugal”
Nunes, Rui, Ferreira, Inês, Maia, Olga e Alves, Sofia (maio 2013), “Plano Municipal de Cultura do Porto”
Netgrafia:
http://www.portoenorte.pt/client/files/0000000001/2194.pdf, 21 de outubro 2014
http://www.europeanconsumerschoice.org/travel/european-best-destination-2012/, 21 outubro 2014
http://www.portoturismo.pt/Visitar/Paginas/default.aspx, 2 novembro 2014.
http://www.visitportoandnorth.travel/, 14 de novembro 2014
http://www.patrimonio.pt/feira/index.php/apresentacao/a-feira, 14 de novembro 2014.