A estratégia da retalhista Leonidas para entrar em Portugal
Ricardo Puga, responsável pela marca Leonidas, conta na primeira pessoa os principais desafios de trazer uma marca centenária de retalho para o mercado nacional. O profissional marca a estreia da nova rubrica “Experiências”, o relato na primeira pessoa de um gestor convidado pela redação a partilhar os prós e contras de uma determinada experiência profissional
Rita Gonçalves
El Corte Inglés ilumina-se de azul para sensibilizar importância da luta contra o Cancro da Próstata
Quinta da Vacaria investe na produção de azeite biológico
Grupo Rotom reforça presença no Reino Unido com aquisição da Kingsbury Pallets
Diogo Costa: “Estamos sempre atentos às necessidades e preferências dos nossos consumidores”
Staples une-se à EDP e dá passo importante na descarbonização de toda a sua cadeia de valor
CTT prepara peak season com reforço da capacidade da operação
Já são conhecidos os três projetos vencedores do Prémio TransforMAR
Campolide recebe a terceira loja My Auchan Saúde e Bem-Estar
Montiqueijo renova Selo da Igualdade Salarial
Sensodyne com novidades nos seus dentífricos mais populares
Por Ricardo Puga, responsável pela marca Leonidas
Bruxelas, 31 de dezembro de 2012, mais uma noite de réveillon bem passada na companhia da minha mulher e várias resoluções de ano novo formuladas junto com as tradicionais passas e uma flute de champagne da melhor tradição francesa. Saindo da inevitável festa na Grand Place, e a caminho do hotel pela famosa Rue Neuf, somos forçados a passar por todas as famosas lojas de chocolates em Bruxelas. Nesta famosa artéria de Bruxelas, com aproximadamente 800 metros de comprimento, existem seis lojas Leonidas Chocolates! Aqui a luta pelo domínio do negócio do chocolate é feita ao metro e a gigante Leonidas domina completamente todo o quartier. Como conversa de circunstância como quem tenta combater o frio comentamos como seria engraçado levar este conceito maravilhoso para Portugal. Chegámos ao hotel e a conversa continua pelo que por curiosidade pesquisamos pelo franchising da Leonidas sem grandes resultados. Como a persistência sempre foi uma das nossas qualidades (ou defeitos) não nos resignámos pelo que decidimos enviar um email nessa mesma noite para o site da marca onde procurávamos informações sobre uma possível representação em Portugal.
O tempo passou (dois anos) e não obtivemos resposta até que em janeiro de 2015 recebemos um email perguntando se ainda mantínhamos o interesse na marca. Ainda não repostos da surpresa, respondemos que gostávamos de conhecer melhor a marca e a Leonidas então pediu-nos para assinar um contrato formal de confidencialidade e passados dois meses fomos a Bruxelas conhecer a empresa, visitámos lojas, visitámos a fábrica, fizemos todas as perguntas que quisemos, sobretudo a que mais nos intrigava que era porque não estavam ainda em Portugal? Foi-nos explicado que a marca ainda não estava em Portugal muito por culpa da crise financeira que tinha assolado o país, mas também pelo facto de sermos um país com um clima bastante quente e termos a mais baixa percentagem de consumo de chocolate per capita da Europa. Regressámos a Portugal com uma boa sensação, de estarmos perante uma grande oportunidade de representar uma marca de grande dimensão (1500 lojas) e história (102 anos) mas também com a noção que se apresentavam diversos desafios.
O próximo passo foi estudar o mercado português, perceber em que consistia o mercado, confirmar os níveis de consumo, estudar a concorrência e perceber onde poderiam estar as oportunidades e chegámos à conclusão que existiam dois problemas principais, um de natureza fiscal (a maior taxa de IVA [Imposto de Valor Acrescentado] na Europa, 23%) e outra de natureza cultural (os portugueses compram sobretudo chocolate para oferecer e não para consumo próprio). Se sobre a primeira pouco podíamos fazer na segunda podíamos fazer um pouco mais, sobretudo reduzir margens e tornar o produto um pouco mais apetecível em termos de preço.
O grande problema em Portugal é que tanto no chocolate como na área gourmet a perceção do consumidor é que os produtos são muito caros e realmente são! O principal motivo acaba por ser o raciocínio de que se vendemos pouco temos que vender caro mas ao mesmo tempo se vamos vender caro acabaremos por vender pouco, deste modo para ter sucesso necessitaríamos de um produto com um capital de marca forte com qualidade e com um preço que fosse realmente competitivo e acessível a um público alargado. Com estas premissas voltámos ao diálogo com a Leonidas para discutir questões de natureza jurídica e de ‘pricing’ pois a marca insiste em ter uma palavra a dizer nestas questões.
Juridicamente propuseram uma representação de marca com obrigatoriedade de abertura de uma loja e depois uma expansão do negócio por licenciamento de marca. Este foi sem dúvida o facto que mais dúvidas trouxe no nosso processo de decisão. A implantação de uma nova marca num mercado envolve sempre um grande investimento e no nosso business ‘plan inicial’ considerámos que o mesmo iria ser alicerçado na expansão por franchising da marca onde reverteríamos todos os direitos de entrada e ‘royalties’ para a promoção, o que permitiria um maior controlo sobre a marca.
A marca não concordou pois prefere o modelo de licenciamento de marca onde não existem barreiras ao investimento (os parceiros não pagam ‘royalties’ nem direitos de entrada), tendo apenas de fazer as obras necessárias para adaptar a loja ao layout da marca e comprar o produto (investimento médio de €20.000). Este modelo assenta o negócio em dois pilares essenciais: no desenvolvimento de lojas próprias pela empresa representante da marca (onde se junta a margem de distribuição e retalho) e no desenvolvimento de uma rede de lojas em regime de licenciamento de marca (parcerias). Isto trouxe novos desafios financeiros e estratégicos pois duas receitas que considerávamos importantes desapareciam (direitos de entrada e ‘royalties’), mas que segundo a marca seriam rapidamente colmatadas pela margem de distribuição que teríamos sobre as lojas parceiras, que mesmo sendo muito reduzida, rapidamente atingiria volumes interessantes. O negócio da Leonidas é vender chocolate (produto) e não serviços pelo que a sua estratégia é criar pontos de venda exclusivos e nesse sentido quanto menos barreiras existirem mais pontos de venda surgirão e mais volume existirá para a fábrica.
Com estas novas premissas como base reformulámos o nosso ‘business plan’ para ser submetido ao conselho de administração da Leonidas, que reúne apenas duas vezes por ano e a próxima reunião iria realizar-se em maio. O nosso plano não foi aprovado à primeira e foram solicitados diversos esclarecimentos sob a nossa previsão de números de crescimento que consideravam bastante otimistas (faturações médias por loja de €175.000 com crescimentos de 15% nos primeiros três anos e abertura de oito lojas/ano). Argumentavam com a experiência da marca em Espanha onde o crescimento tinha sido bastante lento (14 lojas em cinco anos) e nós prevíamos 40 lojas em cinco anos. Esgrimimos os nossos argumentos que assentavam sobretudo num modelo de negócio diferente, onde além do chocolate as lojas teriam café, crepes, gomas e gelados, e estes fatores permitiriam às lojas combater uma previsível sazonalidade mas acima de tudo diversificação da receita.
Passo seguinte: encontrar o espaço
Estávamos em julho de 2015, sete meses após o início deste processo, quando finalmente tivemos a aceitação por parte da marca e assinamos oficialmente o contrato de representação e distribuição do produto. O passo seguinte foi encontrar o espaço, tarefa digna de Leonidas! Os preços de arrendamento em Lisboa e no Porto são especulativos e toda a estratégia da marca assenta sempre em custos fixos muito baixos. Desistimos rapidamente das ‘downtown areas’ para nos centrarmos nos locais frequentados efetivamente pelos lisboetas e portuenses e, deste modo, visitamos os bairros tradicionais de cada cidade. Em agosto, deparámo-nos com uma loja que se destacava pela sua fachada única numa zona de prestígio da cidade, Av. Alvares Cabral (Rato) e de imediato ficamos apaixonados pela loja e pela zona. De seguida, surge no Porto a hipótese de entrar no Mercado do Bom Sucesso que tem albergado projetos fantásticos e que neste momento é um dos principais pontos de encontro dos portuenses. Ficámos indecisos sobre o que fazer, pois só tínhamos previsto abrir uma loja, mas após algumas indecisões tomámos a opção de levar a marca para um patamar nacional com presença nas duas principais cidades do país até porque o mercado de chocolate no Norte é muito dinâmico e curiosamente das cinco maiores marcas nacionais, quatro são do Norte!
Fase “mais conturbada” do projeto
Em setembro iniciámos obras e entrámos na fase mais conturbada do nosso projeto, combinando algumas indefinições de projeto com a ansiedade natural de abrir rapidamente e ao cometermos alguns erros e desvios ao projeto financeiro tivemos que adiar a nossa abertura para finais de novembro (dezembro no Porto) e se algo aprendemos com isto é que não devemos menosprezar os prazos de obras e provisionar devidamente os seus desvios!
No final de novembro abrimos portas e com os níveis de ansiedade ao máximo! As primeiras enchentes de fãs da chegaram logo no primeiro fim de semana, os pedidos de abertura de loja foram inúmeros (mais de quarenta na primeira semana). No primeiro mês ficamos sem stock três vezes (quando em teoria a primeira encomenda estava pensada para um mês). A loja de Lisboa foi a melhor abertura de loja que a marca teve na sua história num mercado novo. A principal recomendação que podemos fazer é investir muito num ‘business plan’ credível onde exista um estudo sério, completo e detalhado do mercado, seja traçada um objetivo claro e real para a marca e nunca esquecer de explicitar os meios para alcançá-lo. Foi, sem dúvida, isso que nos distinguiu entre centenas de candidatos e que fez a grande diferença. É fundamental a marca acreditar que não está perante mais um dos “curiosos” que todos os dias enviam emails pensando que é só preciso ter dinheiro para implementar uma marca quando afinal para uma grande marca interessa muito mais a visão que temos da mesma. Sucesso garantido não existe mas pelo menos há que criar as bases para o mesmo e acreditamos que as nossas foram bem alicerçadas numa marca com 102 anos e 1500 lojas no mundo onde a nossa tarefa será apenas de “conduzir” corretamente a mesma, pois a qualidade e sucesso estão há muito comprovados!