Retrato do consumo desde 2008 até hoje
A tecnologia tem sido e continuará a ser um dos grandes factores de mudança do comportamento dos consumidores
Rita Gonçalves
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A tecnologia tem sido e continuará a ser um dos grandes factores de mudança do comportamento dos consumidores.
Mais do que alterar os padrões de consumo, a crise económica, cujos efeitos se começaram a fazer sentir no final de 2008, provocou mudanças no próprio comportamento do consumidor português.
“Nos últimos anos, o consumidor esteve em modo de gestão de crise, demonstrando uma enorme capacidade de adaptação. Cortou nas despesas menos úteis e adoptou um comportamento mais responsável”, explica em entrevista ao HIPERSUPER Diogo Lopes Pereira, director de marketing do Cetelem.
“A era do consumismo individual terminou no segundo em que a crise começou”. Este comportamento mais responsável traduz-se num consumidor “ponderado, consciente, informado, atento, perspicaz e que não pretende deixar escapar as melhores oportunidades de compra”.
Não há muito tempo, em meados de 2013, um inquérito do Cetelem dava conta que um em cada cinco portugueses afirmava não ter meios para consumir. A necessidade aguça o engenho. Sem meios para consumir, o ‘shopper’ fez renascer o consumo colaborativo, que assume várias formas, como a partilha, a troca de produtos, as compra em grupo, a reciclagem, a compra em segunda mão, entre outros.
No ano passado, os portugueses foram mesmo os europeus que mais reciclaram e estão entre os povos do velho continente que mais tenciona fazê-lo no futuro.
Consumo alimentar
A indústria dos bens de consumo está entre as que melhor resiste à crise, revela Ana Paula Barbosa, retailer services director da Nielsen. “Nos últimos cinco anos, o consumo total dos lares nacionais cresceu cerca de 4%”.
As marcas próprias ganharam 10 pontos de quota, nos últimos seis anos, representando hoje 36% das vendas no retalho alimentar. Segundo o estudo global da marca da distribuição, publicado recentemente pela Nielsen, 8 em cada 10 portugueses vê a marca da distribuição como uma boa alternativa às marcas de fabricante. “Progressivamente, estas marcas foram ganhando terreno e entrando em categorias inicialmente dominadas pela marca de fabricante, como a de higiene pessoal, por exemplo. Mas, a evolução das marcas está ligada à oferta retalhista. Estas marcas cresceram muito numa altura em que os retalhistas foram alargando a oferta, hoje estão a perder importância devido à forte actividade promocional das marcas de fabricante”. Apesar do elevado ritmo promocional, as múltiplas ofertas com desconto de preço “não se têm traduzido em aumentos de vendas”, ressalva a profissional da Nielsen.
Catarina Cordas, da Daymon, acredita, por sua vez, que hoje o papel das marcas próprias é muito mais importante. “As marcas próprias, em 2008, ainda estavam no nível de se posicionarem como uma alternativa às marcas líderes. Hoje, posicionam-se de forma muito mais complexa. Tem arquitecturas de marca mais complexas e preenchem diferentes tipos de necessidade”.
O crescimento de algumas categorias no sector alimentar não reflecte, no entanto, um cenário de crise, explica Ana Paula Barbosa. “Os bens essenciais estão a perder vendas, mas em contrapartida as categorias de impulso, conveniência (refeições prontas) e ligas à saúde (dietéticos) estão com um grande dinamismo. Por outro lado, a restauração começa a dar sinais de recuperação. Estes factos parecem indiciar um contexto mais favorável para o consumo. Um consumidor mais confiante tende a procurar mais as categorias de impulso, a conveniência e a inovação”. Hoje, os ‘shoppers’ estão a consumir menos leite, acúcar, sal e gorduras porque os padrões de consumo alteraram-se para privilegiar alternativas mais saudáveis.
Consumo não alimentar
Desde 2008, os produtos da área não alimentar perderam mais de 20% da facturação, revela ao HIPERSUPER Miguel Faias, retail manager da GFK.
“A juntar a esta tendência negativa, deu-se ainda a concentração das vendas em uma ou duas famílias de produtos, como as TV em electrónica de consumo e os smartphones em telecomunicações, reduzindo bastante as vendas de outras famílias pelo efeito de canibalização”.
O entretenimento, devido à falta de novidades, e os videojogos e consolas, pela depreciação do preço, acabam por ser “as categorias mais afectadas pela quebra no consumo não alimentar”. Por outro lado, as marcas da distribuição duplicaram a sua dimensão, no período em análise, nos sectores da electrónica de consumo e grandes e pequenos domésticos. Mas, esta é a decada dos smartphones e tablets. “Estes dois produtos tem registado fortes crescimentos anuais desde o seu aparecimento”. O sector da fotografia é, por outro lado, o mais afectado pelas transferências de consumo entre categorias.
Para promover o consumo, os retalhistas têm vindo a apostar em “comunicação, marketing e muitas campanhas e promoções para manterem os produtos não alimentares na mente dos consumidores”. As marcas, por sua vez, continuam a apresentar produtos apelativos que os consumidores querem comprar.
E o consumo online, tem ajudado o sector a recuperar consumidores? “Estima-se que a percentagem de compras em sites não baseados em Portugal ou sem página em português estão a acelerar fortemente”. O consumo offline, esse, é que era “quase totalmente inexistente e hoje continua pelo mesmo caminho, principalmente comparando com a realidade de outros países europeus”.
Segundo Miguel Faias, são três os factores que contribuem para a não evolução das vendas online. “Em primeiro lugar, os principais sites nacionais pertencem a empresas ‘click&mortar’, com os inevitáveis problemas associados a retalhistas que têm site e lojas físicas (preços venda, oferta, entre outros). Em segundo lugar, falta aos ‘pure players’ terem lojas físicas por forma a credibilizarem o seu nome. O consumidor português ainda o exige. Esta situação é, na minha opinião, crítica para o sucesso de um retalhista somente online em Portugal. Por último, as constantes promoções e campanhas feitas pelos retalhistas físicos/click&mortar”.
Consumo off versus online
“A crise permitiu, de certa forma, a consagração da Internet”, acredita Diogo Pereira. “Para a maioria dos consumidores, a Internet tornou-se um importante aliado, uma fonte incomparável de informação para efetuar a melhor compra. Para muitos outros, deixou de ser apenas uma fonte de informação e transformou-se num importante canal de compra. Se, em 2008, ainda eram poucos os que se aventuravam no e-commerce, em 2013, o Cetelem constatava que 72% dos portugueses já tinham efectuado pelo menos uma compra online”.
A Internet tornou-se um canal de compra privilegiado, “provavelmente por ter a característica de acompanhar o comprador ao longo de todo o seu percurso, desde a pesquisa de informação até ao pagamento. Estima-se que em Portugal, entre 2011 e 2012, o mercado do e-commerce tenha crescido cerca de 17%, um aumento significativo”.
Mas, curiosamente, e ao contrário do que se pensou durante muito tempo, a Internet não veio substituir as lojas tradicionais e de ameaça passou a aliada. “Ao longo destes últimos anos verificou-se que existe uma verdadeira interdependência entre lojas e Internet e, por esse motivo, separar o online do offline deixou de fazer sentido. Tem havido uma verdadeira fusão, com a web cada vez mais presente nos próprios pontos de venda, através dos smartphones, tablets e dos terminais de informação”.
Mais do que um canal de compra, a Net é, sobretudo, um canal de acesso à loja tradicional. “Apesar da comodidade da compra online, as lojas possuem duas vantagens que a Internet não pode oferecer neste momento: um espaço físico, para expor produtos e oferecer uma experiência ao consumidor, e a força de vendas, para orientar os clientes e contribuir com o seu conhecimento. Nesse sentido, podemos falar numa transferência da web para a loja, que mostra que a Internet não veio substituir os pontos de venda físicos, mas sim complementá-los”.
Quais os principais impulsionadores dessa mudança? “A adopção dos smartphones permitiu aos consumidores terem uma ferramenta extremamente potente de informação e de comparação de preços nas suas mãos e o menor rendimento disponível obrigou os consumidores a adoptarem um consumo mais inteligente. Face a isso, a Distribuição foi obrigada a lutar por um rendimento disponível menor através de mais campanhas promocionais e com uma preocupação grande de assegurar e comunicar preços competitivos”, explica o director de marketing da Cetelem.
Perspectivas para 2015
“Enquanto o estado de espírito das pessoas não estiver totalmente assente na confiança, os retalhistas do sector não alimentar continuarão a registar fracos índices de fidelidade, elevados níveis de oportunismo, por parte dos consumidores que mudam de local de compra com muita facilidade, em busca do negócio mais compensador”, acredita o Retail Manager da GFK. Assim, em 2015 as promoções deverão continuar a ser a grande aposta para conquistar consumidores.
Ana Paula Barbosa prefere não fazer prognósticos, uma vez que o consumo vai seguir a estratégia seguida pelos retalhistas e marcas, mas aconselha os operadores do sector a investir numa estratégia de valor. “Em primeiro lugar, optimizar as ofertas de preço, apostando apenas nas categorias e marcas mais sensíveis a estas ofertas, pois há reacções muito diferentes entre marcas e categorias. Em segundo, procurar inovar em dinâmicas promocionais que reforcem a lealdade do ‘shopper’, focando a estratégia na qualidade mais do que na quantidade, há que voltar a trabalhar o valor da marca. Por último, tirar partido dos novos padrões de consumo, através de ofertas diferenciadoras e, neste campo, a inovação tem sido um motor de crescimento para algumas marcas e categorias”.
Se há uma tendência confirmada para o próximo ano é o mobile commerce, assegura o director de marketing do Cetelem.”As utilizações standard da Internet, já bem enraizadas nas novas modalidades de compra dos consumidores, abrem caminho para o aparecimento de novas práticas. A web móvel, através dos smartphones e tablets, permite aos consumidores digitalizarem as suas compras nas grandes superfícies, utilizarem novas aplicações comerciais ou ainda fazer o pagamento de serviços e bens. O Cetelem já falava nesta tendência em 2013, revelando que 12% dos portugueses já faziam as suas compras num smartphone ou tablet, valor que pode chegar aos 35% muito em breve. Assim, graças ao m-commerce os consumidores não terão necessidade de estar à frente do ecrã do computador para fazer as suas encomendas, poderão fazê-lo em qualquer lugar, como nos transportes públicos ou em casa dos amigos. Trata-se de um consumo cada vez mais cómodo e inovador”.
Diogo Pereira está convencido que a aposta nas promoções vai continuar até porque 87% dos portugueses pretendem procurar sistematicamente o preço mais baixo no futuro.
A tecnologia vai ser o principal impulsionador destas transformações. “A tecnologia será um dos grandes factores de mudança dos comportamentos de consumo, contribuindo com meios de pagamento novos, mudanças nos canais de distribuição, obrigando as marcas e distribuidores a adaptarem-se. Sendo que a web pode gerar fluxos nas lojas, pode aumentar a fidelização dos consumidores e desempenhar um papel fulcral no percurso dos clientes. A última edição do Observador Cetelem (2014) revela por exemplo que 76% dos portugueses terão vontade de ir à loja se o site de uma marca tiver qualidade e que 68% serão mesmo convencidos a ir a um espaço comercial se lhe forem apresentadas as ofertas promocionais das prateleiras nos seus smartphones em tempo real. Isto prova que os consumidores estão expectantes e que moldar e introduzir a Internet na loja só pode gerar sinergias benéficas”, remata o director de marketing do Cetelem.