Ana Isabel Trigo Morais, diretora geral da APED
Distribuição debate futuro
A directora-geral da APED, Ana Isabel Trigo Morais, faz um balanço do V Congresso da Associação e enumera, em discurso directo, as principais tendências e desafios do sector
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Por ocasião do IV Congresso da Distribuição Moderna em Portugal, fomos entrevistar a directora-geral da APED, Ana Isabel Trigo Morais, para fazer o rescaldo do ‘encontro’ e releembrar as melhores apresentações.
Que balanço faz do V Congresso da APED?
O balanço que podemos fazer desta edição é o balanço daquilo que fomos ouvindo, estiveram cerca de 400 pessoas no congresso. Um conjunto de comentários e impressões muito positivas dando-nos nota que valeu muito a pena. Deram-nos os parabéns pela escolha do tema da inovação porque na realidade em todo o mundo o que está em agenda e em discussão é a inovação de processos, de produtos e no campo da sustentabilidade.
Todos sabemos que o retalho é um sector competitivo, que compete criando modelos de negócio muito diferenciados entre si e, portanto, também propostas de valor diferenciadas para o consumidor. Mas, há um coisa que os une a todos, o investimento em inovação, constante e permanente, não só dos retalhistas, mas de toda a cadeia de valor.
A escolha do mote deve-se ao facto de a evolução do retalho passar pela inovação?
Sim, mas sobretudo porque é o grande desafio do futuro, num mercado competitivo, global e muito concorrencial, para conquistar e cativar o consumidor. Os processos de inovação são fundamentais porque também é através desses processos que os retalhistas competem entre si e conquistam o coração do consumidor.
Qual a evolução face à última edição?
Em primeiro ligar, criámos este ano o Prémio Inovação no Retalho – o primeiro prémio criado em Portugal que se dedica exclusivamente a premiar processos de inovação dos retalhistas. Temos três categorias: sustentabilidade, inovação nas marcas da distribuição e nos processos. Há imensa inovação que tem sido introduzida e o consumidor sente-a todos os dias na loja.
A segunda evolução foi uma grande adesão de participantes, não só do sector da distribuição, mas também outros ‘stakeholders’ muitos interessados nestes temas, desde logo empresas fornecedoras, produtores, porque é um congresso aberto a todos.
Em terceiro lugar, deu-nos muito gosto ter a presença do Primeiro-Ministro no congresso, que deixou uma mensagem sobre a importância que o consumo interno tem para o crescimento económico do País e para o período complexo que se avizinha, a saída do programa de assistência financeira internacional.
O consumo interno é fundamental para todos os associados da APED, os associados vivem do que as famílias consomem todos os dias. O seu trabalho é preparar a melhor proposta e oferecer o melhor valor às famílias. E valendo o consumo interno 60% do PIB [Produto Interno Bruto] a mensagem que [Passos Coelho] deixou foi importante não só para a APED mas para todas as famílias portugueses.
Os prémios são para repetir?
Sim, é para repetir. Queremos dar palco à excelência, tivemos a honra de ter o Marcelo Rebelo de Sousa na Presidência do Júri, e outros destacados membros da sociedade portuguesa. Estamos convencidos que há muita inovação para mostrar e que os próximos anos vão ser de investimento em processos de inovação no retalho.
Quais os principais desafios que se colocam ao sector da distribuição, segundo os oradores do congresso?
Destaco a discussão feita a propósito da nova parceria transâtlantica para as relações comerciais entre os EUA e o espaço europeu. Consideramos que é um tema de grande relevo para o retalho e para os agentes económicos portugueses, porque isso vai colocar Portugal, devido à sua posição geoestratégica, num lugar em que poderá ter grandes oportunidades para fazer a economia crescer, nomeadamente através das exportações, mas também beneficiando de um mercado mais alargado de consumidores. Podermos ter, mesmo ao nível do retalho em Portugal, uma diferenciação de produtos alinhada com esse grande mercado.
Portugal pode deixar de estar na ponta da Europa para se colocar no centro do mundo geopolítico. É um passo importante e isso mesmo foi frisado pelo embaixador da UE nos EUA João Vale de Almeida, que aliás usou uma expressão notável. ‘Provavelmente, estamos a discutir o tratado internacional mais importante a seguir à criação da Nato’, disse. Acreditamos que um novo rearranjo geo-económico pode beneficiar todo o espaço europeu, o continente americano mas sobretudo Portugal. Com as dificuldades que tem pela frente, e sabendo nós que as exportações serão sempre o motor de desenvolvimento das nossas empresas, do investimento e da inovação que as empresas precisam de introduzir para competir nos mercados exteriores, será sempre muito positivo para o retalho e para a economia como um todo.
Quais são, por outro lado, as principais tendências que regem este sector?
Houve duas coisas que me marcaram muito. Primeiro esta mistura entre o mundo digital e o mundo analógico. Andamos há muitos anos a discutir a omnicalidade, as vendas online, todos os retalhistas no mundo inteiro têm dado passos muito importantes nessa matéria, a tecnologia tem evoluído imenso, hoje em dia quase se diria que deixámos de fazer compras com os pés para passar a fazer com as pontas dos dedos nos nossos tablets e smartphones. Marcou-me muito esta perspectiva que foi deixada pelo futurista e estratega em inovação Anders Sörman-Nilsson, de que estes mundos vão continuar a coexistir sendo certo que a desmaterialização e o mundo digital vai continuar a ter crescimentos exponenciais. Mas, isso também vai ser um reflexo do perfil do mundo que temos: duas gerações que estão a viver ao mesmo tempo no mesmo planeta, mas em mundos diferentes. Temos uma população mais envelhecida, e, diria eu, mais analógica, e temos uma ‘young generation’ que vive no mundo digital.
E a segunda?
A segunda tendência que me marcou foi aprofundada por Andrew Winston. O perito em sustentabilidade teve a coragem de assumir, às claras, afirmando-o com transparência, que a sustententabilidade passa muito pelo ‘green business’, ou seja a sustentabilidade é uma atitude de responsabilidade social das empresas, mas as empresas têm de passar a assumir o negócio verde e perceber que a sustentabilidade não é uma opção mas sim um caminho inevitável. E que isso trará impactos relevantes para o negócio. A sustentabilidade é mais uma ferramenta para gerir o negócio e faz parte do modelo de negócio. O orador alertou-nos para o aumento da população noutras geografias, a escassez de recursos – a água vai continuar a ser um problema complexo – e, portanto, esta ideia que no retalho é preciso incluir a sustentabilidade como ferramenta de negócio.
A ideia de que a sustentabilidade deve ser encaraca como um negócio?
A ideia de que a sustentabilidade evoluiu da política de responsabilidade social para uma dimensão de negócio, onde as empresas são ambientalmente mais sustentáveis e melhoram os resultados dos negócios.
Em 2013, tivemos talvez o ano de maior ritmo promocional no comércio. Este tema foi discutido?
Sim, trouxemos o director internacional da Nielsen, conhecedor do retalho na Europa. Desde 2012 e, em 2013, a forma como a distribuição construiu a sua resposta a esta brutal quebra do consumo interno foi intensificando a actividade promocional. As nossas estimativas apontam que, em 2013, tivémos já um pouco mais de 25% das vendas feitas em ambiente promocional. Foi a grande resposta da Distribuição à quebra de consumo e de rendimento das famílias.
Mas, Jean-Jacques Vandenheede, disse-nos uma coisa engraçada, que o movimento promocional é uma caracteristica da concorrência entre os retalhistas, o que é bom, porque mostra que há competitividade e quem beneficia é o consumidor. São os retalhistas que melhor conseguirem construir esta proposta de valor que melhores resultados terão. Mas, também nos deixou uma provocação. Uma nota de que a actividade promocional quando é demasiadamente intensa traz também outros problemas, vicia o consumidor nas promoções e obriga o retalhista a ir alimentando esse vicio com impactos internos no seu negócio. Foi um alerta e o espelho do que aconteceu noutras geografias porque não é só em Portugal que há uma actividade promocional forte. Em Portugal é muito forte porque há muita concorrência entre os grande oito retalhistas dos sector alimentar a operar no País mas também é um sinal que tivemos esta crise no poder de compra das pessoas.
É convicção da Associação que este clima promocional vai arrefecer ou, pelo contrário, intensificar-se?
O que a APED gostaria de ver era os consumidores a melhorarem o seu poder de compra e que as famílias deixassem de ter tantas restrições. As famílias estão sujeitas a uma elevadíssima carga fiscal, e o fenómeno do desemprego, esta grande factura social como já muitos designam, é um problema que não se vai resolver rapidamente. Como sabemos, isso vai acontecer a um ritmo lento, apesar de alguns sinais positivos que começaram a ser desenhados no segundo trimestre de 2013 e foram ganhando consistência ao longo do ano. A nossa expectativa é que haja aqui de facto um crescimento no consumo interno.
A APED está profundamente convecida que os associados continuarão a competir quer com promoções quer com inovação e conveniência para conseguirem as melhores propostas.
Em 2013, foram indentificadas 80 formas diferentes de promocionar produtos no mercado português, segundo a Kantar, o que é bem a medida da criatividade do retalho em Portugal.
Que outras frases lhe ficaram no ouvido?
Lars Peter Hansen, Prémio Nobel da Economia 2013, deixou-nos duas ou três ideias fundamentais. A primeira ideia é a de que nos modelos de previsão macro-económicos a incerteza é muito maior do que aquela que se julga. Nós vivemos num mundo cheio de incertezas. O que Hansen tenta fazer no seu trabalho é reduzir a incerteza para reduzir o risco da decisão que vai tomar. Essa ideia que talvez seja melhor nós percebermos que há muito risco e muita incerteza no que está à nossa frente, é importante porque às vezes quem fala com tantas certezas, não o poderá fazer, porque a incerteza em macro-economia é grande.
Na segunda nota, o Prémio Nobel reconheceu que Portugal conseguiu fazer um ajustamento muito rápido. Sendo certo que há ainda muito para mudar, a verdade é que quem vem de fora consegue ver melhor as coisas positivas que estão a acontecer no nosso País.
E disse-nos ainda que retalho e a actividade do comércio são fundamentais para fazer a ligação com outras actividades muito importantes para o crescimento económico, desde logo com o turismo, a restauração e a indústria local.
Alguma ideia sobre o futuro do comércio de proximidade?
Sim, inevitavelmente, falou-se da evolução no mundo, não só em Portugal. O retalho que cresce mais no espaço europeu é no retalho de proximidade, o que é um acompanhar da evolução das características da população e do envelhecimento.
E temos vindo a assistir a uma especialização desse comércio, não temos só um formato de loja que vai para um local mais perto dos consumidores, vemos que são lojas especializadas, preparadas já para satisfazerem determinadas necessidades, lojas com equipamentos desportivos, parafarmácias, lojas de produtos biológicos. O retalho acompanha as necessidades do consumidor. Isso também explica que o comércio de proximidade seja no global o formato que mais cresce e cresce de forma mais especializada em categorias de produtos que correspodem às necessidades daquela geografia.