Água tem de unir e o país não pode parar
Portugal atravessa um período desafiante no contexto político, mas se há setor que não pode esperar é o da agricultura. O país precisa de um compromisso sólido para garantir condições à produção agrícola, valorizando a água como recurso vital e estratégico.

A estratégia nacional para a gestão integrada da água – Água que Une – é um passo importante nessa direção e no combate às alterações climáticas. Desenvolvida pelas Águas de Portugal, Agência Portuguesa do Ambiente, Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural e Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva e apresentada pelos Ministérios do Ambiente e Energia e da Agricultura e Pescas, esta estratégia dá respostas à necessidade de o país ter uma gestão mais eficiente dos seus recursos hídricos.
Dentro desta estratégia está o Perímetro de Rega do Mira (PRM), um dos maiores ativos do setor agrícola nacional, que produz mais de 50 produtos, com incidência nas frutas e hortícolas, que abastecem o mercado nacional e internacional. A procura existe e a qualidade destes produtos é conhecida e reconhecida pelos consumidores.
No entanto, o potencial do PRM não está a ser plenamente aproveitado. Em 2023 gerou 502 milhões de euros em Valor Acrescentado Bruto, 134 milhões de euros em receita fiscal e 16.500 postos de trabalho. Os números poderiam ser cerca de 40% superiores se toda a sua capacidade fosse utilizada, como comprovado pelo estudo da EY sobre os “Impactos do PRM e da produção e comercialização de pequenos frutos”. Um verdadeiro cluster agroindustrial muitas vezes esquecido e que urge concretizar.
A necessidade de mão de obra é outro desafio incontornável. Portugal precisa de um plano realista de integração dos migrantes que vêm trabalhar para o nosso país, para a agricultura, mas também para construção, para a restauração, para a hotelaria, o comércio a saúde ou os serviços. Para o país ser economicamente sustentável e competitivo, a mão de obra tem de ser gerida com a mesma visão estratégica que aplicamos à água ou à inovação tecnológica. A prosperidade do setor está diretamente ligada à qualidade de vida daqueles que nele trabalham; criar políticas de integração não é apenas um dever ético e moral, é uma necessidade económica.
A imprevisibilidade das políticas para o setor agrícola torna-se um entrave ao investimento e à inovação. Portugal precisa de uma estratégia de longo prazo que assegure estabilidade e confiança aos produtores e à indústria. A desburocratização é essencial para agilizar processos e eliminar barreiras artificiais ao crescimento, assim como o investimento na água. Sem infraestruturas adequadas e uma política de gestão eficiente, a agricultura fica refém da variabilidade climática. Não se trata apenas de aumentar a capacidade de armazenamento, mas de otimizar o uso da água e promover a sustentabilidade.
Os produtores agrícolas continuam a inovar e investir em sustentabilidade e eficiência hídrica, mas sem uma estratégia concertada entre os setores público e privado, que garanta a resiliência hídrica do país nas próximas décadas, os avanços conquistados correm o risco de estagnar.
Num mundo de instabilidade crescente, onde cadeias de abastecimento são interrompidas por crises energéticas e conflitos, apostar na agricultura é apostar em Portugal, na sua riqueza e no fortalecimento da sua autonomia alimentar. A agricultura não é apenas uma atividade económica; é uma questão de soberania. O futuro do país passa pelo setor agrícola, e este está pronto para o desafio.