O papel do ESG na “next economy”
O ESG é um fator chave na chamada next economy? Estão as empresas determinadas a adotar este caminho de mudança nas áreas ambiental, social e de governança? João Cruz (BCSD Portugal), João Guerra (Nickel) e Maria Antónia Saldanha (Mastercard) dão resposta às questões
Rita Gonçalves
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O ESG é um fator chave na chamada next economy? Estão as empresas determinadas a adotar este caminho de mudança nas áreas ambiental, social e de governança? João Cruz (BCSD Portugal), João Guerra (Nickel) e Maria Antónia Saldanha (Mastercard) dão resposta às questões
A sustentabilidade e as práticas ESG (Environmental, Social and Governance) estão a ganhar notoriedade junto de cada vez mais consumidores e empresas. Também os investidores estão mais despertos para as medidas ambientais, sociais e de boa governança adotadas pelas organizações, privilegiando nos seus investimentos empresas com boas práticas. Segundo um estudo da Deloitte, entre 2017 e 2019, o número de investidores, a nível mundial, que aplicaram os indicadores de ESG em, pelo menos, 25% dos seus investimentos cresceu 48%.
É, neste contexto, que a Mastercard promoveu o debate “ESG como fator-chave para a next economy” por ocasião do seu evento anual dedicado à inovação, com o objetivo de dar resposta às questões “Será o ESG um fator-chave para a chamada next economy?”; “Será esta simples sigla determinante para a sobrevivência das organizações num futuro próximo?”; “Estarão as empresas conscientes da sua importância e determinadas a adotar este caminho de mudança?”.
No caso do BCSD Portugal, que assinala 22 anos de vida este mês, tem como missão ajudar as empresas a fazer a transição para a sustentabilidade. “As empresas encontram nesta transição potencial para fazer a diferença, usando a economia para transformar a vida das pessoas no planeta”, assinala João Cruz, diretor de operações da organização para o desenvolvimento sustentável. O trabalho do BCSD assenta, entre outros, na criação de grupos de trabalho (os membros podem associar-se àqueles que consideram ser mais úteis para a sua empresa, trocando experiências com empresas com o mesmo tipo de desafios) e na promoção de estudos sobre questões ligadas à biodiversidade, ao carbono, à diversidade, à propriedade e à inclusão.
“A partir da identificação das necessidades das empresas vamos criar as soluções que estas precisam”, afirma João Cruz. “Sentimos muito perto a necessidade que as empresas têm de navegar neste mundo, até porque há exigências regulamentares cada vez maiores e só as grandes empresas se encontram no patamar para conseguir dar cumprimento. O BCSD pode contribuir para fazer, também, esta diferença”, garante.
“A inclusão social está no ADN da Nickel porque está na base da sua criação”, diz, por sua vez, João Guerra, CEO da Nickel Portugal, instituição de pagamento que funciona através de pontos de venda, como quiosques e mercearias, com um ano de presença no país. A empresa subsidiária do BNP Paribas que utiliza estabelecimentos do comércio local como seus agentes permite abrir uma conta em cinco minutos.
“A Nickel é uma conta inclusiva. Por uma razão muito simples: é muito acessível, quer pelo preço quer pela facilidade em abrir conta num ponto de venda, que tipicamente não tem as restrições e burocracias da banca internacional. Além disso não olha aos rendimentos e à origem das pessoas”, sublinha João Guerra, acrescentando que o facto de todas as pessoas poderem, efetivamente, ter uma conta, é “o primeiro passo para a inclusão financeira. E a inclusão financeira é, depois, um dos pilares principais para a própria inclusão social. Isto é dito até pelo próprio Banco Mundial”, sublinha.
Na sua opinião, o serviço também contribui para aumentar a literacia financeira dos utilizadores. “Quando a pessoa começa a utilizar, começa a ter noções muito simples de poupança, de gestão orçamental, a partir do momento em que consegue cruzar as receitas com os custos e com a intenção de poupança. É uma espécie de ‘learning by doing’ que leva também ao crescimento da literacia financeira”, defende.
João Guerra dá mais exemplos de pequenas medidas de inclusão. Os cartões de pagamento têm um pequeno corte que permite aos invisuais saber em que posição o devem colocar para o usar no ATM. A Nickel implementou também a funcionalidade True Name, criada pela Mastercard, que permite a quem é cliente personalizar o seu cartão de débito com o nome com que realmente se identifica, sem requerer a mudança legal do mesmo. Esta personalização, que já se encontra disponível na opção de cartão My Nickel, “representa um passo importante ao contribuir para que as pessoas trans e não-binárias possam ver as suas verdadeiras identidades reconhecidas no cartão de débito que usam com frequência no seu dia a dia”.
Nos nove anos de atividade em França, a empresa constatou, a partir de um estudo, que 93% dos clientes sentem mais liberdade, independência financeira e capacidade de gestão orçamental com este tipo de serviço. Em média, os clientes conseguiram poupanças de 150 euros por ano. Em relação aos agentes, estes dizem que o serviço da Nickel traz mais negócio pela relação de confiança criada com os estabelecimentos e que sentem orgulho pelo trabalho desenvolvido junto da comunidade, indica o estudo.
Pegando na ideia de literacia, João Cruz salienta que também as empresas têm de aumentar o seu conhecimento para abraçar o ESG. “É preciso aumentar as competências e em Portugal não há muita formação superior nas áreas de sustentabilidade”, defende, salientado, no entanto, um ponto positivo. “As empresas têm, hoje em dia, pessoas com um interesse genuíno nesta temática”. E não é apenas capacitar os funcionários que trabalham as temáticas da sustentabilidade. “Este é um tema que interessa a todos e une os colaboradores num propósito comum. Percebem que a empresa está a caminhar nesse sentido e sentem-se também mais relacionados com o propósito da empresa, o que é ótimo para reter talento, também”, sublinha o responsável da BCSD.
“Fortes e capacitadas”, as empresas passam a estar um passo à frente na inovação e são mais resilientes, defende João Cruz, destacando a urgência de aumentar o conhecimento. “A regulamentação vai apertar cada vez mais, a urgência climática é evidente para todos e empresas vão precisar mesmo de ter pessoas com propósito e know-how nestas matérias. E se conseguirmos estender isso à massa da empresa, será perfeito”.
Apenas 8% dos portugueses sabem exatamente o que são os critérios ESG, segundo um estudo da Mastercard. A boa notícia é que não sabem mas querem saber, salienta Maria Antónia Saldanha, country manager da empresa de pagamentos. “Os consumidores estão cada vez mais exigentes e sofisticados e isso obriga a que as empresas sintam que não está tudo feito”, afirma a gestora, acrescentando que também a inovação é um ponto a favor. “Não só é a forma certa de fazer as coisas como permite inovar nos negócios”, dando como exemplo o lançamento da calculadora da pegada de carbono que permite ao consumidor saber qual é a pegada da compra que fez e como pode compensar.
Num exercício de adivinhação, João Guerra define as organizações da next economy como empresas que disponibilizam produtos simples e úteis focados na experiência do utilizador mas, acima de tudo, com propósito, geradoras de um impacto positivo na sociedade e que pratiquem preços que as pessoas estão dispostas a pagar.
Ainda vamos a tempo de salvar o planeta? “Considero-me uma pessoa positiva, mas acho que tem de haver medidas mais fortes quer pela parte das empresas quer pela parte dos estados. Medidas por exemplo de âmbito fiscal. Enquanto as ações e os comportamentos das empresas, aquilo que fazem de bem e do mal, nomeadamente no sistema ambiental, não tiver reflexo nas suas contas, dificilmente vamos lá”, termina o CEO da Nickel.
*Artigo originalmente publicado na edição 417