Os atrativos da segunda mão para a distribuição moderna
O conceito de reutilização de artigos de moda está a ganhar espaço nas grandes superfícies alimentares e especializadas. Auchan, Continente e Kiabi partilham a sua visão e expectativas sobre este mercado em crescimento em Portugal, à boleia das tendências internacionais
Rita Gonçalves
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O conceito de reutilização de artigos de moda está a ganhar espaço nas grandes superfícies alimentares e especializadas. Auchan, Continente e Kiabi partilham a sua visão e expectativas sobre este mercado em crescimento em Portugal, à boleia das tendências internacionais
O conceito de venda de roupa em segunda mão chegou à distribuição moderna, de base alimentar, em 2020, através de uma parceria entre a Auchan Retail Portugal e a MyCloma, loja online portuguesa de compra e venda de roupa em segunda mão, fundada por quatro jovens empreendedores portugueses há pouco mais de dois anos. O projeto materializou-se com a criação dos espaços “ReUse” nos hipermercados da retalhista de origem francesa e a oferta de uma coleção de artigos em segunda vida das principais marcas de moda, a preços mais acessíveis. Os espaços “ReUse” podem ser encontrados já em nove hipermercados (Guimarães, Maia, Matosinhos, Gaia, Alverca, Alfragide, Almada, Faro e Portimão), mas, ainda este ano, a Auchan inaugurará mais um no hipermercado da Amadora, avança Arlete Paiva, diretora de Universo Têxtil, em entrevista ao Hipersuper.
“Este projeto tem como objetivo combater o desperdício têxtil e promover a economia circular, e permite aos clientes comprar roupa
em segunda mão, em excelente estado de conservação, a preços acessíveis”, adianta Arlete Paiva, classificando o projeto como “um sucesso” desde que foi introduzido em loja. “A procura tem sido muita, o que corresponde às tendências atuais dos consumidores de optarem por produtos e serviços mais sustentáveis e, neste caso, mais acessíveis a nível de preço”.
O preço é um dos principais atrativos desta proposta de valor, para quem compra e para quem vende. Por cada entrega de roupa nestes espaços, é oferecido um vale de 10 euros para gastar nas lojas Auchan e mais 15 euros para utilizar no site da MyCloma. A questão do preço tem um grande peso, evidencia Arlete Paiva. “No atual contexto, com a taxa de inflação tão elevada, sentimos que os consumidores têm de fazer mais escolhas nas suas compras e os primeiros cortes recaem sempre em bens não alimentares”.
Por outro lado, a sustentabilidade é também um peso pesado no mercado de segunda mão, sobretudo para as novas gerações que “têm em consideração o impacto da moda fast fashion num mundo que se quer mais sustentável” e circular, considera a responsável. Os jovens estão quase sempre online, têm acesso facilitado à informação e quando são confrontados com os dados (como este: 200 mil toneladas de roupa vão para o lixo em Portugal todos os anos) sentem necessidade de agir e dar o seu contributo.
Seja quais forem as motivações de compra, uma coisa é certa: o potencial de crescimento “é enorme”. Em Portugal isso é bem notório no número de marcas a lançar plataformas online e espaços físicos assente neste modelo de negócio mais ecológico e sustentável.
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“Tendência de futuro em franco crescimento”
Em outubro deste ano, foi a vez da cadeia alimentar da Sonae apostar no mercado de segunda mão com a criação de dois espaços “[RE]Style” instalados nas áreas têxteis das lojas Continente GaiaShopping, em Vila Nova de Gaia, e Continente Colombo, em Lisboa. A oferta assenta numa gama de vestuário de homem e mulher, com peças de diferentes estilos de marcas conceituadas.”Os resultados têm sido muito positivos e ainda mais reforçados com a expansão para uma segunda loja, a do Colombo”, conta Graça Fernandes, category leader de Têxtil na MC, em entrevista ao Hipersuper. O projeto piloto, lançado em parceria com a empresa portuguesa Retry, que já opera no mercado de compra e venda de roupa em segunda mão através da sua plataforma online, vai contar com mais uma abertura até ao final deste ano.
“O plano de expansão mais alargado ocorrerá ao longo de 2023”, anuncia a responsável. Para a gestora da Sonae, a venda de roupa em segunda mão apresenta um enorme potencial em Portugal porque “o eixo da sustentabilidade a nível mundial confere ao mercado uma elevada motivação para explorar oportunidades de reutilização de produtos”. A oferta assenta numa gama de vestuário de homem e mulher, com peças de diferentes estilos de marcas conceituada.
Graça Fernandes considera a revenda de produtos têxteis uma “tendência de futuro”, em franco crescimento, que terá uma presença cada vez mais relevante nos próximos tempos. “Ainda estamos a dar os primeiros passos neste negócio, mas temos expectativas muito otimistas”.
O potencial deste tipo de negócio em Portugal está impulsionado pelas tendências internacionais, salienta a responsável. Os consumidores estão cada vez mais sensibilizados para o tema da sustentabilidade e da importância da contribuição de todos para a diminuição do desperdício e circularidade dos produtos, e o Continente, “enquanto retalhista líder, sabe que tem o dever de encontrar e implementar medidas que procurem minimizar o impacto da sua atividade e que contribuam para o desenvolvimento sustentável”. Graça Fernandes acrescenta ainda que um dos objetivos do Continente é democratizar o acesso a produtos que não são normalmente disponibilizados em hipermercados.
Consumidores também procuram singularidade
A retalhista encontra diferentes motivações para a compra. “A motivação de sustentabilidade, que leva o consumidor a procurar procura peças de valor acrescentado para o seu armário, a motivação da singularidade, em que o cliente procura peças diferentes e únicas que o distinguem, e a motivação económica, em que o preço apelativo das peças atrai o cliente com esta preocupação”, enumera a category leader de Têxtil na MC.
A própria forma como os consumidores encaram a compra de produtos em segunda mão está a mudar. E está a mudar rapidamente. Se até há bem pouco tempo pensávamos na segunda mão como uma alternativa de consumo para as pessoas “com poucos rendimentos”, atualmente “este consumo elevou-se e tornou-se também ele uma forma de estar, partilhado por quem quer fugir um bocadinho ao consumo de fast fashion”, afirma fonte oficial da Kiabi, em declarações ao Hipersuper. Acreditar que este mercado se tornará no “novo normal”, como alguns já defendem, é “demasiado radical”. “Acreditamos que o caminho passa pela adoção de um consumo híbrido: primeira mão, segunda mão e aluguer”. “Identificamos também uma tendência para o aluguer de produtos de moda a preços pequenos”, salienta a mesma fonte.
À medida que este mercado cresce, o perfil de consumidores tornar-se “mais amplo e abrangente”. “São todos os consumidores que não só têm menor poder de compra, mas, também, aqueles que são sensíveis à sua responsabilidade social e ambiental”.
A Kiabi estreou os corners de roupa em segunda mão nas suas lojas em França, em 2020. Atualmente, o projeto está disponível em mais quatro países europeus. “No final de setembro de 2022, contávamos com 99 lojas equipadas com um corner segunda mão, espalhadas por todo o mundo: 71 lojas em França, 13 em Espanha, cinco na Bélgica, seis em Itália e quatro em Portugal”.
Entre as prioridades da retalhista de moda de origem francesa para o próximo ano, destacam-se o desenvolvimento do processo de recolha, com o objetivo de “facilitar e aumentar a adesão dos consumidores a este género de mercado”, assim como ter, até ao final de 2023, 100% das lojas francesas com oferta de produtos em segunda mão e continuar a desenvolver o projeto de segunda mão internacionalmente.
A marca de moda francesa prevê lançar a versão digital do projeto de revenda de roupa no mercado português em 2014. Até à data, a retalhista de moda permite a venda e compra de roupa usada, independentemente da marca, apenas na loja online para o mercado francês.
A movimentação das cadeias fast fashion
No início de novembro, foi a vez da Inditex, através da sua marca âncora – a Zara – anunciar a sua entrada no mercado de segunda mão. O grupo de origem espanhola lançou um piloto de uma plataforma online de compra e venda de roupa em segunda mão no Reino Unido. Denominada “Zara Pre-Owned Service”, a plataforma, disponível diretamente no site e na aplicação mobile da Zara, oferece ainda serviços de reparação e doação de peças de roupa.
“Nesta altura, a plataforma é exclusivamente concebida como uma ferramenta para ajudar os clientes a prolongarem a vida útil das roupas e adotarem uma estratégia de consumo mais circular”, disse Paula Ampuero, chefe de sustentabilidade da Zara, em entrevista ao “The Guardian”.
Dias depois, a Mango anunciou a sua intenção de investir na startup que revende desperdícios têxteis Recovo. O acordo, estabelecido como parte do projeto Mango StartUp Studio, implica o apoio da Mango através de um empréstimo de capital convertível.
A Recovo, fundada em 2021, irá participar no programa de aceleração do Mango StartUp Studio, recebendo formação na compra e venda de têxteis, arquitetura de produto e experiência do utilizador, entre outras valências. Através da recuperação de têxteis desperdiçados, as empresas irão dar uma segunda vida a estes materiais, promovendo uma economia circular.
A retalhista online Shein também anunciou recentemente o lançamento da sua própria plataforma de troca e revenda de produtos em segunda mão (Shein Exchange), sem passar por plataformas de intermediários. O projeto piloto foi lançado no mercado norte-americano, através da aplicação da marca chinesa.
Também a Decathlon, na Bélgica, colocou o nome da insígnia ao contrário (Nolhtaced) em três lojas para promover a revenda de artigos desportivos usados.
*Artigo originalmente publicado na edição 407 do Hipersuper