Gabriel Coimbra, Country Manager da IDC Portugal
“A transformação digital é uma viagem”. Entrevista ao country manager da IDC Portugal
O HIPERSUPER entrevistou Gabriel Coimbra, country manager da IDC Portugal, para traçar o cenário atual da digitalização da indústria portuguesa
Ana Catarina Monteiro
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A IDC (International Data Corporation) cunhou o termo “3ª Plataforma Tecnológica” em 2010, quando constatou o surgimento de novas infraestruturas de informação, dentro das empresas. O conceito designa um moderno e flexível ambiente de TI (Tecnologias de Informação), responsável por ajustar os negócios à era digital. No entanto, sete anos depois, a digitalização dos negócios ganhou novos contornos com o desenvolvimento de outras tecnologias, como a Internet das Coisas, por exemplo.
Num momento em que a empresas se vêem a braços com a chamada de “4ª revolução industrial”, o HIPERSUPER entrevistou Gabriel Coimbra, country manager da IDC Portugal, para traçar o cenário atual da digitalização da indústria portuguesa.
1- Entre as novas tecnologias (Inteligência Artificial, IoT, big data/analytics, cloud computing, sistemas cognitivos, robótica, entre outras), quais considera que vão ter mais impacto na forma como são geridos os negócios em Portugal?
Nos últimos cinco anos assistimos ao amadurecimento dos quatro pilares da denominada “3ª Plataforma Tecnológica”: tecnologias cloud, mobile, social e big data, e hoje já são todas utilizadas por mais de 50% das empresas de média e grande dimensão em Portugal (apenas o big data ainda se encontra nos 35%).
Somos agora confrontados com a chegada dos “Aceleradores de Inovação”, os quais são potenciados pelas tecnologias da terceira plataforma anteriormente descrita. Estes aceleradores são a Internet of Things (IoT), a Inteligência Artificial (IA)/computação cognitiva, a realidade aumentada/virtual, a impressão 3D, a robótica e a segurança de próxima geração.
De facto, a 3ª Plataforma e os Aceleradores de Inovação estão todos interligados. Por exemplo, o real valor da IoT só é possível com big data, e o verdadeiro potencial da robótica está intrinsecamente ligado com a Inteligência Artificial. E todas estas soluções só são possíveis se tivermos soluções de segurança de próxima geração.
Esta nova geração de tecnologias potenciada pela terceira plataforma tecnológica irá ter um profundo impacto no interior das organizações pois irá permitir transformar os negócios pelo digital.
De entre estas tecnologias, a IoT é aquela que se encontra num estado de maturidade mais avançada. Mas Portugal ainda tem um longo caminho a percorrer, uma vez que atualmente apenas 44% das organizações de médio e grande porte indicam ter interesse em utilizar soluções com base na IoT, o que compara com um total de 70% na Europa Ocidental e com quase 90% nos Estados Unidos.
2- Quais as potencialidades de cada uma delas para aumentar a competitividade e a eficiência, em particular, da indústria agroalimentar portuguesa?
Praticamente todas estas tecnologias têm um potencial impacto no melhoramento da eficácia da indústria agroalimentar, e os exemplos são os mais diversos. Poderia referir a utilização de sensores para monitorização de condições do solo ou do estado de saúde e localização dos animais (IoT), drones que podem analisar o estado das colheitas e identificar potenciais pragas ou outros problemas ainda em fase inicial. A impressão 3D irá igualmente ter a prazo um profundo efeito transformacional em qualquer indústria, sendo que também a agricultura irá beneficiar, à medida que o custo desta tecnologia se vai reduzindo e o seu âmbito de atuação se vai alargando.
3- Como o novo ecossistema da Indústria 4.0 afeta a interação entre empresas, produtos e clientes?
No caso concreto da indústria, a IoT e a robótica, sustentado por AI e big data, são as tecnologias que têm vindo a mudar totalmente a forma como as empresas operam e interagem com os seus clientes e parceiros. As “coisas” ligadas oferecem agora o potencial para gerar e aceder a dados que, anteriormente, as organizações não podiam obter com facilidade, e o custo dessas tecnologias caiu significativamente nos últimos anos, permitindo um aumento da conectividade entre objetos físicos e digitais sem precedentes.
A robótica, de forma complementar, pode automatizar todo o processo de produção. Consequentemente, as organizações industriais, através do recurso ao IoT e à robótica são agora capazes de dar resposta às alterações das condições de mercado com rapidez e agilidade, e de ligar organizações, clientes e parceiros com informação em tempo real, possibilitando assim novos modelos de entrega e relacionamento e transformando significativamente a forma como as organizações desenvolvem as suas operações e os seus modelos de negócio.
4- Qual o nível médio de digitalização das empresas do setor industrial nacional e como se estima que cresça nos próximos anos?
A IDC desenvolveu um estudo no início de 2016, no qual foi solicitado aos entrevistados para caracterizar o seu próprio grau de maturidade em termos de transformação. Foram inquiridas 236 organizações e os resultados deste inquérito permite-nos verificar que, em Portugal, as organizações estão ligeiramente menos maduras no processo de transformação digital quando comparado com os resultados das empresas na Europa Ocidental.
No caso concreto do setor da indústria, o nível de maturidade é ligeiramente abaixo da média nacional, o que significa que quando comparado com a média da Europa Ocidental estamos bastante mais abaixo.
5- Quais os principais aspetos que as empresas devem ter em conta para estruturar um plano de transformação/automação tendo em conta a sua atividade?
A transformação digital é inevitável para a maioria, senão para todas as organizações. As empresas podem optar entre acomodar-se e tentar integrar essas inovações, desenvolver competências de transformação digital e tornar-se um inovador, ou adotar um meio-termo e tornar-se num seguidor rápido dos inovadores. Os líderes devem olhar para si e para as suas equipas e avaliar se têm “aquilo que é preciso” para apurar e sintetizar todos os ingredientes da transformação digital. A IDC acredita que, no que respeita à gestão e potencialização das cinco dimensões da transformação digital indicadas em seguida, a maioria das organizações não conseguirá atingir. Muitas irão tentar transformar-se através de uma série de iniciativas focadas em competências digitais específicas, o que as irá fazer perder a visão da interação e sinergias necessárias para a verdadeira transformação digital. As organizações que dominarem a orquestração das cinco disciplinas irão prosperar; as que não o fizeram irão ter dificuldades em sobreviver. As empresas devem assim estruturar um plano de transformação digital, que integre os seguintes passos:
- Avaliar o nível de capacidade das empresas em cada uma das dimensões da DX;
- Liderança;
- Omniexperience;
- Informação;
- Modelo operativo;
- Gestão de talentos;
- Identificar o nível de maturidade ideal para a empresa no contexto da sua indústria, posição competitiva e necessidades de cliente/mercado para cada dimensão;
- Em cada área, avaliar o estado atual da equipa de liderança e a sua capacidade de criar e executar a visão para a transformação digital da empresa e do(s) seu(s) ecossistema(s);
- Atribuir papéis de liderança para o desenvolvimento de planos de DX e estruturas de governação para operações, marketing, infraestrutura, cultura/organização, e assim por diante, conforme seja apropriado;
- Por último, devem avaliar os pontos fortes da organização e desenvolver um plano e processo para criar as competências necessárias em cada uma das cinco disciplinas.
A transformação digital é uma viagem, e práticas ágeis em combinação com mapas de percurso podem ajudar a impulsionar o progresso, pontuado pela identificação de potenciais conquistas e “vitórias” a curto prazo.
6- Em que aspetos o tecido empresarial português se mostra mais e menos preparado para competir na economia digital? E como se compara com os industriais europeus?
Globalmente, o nível de maturidade das empresas nacionais encontra-se abaixo do das suas congéneres europeias, o que significa que existe um amplo espaço para melhoramento na competitividade das empresas nacionais, o que permitirá uma mais fácil integração e presença na economia global. Tem existido um esforço grande de divulgação e foi lançada uma iniciativa nacional para a Indústria 4.0, à qual um conjunto de empresas nacionais líderes se associou. Idealmente, o efeito dessa notoriedade irá também passar para outras empresas e setores, contribuindo para uma utilização mais alargada das tecnologias da terceira plataforma.