O que foi acordado no Código de Boas Práticas?
O Código de Boas Práticas, assinado no final do último ano, alcança o consenso tão esperado entre produção, indústria e distribuição alimentar para autorregular a cadeia de valor em Portugal
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O Código de Boas Práticas, assinado no final do último ano, alcança o consenso tão esperado entre produção, indústria e distribuição alimentar para autorregular a cadeia de valor em Portugal.
O setor agroalimentar português assinou a 12 de dezembro de 2016 no Ministério da Economia um Código de Boas Práticas Comerciais que veio definir um conjunto de princípios e procedimentos para autoregular a cadeia alimentar nacional. O acordo, de natureza voluntária, visa reforçar a cooperação e transparência entre os setores de produção, transformação e distribuição de produtos de grande consumo. A APED (Associação Portuguesa das Empresas da Distribuição), a CAP (Confederação dos Agricultores de Portugal), a CCP (Confederação do Comércio e Serviços de Portugal), a CIP (Confederação Empresarial de Portugal), a CNA (Confederação Nacional da Agricultura) e a CONFAGRI (Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas de Portugal) assinaram o documento, que “pode vir a ser subscrito por outros setores dos bens de grande consumo. Cabe agora, a cada um dos subscritores mobilizar os seus associados para as empresas integrarem nas suas práticas diárias as práticas leais e desencorajar as práticas abusivas”, explica em entrevista ao HIPERSUPER António Saraiva, presidente da CIP. Com este código, as várias partes envolvidas na cadeia de abastecimento sentaram-se à mesa para resolver problemas que subsistem no mercado nacional, “o que não acontecia há alguns anos. Sabemos que não chegámos ao código ideal e que este não é um instrumento perfeito, mas foi o possível”.
Código surge após revisão da legislação
O código “visa o respeito do princípio de boas práticas e evitar práticas abusivas, algumas das quais se encontram listadas na tabela constante do código como, por exemplo: recusar ou evitar reduzir a escrito questões essenciais, impor termos e condições gerais que contêm cláusulas abusivas, denunciar unilateralmente uma relação comercial sem aviso prévio, perturbar deliberadamente o calendário de entrega ou de receção para obter uma vantagem injustificada”, dá conta o presidente.
A iniciativa surge no âmbito da PARCA (Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar), criada pelo Governo no final de 2011 com a missão de promover o diálogo entre as atividades para um maior equilíbrio na cadeia de valor. “O debate no seio da plataforma iniciou-se com a avaliação das diversas dimensões com impacto direto no aludido desempenho, nomeadamente, as questões ligadas à regulação e autorregulação”, explica, por sua vez, Luís Brás, secretário-geral da ADIPA (Associação dos Distribuidores de Produtos Alimentares), que faz parte do universo da signatária CCP.
No que diz respeito à regulação, “foram abordadas as questões ligadas ao quadro legal vigente, concretamente, as referentes aos prazos de pagamento e às práticas restritivas da concorrência”. O Governo aprovou a 13 de agosto de 2015 uma alteração à lei que proíbe vendas com prejuízo (decreto-lei n.º 166/2013 de 27 de dezembro), a qual aprova o regime aplicável às Práticas Individuais Restritivas de Comércio (PIRC).
Desde que entrou em vigor a lei das PIRC, em fevereiro de 2014, até ao último mês de junho foram aplicados a distribuidores nacionais 42 processos por venda de produtos abaixo do custo de produção, que resultaram em prejuízos de entre 0,5% e 25% para os fornecedores. Entre os casos está a penalização de 500 mil euros atribuída à cadeia Pingo Doce pela campanha do dia 1 de maio de 2014.
No entanto, “foi considerado por todos os intervenientes no seio da PARCA que o melhoramento do quadro legislativo, por si só, não era suficiente para resolver as dificuldades existentes na cadeia de distribuição alimentar”, revela Luís Brás.
Neste sentido, “houve a necessidade de trabalhar no âmbito do segundo instrumento, referente à autorregulação”. Além de beneficiar os consumidores, as “boas práticas” subscritas no código visam “defender as partes com menor poder negocial” nas relações comerciais entre a produção e distribuição, “através da implementação de cláusulas justas no âmbito dos contratos”. Um dos principais problemas a colmatar com este código prende-se com “as dificuldades inerentes aos desequilíbrios resultantes das diferentes dimensões dos diversos operadores económicos e, em especial, as decorrentes da excessiva concentração do mercado nacional. Atualmente, os dois principais players detêm uma quota de mercado superior a 50%, o que conduz inexoravelmente a um desequilíbrio das relações comerciais em detrimento dos operadores de menor dimensão”, sustenta o responsável da ADIPA. A equidade entre os operadores foi alcançada através da criação de “soluções de monitorização e de resolução de conflitos” previstas no código.
Contactada também pelo HIPERSUPER, Ana Isabel Trigo Morais, diretora-geral da APED diz que o enfoque deste documento “são os consumidores e o equilíbrio da cadeia de valor que o serve. O trabalho desenvolvido até hoje tem sido positivo, mas espera-se agora uma maior eficiência e a otimização dos recursos na distribuição de produtos em toda a cadeia de abastecimento, que queremos que seja ainda mais sustentável, competitiva e próxima do consumidor, beneficiando-o com oferta de produtos ainda melhores e de mais fácil acesso”. A associação aponta para outros protocolos que demonstram o empenho entre os setores, como a colaboração entre APED e a CAP, firmada em 1995, com o objetivo principal de “fomentar o consumo de produtos agroalimentares de origem portuguesa”, ou o primeiro Código de Boas Práticas Comerciais formalizado entre a indústria e a distribuição no País, em 1997, que uniu a CIP e as empresas da distribuição.
Princípios gerais e específicos
O código assinado em dezembro passado traça um conjunto de princípios gerais e específicos. No âmbito do primeiro conjunto, destaca-se a “preocupação que as partes contratantes devem ter em relação aos interesses dos consumidores e a sustentabilidade da cadeia, a liberdade contratual no sentido de cada parte definir a sua estratégia e política de gestão e o apelo à institucionalização no âmbito da negociação entre as partes”, afirma Luís Brás. No que concerne aos princípios específicos, “enumeram-se um conjunto de referências em ordem à boa prossecução dos princípios gerais estabelecidos, nomeadamente, à necessidade de reduzir a escrito os acordos, de forma clara e transparente; a previsibilidade, não se admitindo a denúncia unilateral dos contratos; a reciprocidade, através da qual as negociações devem basear-se na existência de contrapartidas efetivas e proporcionais decorrentes das transações comerciais e fornecimentos de produtos ou de prestação de serviços; cumprimento dos acordos dentro dos prazos estabelecidos, a informação deve ser trocada em estrita conformidade com a legislação da concorrência e outra legislação aplicável, tendo as partes de assegurar o fornecimento de informação correta e não enganosa”.
O documento foi elaborado com base nas práticas de autorregulação em vigor na Europa, nomeadamente o Supply Chain Initiative (SCI), o código de boas práticas europeu que em 2013 envolveu 457 empresas europeias, entre as quais os cinco principais grupos de retalho alimentar em Portugal, e em acordos semelhantes estabelecidos em países como a Bélgica e Espanha. “A iniciativa belga é um exemplo de como uma plataforma voluntária parece ser uma abordagem eficiente para travar as práticas comerciais desleais, assumindo menor importância o recurso ao sistema regulatório. Ao invés, noutros países, como por exemplo o Reino Unido, os sistemas voluntários têm tido menor sucesso, confirmando a necessidade da implementação de medidas regulatórias e uma aplicação independente efetiva”, lembra o secretário-geral da ADIPA.